Titular da pasta avalia mudança no sistema de seleção do CNPq para aumentar presença feminina em carreiras científicas e acabar com a ‘perda de pontos por ser mulher’

A ministra da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, revelou que a pasta estuda implementar ações afirmativas para mulheres na concessão de bolsas de pós-graduação, com o objetivo de aumentar a presença feminina em carreiras científicas. 

Em entrevista ao GLOBO, ela apontou desigualdade de gênero no sistema das seleções e afirmou que a mudança deverá garantir condições para o prosseguimento da carreira científica “sem perder pontos por ser mulher”. 

É o caso, por exemplo, da contabilização de pontos para a bolsa de produtividade em pesquisa, a de mais alto nível do CNPq, que avalia o tempo de produção sem considerar períodos como a gravidez e o pós-parto.

A senhora defende políticas para garantir o ingresso e a permanência de mulheres na ciência. Como o ministério tem trabalhado na prática?

Vamos fazer o edital de R$ 100 milhões direcionado às mulheres para os próximos quatro anos no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 

Também vamos fomentar via bolsas específicas e estamos estudando algumas outras medidas no CNPq, como alterações nos cálculos de pontuação para bolsas. Isso considerando as condicionantes objetivas das mulheres, principalmente a condição de ser mãe. É garantir condição de seguir uma carreira sem perder pontos por você ser mulher.

Quais outros investimentos estão sendo feitos?

Há diversos programas, como o que trata de tecnologia aeroespacial e o Complexo Industrial de Saúde. São soluções para o dia a dia do povo brasileiro. A área aeroespacial parece algo distante, quando na verdade trata de ferramentas tecnológicas que são decisivas para o monitoramento do desmatamento da Amazônia, por exemplo. 

O CBERS-6 (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), uma dessas ferramentas, vai possibilitar que tenhamos imagens da Amazônia, independentemente da condição climática. São muitas nuvens durante todo o ano.

O ministério anunciou a expansão do monitoramento para identificar as causas do desmatamento, como garimpo ou pecuária. Como vai funcionar?

Tem que ter agilidade para enfrentar. Há um monitoramento diário e vamos ampliá-lo para outros biomas, além da Amazônia. Identificar os garimpeiros é um trabalho de fiscalização. Nós iremos principalmente fazer o monitoramento para ver o uso da terra, olhar o que está sendo desmatado e acionar a polícia.

O Brasil ainda está longe de ser referência na produção científica?

Somos o 13º país do mundo em ranking de papers, o que significa que temos uma produção científica reconhecida internacionalmente, com soluções adequadas. Mas não conseguimos realizar isso em produtos e serviços: somos o 57º em inovação.

Há resistência da própria academia em estabelecer uma relação mais próxima com o setor privado?

Sim. É uma questão cultural, mas já houve mudanças significativas. A UFMG, por exemplo, com o centro de vacinas, desenvolvendo vacinas genuinamente brasileiras. As leis eram muito rígidas, mas o novo Marco Legal de Ciência e Tecnologia facilita essa intercessão, e ele precisa sair um pouco mais do papel. Ainda estamos muito distantes das necessidades.

O governo tem a meta de que 70% dos insumos do SUS sejam produzidos no país em dez anos. Como o ministério atua para que isso seja possível?

Queremos autonomia para depender menos dos insumos, de equipamentos e até de medicamentos. Uma das nossas ideias é produzir Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs). O Brasil produziu a CoronaVac em parceria com os chineses e a AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford. No entanto, o mundo todo dependeu dos IFAs . 

Nós já produzimos IFAs no passado e queremos retomar, pois temos matéria-prima e intendência para isso. Para sermos, inclusive, exportadores. Na agenda da reindustrialização, vamos entrar com R$ 41 bilhões (em investimentos) nos próximos quatro anos para financiar todas as novas bases tecnológicas.


Fonte: O GLOBO