Ministro tem levado questões preliminares para análise imediata dos colegas, antes mesmo do julgamento que pode resultar na inelegibilidade do ex-presidente
Como corregedor, Gonçalves é o relator de todas as 16 “Aijes” (sigla para “ação de investigação judicial eleitoral”) que apuram se a chapa Bolsonaro-Braga Netto cometeu abuso de poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação ao longo da campanha eleitoral de 2022.
Preocupado com possíveis tentativas de Bolsonaro de tumultuar os processos, o corregedor passou a trazer para análise imediata dos colegas, no varejo, as questões apresentadas pela defesa do presidente – antes mesmo de o plenário do TSE julgar as ações em si.
Dessa forma, ele faz o TSE enfrentar de prontidão questões jurídicas que possam parecer mais delicadas, ao invés de analisá-las todas em conjunto e apenas no dia do julgamento.
Ao cuidar dessas questões agora, com as ações em andamento, o ministro atua no sentido de obter o apoio da maioria do plenário do TSE para esvaziar as teses levantadas pela defesa de Bolsonaro, reduzindo o espaço de manobra do ex-presidente e impedindo que ele reúna um arsenal jurídico para contestar os processos mais à frente.
É como se Gonçalves promovesse um “aquecimento do julgamento” antes mesmo do “julgamento oficial”.
Um desses aquecimentos deverá ocorrer na próxima terça-feira (14), quando o plenário vai decidir se mantém a decisão do ministro de incluir em uma das ações a minuta golpista encontrada pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres.
A decisão de incluir o documento, que previa uma intervenção no TSE para mudar o resultado das eleições e impedir a posse de Lula, foi tomada em resposta ao pedido do PDT, que é o autor da ação.
A ação do partido de Ciro Gomes foi apresentada em agosto do ano passado, na esteira da infame reunião de Bolsonaro com embaixadores no Palácio da Alvorada, repleta de ataques infundados contra as urnas eletrônicas. Já a minuta golpista foi achada na casa de Anderson Torres em janeiro deste ano, quando Lula já era presidente e Bolsonaro havia partido para os Estados Unidos.
Mas como a minuta golpista tem relação direta com as acusações que pairam contra Bolsonaro desde o ano passado, tanto o PDT quanto Benedito Gonçalves entenderam que os fatos estão relacionados e podem ser analisados conjuntamente pelo TSE.
“Embora seja de rigor afirmar que a diplomação encerra o processo eleitoral, um clima de articulação golpista ainda ronda as eleições 2022”, escreveu o corregedor.
“Os acontecimentos se sucedem de forma vertiginosa. Mas o devido processo legal tem, entre suas virtudes, a capacidade de decantar os fatos e possibilitar seu exame analítico”, frisou o corregedor. “É isso que deve guiar a instrução das Aijes, pois é central à consolidação dos resultados das Eleições 2022 averiguar se esse desolador cenário é desdobramento de condutas imputadas a Jair Messias Bolsonaro, então presidente da República, e a seu entorno. Esse debate não pode ser silenciado ou inibido”, concluiu.
A defesa de Bolsonaro pede que a minuta não seja considerada, já que não foi inicialmente citada pelo PDT quando entrou com a ação.
Em dezembro do ano passado, o ministro já havia colocado sua estratégia em prática.
À época, Gonçalves trouxe para análise dos colegas uma questão apresentada pela defesa de Bolsonaro, que alegava que a Corte era incompetente para julgar essa mesma ação que trata da reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada.
Para a defesa do PL, o evento de Bolsonaro não tinha caráter eleitoral e, portanto, não deveria ser investigado no âmbito do TSE. O argumento foi rechaçado por todos os ministros, o que permitiu o normal prosseguimento do caso.
Na prática, Bolsonaro perdeu um argumento na luta para garantir a sua sobrevivência política — e Gonçalves obteve respaldo dos colegas para seguir cuidando do processo.
Se o entendimento de Benedito Gonçalves for confirmado pela maioria do TSE nesta terça-feira, estará aberta a possibilidade não só de que a minuta golpista, mas também os atentados terroristas, as suspeitas de Marcos do Val e as demais denúncias que ainda surgirem “turbinem” as ações contra Bolsonaro no TSE.
No TSE, o julgamento da próxima semana tem sido considerado importante para demonstrar qual a disposição dos ministros de ir a fundo nas investigações contra o ex-ocupante do Palácio do Planalto.
Os julgamentos finais das ações contra a chapa Bolsonaro-Braga Netto ainda não têm data para acontecer.
Fonte: O GLOBO
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