Major-general Ivan Popov diz ter sido removido do cargo de comandante depois de expor a chefes do Ministério da Defesa deficiências do Exército na guerra na Ucrânia

Um general russo que acusou chefes do Exército de demiti-lo "traiçoeiramente" apenas por expor as fragilidades e perdas russas na guerra na Ucrânia provocou uma disputa política dentro do partido governista do presidente Vladimir Putin, o mais recente sinal de tensões militares após o motim pelos mercenários do grupo Wagner, no mês passado.

O major-general Ivan Popov, conhecido como “Spartacus”, disse em uma mensagem de áudio que havia sido destituído do cargo de comandante do 58º Exército da Rússia na região de Zaporíjia, na Ucrânia, depois de expor a chefes do Ministério da Defesa “de mais alto nível, de forma extremamente dura”, as deficiências nas operações de combate.

Popov disse a seus “gladiadores” na mensagem que havia enfatizado “as mortes e ferimentos em larga escala de nossos irmãos pela artilharia inimiga”.

— Aparentemente, os chefes seniores sentiram algum tipo de perigo com as críticas e rapidamente conseguiram uma ordem do ministro da Defesa, Sergei Shoigu, para me expulsar — disse Popov. — Embora as forças ucranianas não pudessem penetrar nas defesas russas, a liderança do Exército nos atingiu pela retaguarda, decapitando nossos homens de forma traiçoeira e cruel no momento mais difícil e tenso.

As acusações de Popov e a disputa política sobre sua expulsão evidenciam as contínuas tensões entre as autoridades após o motim de 24 de junho do chefe do grupo Wagner, Yevgeny Prigojin, que tinha como alvo destituir Shoigu e o chefe do Estado-Maior do Exército, Valery Gerasimov, por falhas na desastrosa invasão da Ucrânia pela Rússia.

Andrey Gurulev, legislador do partido governista Rússia Unida, da Comissão de Defesa da Duma (Câmara Baixa do Parlamento) tornou públicas as queixas do general postando a gravação de áudio em seu canal do Telegram na noite de quarta-feira. Isso levou Andrey Turchak, um alto funcionário do partido e senador na Câmara Alta, a acusar Gurulev de fazer um “show político” com a saída do general.

“O Exército estava e continua fora da política”, disse Turchak nesta quinta-feira no Telegram.

— Popov e Prigojin expuseram problemas grandes e sistêmicos no Exército, bem como a impopularidade da liderança militar da Rússia — disse Sergei Markov, consultor político com laços estreitos com o Kremlin. — E agora um terceiro problema foi adicionado: a desintegração da disciplina militar, uma manifestação aberta de deslealdade.

Outro general de alto escalão, Sergei Surovikin, não é visto em público desde o fim da rebelião, enquanto os serviços de segurança tentam descobrir se altos militares sabiam dos planos de Prigojin com antecedência. Surovikin, que foi elogiado várias vezes pelo fundador do grupo Wagner, já foi questionado por investigadores sobre suas ligações com os mercenários, de acordo com uma fonte.

Putin nomeou Gerasimov como chefe geral da força de invasão da Rússia em janeiro, no lugar de Surovikin, oficial militar de carreira apelidado de “General Armagedon” por suas táticas implacáveis durante as operações na Síria. Ele também apoiou Shoigu, um aliado de longa data que serviu ao lado de Putin por décadas.

Putin disse que a Rússia estava à beira de uma "guerra civil" depois que as forças de Prigojin avançaram a cerca de 200 quilômetros de Moscou, encontrando pouca resistência das unidades do Exército, antes de o chefe do Wagner ordenar um recuro sob um acordo mediado pelo presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko.

Com os EUA, a Europa e a China intrigados com as consequências políticas da rebelião que destruiu a imagem de Putin como líder invencível, o Kremlin divulgou na segunda-feira que o presidente se reuniu com Prigojin e 35 comandantes de Wagner para quase três horas, cinco dias após o motim que ele mesmo denunciou como traição.


Fonte: O GLOBO