Presidente da autoridade monetária disse ser preocupante 'tentativa de politizar processo totalmente técnico'
Campos Neto voltou a dizer, porém, que eventuais ruídos entre a política fiscal e a monetária afeta as expectativas e defendeu que as decisões da autoridade monetária não são políticas, e sim “totalmente técnicas”. Ele discursou a uma plateia formada por investidores durante evento promovido pelo banco Bradesco BBI em São Paulo.
— É importante reconhecer o grande esforço que o ministro Haddad e o governo têm feito. O que foi anunciado até agora elimina o risco de cauda para aqueles que achavam que a dívida poderia ter uma trajetória mais explosiva — afirmou Campos Neto.
O presidente do BC disse, no entanto, que existe ainda “uma certa ansiedade ainda em relação à parte das receitas”, em alusão ao necessário aumento de arrecadação que a regra fiscal demandaria. Também destacou que é preciso “observar como vai tramitar no Congresso” o texto.
Campos Neto afirmou que é preciso ter parcimônia em relação a cobranças sobre o governo para a realização de cortes de despesas obrigatórias.
— Tem uma ansiedade em relação a despesa obrigatória. Acho às vezes até injusto, isso deveria ser cobrado com alguma parcimônia porque, fazendo uma análise mais profunda do passado, é bastante difícil cortar despesa obrigatória, principalmente quando a gente pensa em cortes estruturais. A gente teve alguns cortes conjunturais que depois acabaram retornando — disse ele.
'Credibilidade para o que o governo tem feito'
O presidente do BC defendeu que é preciso “dar credibilidade para o que o governo tem feito”, mas também disse que o ajuste com menor aumento de receita é o mais desejável.
— Obviamente o livro-texto vai te dizer que se você fizer um ajuste com mais corte de despesa e menos aumento de receita o aumento inflacionário é diferente (menor) — disse.
Ao ser questionado sobre uma eventual mudança nas metas de inflação, Campos Neto voltou a se posicionar de maneira contrária. O presidente do BC voltou a lembrar que existe um debate entre economistas em relação ao tema.
De um lado, está quem argumentam que a meta atual, de 3,25% foi estabelecida “em um momento em que a inflação basal global era muito baixa” e que se imaginava que a pandemia geraria deflação. Como o momento é diferente hoje, haveria espaço para um reajuste.
— Do outro lado, você tem os economistas que dizem que mudar a meta em um ambiente em que você não cumpre a meta, você não ganha grau de liberdade, perde. Porque as pessoas vão ajustar a inflação não só para a meta nova, mas vão colocar um prêmio adicional em relação a isso. (...) Se você conseguisse convencer todo mundo de que você vai mudar a meta e nunca mais vai mudar depois, provavelmente teria uma situação em que a expectativa não aumentaria o prêmio. Mas isso não garante que não vão existir custos depois, de reputação — ressaltou ele.
Tentativa de politização
Sem mencionar diretamente membros do governo, o presidente do Banco Central criticou o que chamou de “tentativas de politizar” as decisões pretensamente técnicas da autoridade monetária sobre os juros.
Há duas semanas, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, criticou o comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) que embasava a decisão de manter a taxa básica de juros em 13,75% em meio a pressões do governo Lula e do empresariado para redução de juros.
Na ocasião, a ministra afirmou que a ata e o comunicado do órgão vieram “no tom errado” e que eram documentos políticos.
— A tentativa de politizar um processo que é totalmente técnico é uma coisa que deixa os funcionários da casa e os diretores de uma forma geral bem preocupados. Quando a gente escuta comentários de que é uma decisão política…tem milhares de pessoas que passam a noite rodando modelos. Não tem nada na decisão que é política, é sempre técnica — afirmou Campos Neto.
Ele disse, ainda, que “quem entende e analisa” os documentos vê que “é uma coisa que requer um pouco mais de ciência”.
Fonte: O GLOBO
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