Plano de Tóquio para despejar no Pacífico águas tratadas da central nuclear recebeu o sinal verde da AIEA, mas enfrenta hesitações populares de japoneses e vizinhos
A alfândega da China anunciou nesta sexta-feira que proibirá a importação de alimentos de 10 cidades japonesas devido ao plano de Tóquio de jogar no Pacífico a água tratada da central nuclear de Fukushima, cenário de um desastre causado por uma grande tsunami há 12 anos. Os chineses preocupam-se com a possibilidade de contaminação, apesar de Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) ter aprovado o plano de despejo da água usada para resfriar os reatores atômicos.
Os chineses informaram em um comunicado que "proibirão a importação de alimentos de 10 prefeituras do Japão, incluindo Fukushima", mas sem detalhar quais são as outras nove. Os produtos procedentes do resto do arquipélago nipônico passarão por medições dos níveis radioativos, disse a alfândega do gigante asiático, completando que "manterá um nível elevado de vigilância".
A Chancelaria chinesa já havia dito na quinta que o parecer favorável da AIEA não poderia ser considerado um "sinal verde" para o plano de Tóquio, apontando para os riscos desconhecidos para a saúde humana. Pequim também já havia acusado o Japão, mais com o qual tem rusgas históricas, de tratar o oceano como seu "esgoto particular".
À AFP, uma fonte anônima na Chancelaria japonesa disse que avalia possíveis retaliações à China.
A Coreia do Sul tem um veto similar a frutos do mar de Fukushima, mas em uma tentativa de acalmar inquietações na sua população, disse que a liberação da água terá "consequências insignificantes". Um estudo independente encomendado por Seul concluiu que o plano japonês respeita ou está além do determinado pelas normas internacionais sobre resíduos nucleares, anunciou nesta sexta o ministro de Coordenação Política, Bang Moon-kyu, em uma entrevista coletiva.
De acordo com o trabalho, a água liberada levará dez anos para chegar a Península Coreana e, quando o fizer, terá um nível radioativo 100 mil vezes inferior. A divulgação veio em em meio a relatos de que pessoas correram aos mercados para estocar sal marinho e uma greve de fome iniciada por parlamentares opositores.
— O Japão quer liberar a água residual no mar porque é a forma mais fácil e barata de fazer isso — disse à AFP Woo Won-shik, deputado que está em greve de fome desde 26 de junho.
O chefe da AIEA, Rafael Grossi, que está no Japão, irá também à Coreia do Sul. Segundo um alto funcionário do governo sul-coreano, 80% da população está preocupados com o projeto.
A AIEA, contudo, deu na quarta seu sinal verde para o plano de Tóquio, afirmando que seus impactos ambientas e sociais serão "insignificantes". À Reuters nesta sexta, Grossi afirmou que tem "confiança extrema" na avaliação de seus especialistas, completando que a organização é imparcial e guiada por evidências científicas. Há dois dias, ele se reuniu com moradores de Fukushima para tentar amenizar as dúvidas sobre a liberação.
A central Fukushima Daiichi, onde os núcleos de três reatores se fundiram após o terremoto de escala 9,0 — o mais forte já registrado na região — e a subsequente tsunami, gera 100 mil litros de água contaminada por dia. A operadora da central, a Tokyo Electric Power (Tepco), trata e armazena no local a mistura de águas subterrâneas, pluviais e de resfriamento da própria usina. Mas depois de acumular 1,33 milhão de litros cúbicos de água, os depósitos estão praticamente saturados.
Com o problema, a Tepco e o governo japonês anunciaram o plano endossado pela AIEA para despejar no oceano o líquido tratado, diluído com água do mar, por uma tubulação de um quilômetro. Além da AIEA, vários especialistas defendem a medida anunciada pelo governo japonês, resultado de um vaivém de anos.
O despejo de água tratada após o uso em usinas nucleares é comum, mas o resíduo de Fukushima, onde houve um acidente, não é um material qualquer. A Tepco usa um método de filtragem que reduz a maior parte das substâncias radioativas a níveis aceitáveis, à exceção do trítio e do carbono-14.
Os dois elementos são difíceis de separar da água e estão presentes na natureza, pois se formam na atmosfera e podem entrar no ciclo d'água. Eles emitem radiação muito baixa, que só em caso de consumo em altas quantidades pode oferecer risco.
O governo japonês defende que o nível final de trítio na água é mais seguro do que pedem as exigências dos órgãos reguladores de lixo atômico ou da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Fonte: O GLOBO
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