Antes de embarcar para viagem, ex-presidente movimentou R$ 800 mil em transferência bancária

O ex-presidente Jair Bolsonaro viajou no final do ano passado, às vésperas do final de seu mandato. Antes de embarcar para os Estados Unidos, onde permaneceu por 89 dias, movimentou R$ 800 mil em transferência bancária. 

Neste período que esteve no exterior, acompanhou crises relacionadas ao seu governo, como o caso das joias doadas pela Arábia Saudita, e os atos golpistas do dia 8 de janeiro, enfrentou problemas de saúde, foi "tietado" por apoiadores e participou de eventos conservadores, como a maior convenção americana de direita, onde foi citado nominalmente por Donald Trump. Durante o período, esteve cercado de seus homens de confiança e dividiu sua estadia em Orlando nas casas do lutador José Aldo e do ruralista Paulo Junqueira.

Bolsonaro deixou o Brasil ainda presidente da República, no dia 30 de dezembro, desembarcando em solo americano no dia seguinte. 

A postura discreta e reclusa dos primeiros dias foi gradativamente mudando, com o aumento dos passeios pelo condomínio, com direito a sessão de fotos com apoiadores, presença em eventos e palestra, chegando até a participar da inauguração de uma hamburgueria, em Kissimmee, na Flórida. 

O político brasileiro, inclusive, foi um dos destaques do maior evento conservador dos Estados Unidos, a Conferência Anual de Ação Política Conservadora (CPAC), na qual discursou e foi chamado de "homem muito popular" pelo ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

Até o dia 27 de janeiro, o ex-presidente teve a companhia da mulher Michelle Bolsonaro, que optou por voltar mais cedo para o Brasil. Entre as visitas que recebeu, as mais frequentes foram do ex-ministro do Turismo Gilson Machado, e do ex-presidente da Caixa Pedro Guimarães, além do filho Eduardo Bolsonaro.

Os únicos que permaneceram todos os 89 dias ao lado de Bolsonaro foram os três seguranças: o capitão da reserva Sérgio Cordeiro, o primeiro-sargento da PM do Rio de Janeiro Max Guilherme Machado e o coronel Marcelo Câmara. No exterior, o ex-chefe do Executivo também enfrentou problemas de saúde, fato recorrente durante seus anos à frente do Palácio do Planalto, e chegou a ser internado em um hospital dos Estados Unidos.

Eventos

Durante seu período nos Estados Unidos, Bolsonaro participou de diversos encontros com apoiadores e palestras. Um dos eventos, inclusive, teve venda de ingressos, com entradas custando entre 10 e 50 dólares. Durante suas falas, era recorrente ouvir o político questionando o resultado das eleições e fazendo críticas a Lula.

Em um evento para empreendedores brasileiros em Orlando, o ex-presidente admitiu a possibilidade de ficar inelegível até as eleições de 2026 e classificou sua "eventual prisão" como "arbitrariedade". Bolsonaro abordou o tema ao comentar os desdobramentos legais da reunião com embaixadores, em julho passado. Na ocasião, o ex-mandatário atacou, sem provas, as urnas eletrônicas e colocou em dúvida o processo eleitoral brasileiro.

— Existe a possibilidade de inelegibilidade sim, mas a questão de prisão só se for arbitrariedade — disse.

Em outra palesta promovida por uma entidade conservadora de brasileiros emigrados na Flórida, Allan dos Santos, o blogueiro foragido da Justiça brasileira que vive nos Estados Unidos, estava na plateia.

Além de palestras, Bolsonaro chegou até a participar da inauguração de uma hamburgueria na Flórida. O ex-presidente esteve na abertura do restaurante PCG, em Kissimmee, onde cortou a fita do estabelecimento e tirou fotos com apoiadores. No local, ele assinou um carro e tirou foto segurando um cachorro.

Trump

O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mencionou Jair Bolsonaro durante sua participação na Conferência Anual de Ação Política Conservadora (CPAC), em Washington. Em seu discurso, o americano afirmou que o ex-presidente brasileiro é um homem "muito popular na América do Sul" e "muito popular" no Brasil. Bolsonaro, que acompanhava da plateia, se levanta e é ovacionado pelos presentes com gritos de “mito”.

“Um homem muito popular na América do Sul, muito popular no Brasil, o ex-presidente do Brasil, presidente Bolsonaro. É uma grande honra”, falou Trump.

O ex-ministro Gilson Machado chegou a anunciar que Bolsonaro e Trump se reuniriam durante o evento, mas o encontro não se confirmou. O ex-mandatário brasileiro também discursou na convenção e colocou em dúvida o resultado da eleição no Brasil e nos EUA. Enquanto falava, eram mostradas imagens dele com apoiadores durante a campanha presidencial do ano passado.

— Se olharem as imagens ao lado, eu tive muito mais apoio em 2022 do que em 2018. Não sei por que os números mostraram o contrário — disse.

Ele destacou que mantém um excelente relacionamento com o ex-presidente Donald Trump e, em uma referência à eleição do atual presidente americano, o democrata Joe Biden, Bolsonaro lembrou que demorou a reconhecer a vitória de Biden. 

Assim como aconteceu no Brasil no último dia 8 de março, quando bolsonaristas golpistas depredaram os prédios dos Três Poderes em Brasília, eleitores de Trump, ligados à extrema direita, invadiram o Capitólio no dia 6 de janeiro de 2021. No evento, ele também sinalizou que ainda pretende se candidatar à Presidência do Brasil no futuro.

Visitas

Durante seu período em terras estrangeiras, o ex-presidente se encontrou com políticos bolsonaristas, entre eles integrantes de seu governo. Além do filho Eduardo Bolsonaro, ele apareceu em eventos ao lado do ex-ministro do Turismo, Gilson Machado, o ex-presidente da Caixa, Pedro Guimarães, e seu ex-assessor Tércio Arnaud.

O ex-presidente também se encontrou nos EUA com parlamentares bolsonaristas, como Márcio Frias (PL-SP), Bruno Engler (PL-MG), Julia Zanatta (PL-SP) e os vereadores Paulo Chuchu (PL-SP) e Gil Diniz (PL-SP).

Sertanejos

Além de políticos, Bolsonaro recebeu familiares e amigos nas casas em que se hospedou nos Estados Unidos. Em um primeiro momento, ele se acomodou na residência do lutador José Aldo e depois foi para a propriedade do líder ruralista Paulo Junqueira, que preside o Sindicato Rural de Ribeirão Preto (SP).

Entre as visitas, esteve o sertanejo Rick, que faz dupla com Renner, que aparece em um vídeo cantando louvor ao lado de Bolsonaro. No registro, Bolsonaro chora ao ouvir a música.

"Não vá desistir agora, não perca a tua fé. Ele tarda, mas não falha, e no fim desta batalha, você vai ser vencedor. Então não perca a tua fé, acredite em você, um escolhido do Senhor", diz trecho da canção.

Crises

O ex-presidente estava nos Estados Unidos quando acompanhou à distância duas grandes crises relacionadas ao tempo em que foi presidente do Brasil. A primeira foi logo em sua segunda semana de viagem, no dia 8 de janeiro, quando bolsonaristas inconformados com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições invadiram e depredaram os prédios do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto.

À época, Lula apontou Bolsonaro como um dos responsáveis pelos atos, alegando que o ex-presidente “passou quatro anos instigando o povo a ter ódio”. Ele, por sua vez, em publicação nas redes sociais, associou o atos de vandalismo à esquerda e disse que depredações "fogem à regra".

"Manifestações pacíficas, na forma da lei, fazem parte da democracia. Contudo, depredações e invasões de prédios públicos como ocorridos no dia de hoje, assim como os praticados pela esquerda em 2013 e 2017, fogem à regra", escreveu Bolsonaro.

A segunda grande crise enfrentada por Bolsonaro nos Estados Unidos é mais recente e está longe de seu final. O político tem sido alvo de críticas e de pedidos de investigações após serem divulgadas suas tentativas para reaver um colar de diamantes recebido de presente do governo da Arábia Saudita quando ainda era presidente. 

A joia, por ter sido declarada incorretamente, foi retira pela Receita Federal. Bolsonato teria recebido ainda, outro dois estojos de joias dos representantes árabes, e os teria incorporado ao acervo presidente. Um dele já foi devolvido ao Governo Federal após determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) e o outro, segundo a defesa do próprio Bolsonaro, está à disposição também para entrega. Juntas, as joias recebidas por Bolsonaro e integrantes de seu governo são avaliadas em aproximadamente R$ 18 milhões.

Aniversário

O ex-presidente e a mulher, Michelle Bolsonaro, comemoram seus aniversários juntos em Orlando, no dia 17 de março. O casal ganhou uma festa organizada pelo amigo pessoal da ex-primeira-dama, o maquiador Agustin Fernandez, e pela chef de cozinha brasileira Karlota Fonseca, que se autointitula a "chef das estrelas". Michelle compartilhou uma foto do momento em suas redes sociais.

Na comemoração, o ex-presidente ganhou um bolo com o escudo do time de futebol Palmeiras, enquanto o da ex-primeira-dama tinha uma foto de um dos cachorros do casal. Bolsonaro e Michelle fizeram aniversário nos dias 21 e 22 de março, respectivamente. O ex-presidente completou 68 anos, e a ex-primeira-dama, 41.

A comemoração precisou ser adiantada por conta do evento onde Michelle de posse no cargo de presidente do PL Mulher, realizada no dia do aniversário de Bolsonaro.

Internação

O ex-chefe do Executivo foi internado no AdventHealth Celebration, um hospital em Orlando, na Flórida, após fortes dores abdominais. Ele ficou dois dias na unidade e depois teve alta.

Segundo o colunista Lauro Jardim, o político deixou o hospital nesta terça, apesar da recomendação contrária da equipe médica. A indicação era de que ele ficasse ao menos mais três ou quatro dias internado, até que começasse a se alimentar ao menos com uma dieta pastosa.

O médico de Bolsonaro, doutor Ricardo Peixoto Camarinha, chegou a visitar o político no condomínio Encore Resort, em Orlando, onde estava hospedado.

Fotos

Durante sua estadia nos Estados Unidos, Bolsonaro por diversas vezes foi abordado na rua para tirar fotos com apoiadores. Principal e mais influente semanário de notícias dos Estados Unidos, a revista Time publicou uma reportagem sobre a rotina dele na Flórida, na qual chamou a nova vida do ex-presidente como "surreal".

A reportagem mencionou que o ex-presidente recebia visitas constantes de brasileiros em casa e que as "famílias sorridentes" entregavam "cestas de pão, morangos, flores e Nutella". Para a publicação, a presença de Bolsonaro na Flórida era "um espetáculo bizarro, mesmo para um estado com uma longa história de refúgio para personagens excêntricos".


Fonte: O GLOBO