Jessé Lopes (PL) atuou no júri do evento, mas já havia criticado publicamente a participação de jovem trans de 19 anos

Uma juíza suspendeu, na última quarta-feira, os resultados de um concurso de beleza após uma das candidatas ter acusado o deputado Jessé Lopes (PL-SC) de transfobia. Isso porque, depois de ter criticado publicamente a participação da jovem Luiza Maciel Inácio, de 19 anos, ele apareceu no evento como um dos jurados da competição, que ocorreu no dia 7 de julho no município de Ermo, em Santa Catarina.

Procurado pelo GLOBO, Jessé Lopes confirmou ser contra a participação de transexuais “em disputas com mulheres” cisgênero “em qualquer âmbito”. Afirmou, porém, que “o edital não excluía a participação de jurados que fossem contra a participação de trans”, e disse ter feito a avaliação “em cima dos critérios prescritos no edital”.

— Acontece é que a candidata trans não tem o dom da beleza e desfilou muito mal mesmo. Dei a nota que mereceu — disse. — Tenho um projeto de lei tramitando na Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina que proíbe a participação de trans em concursos de beleza e esportes femininos. Nunca escondi esse meu posicionamento.

Ao GLOBO, a defesa de Luiza explicou que o recurso não visava a cancelar o concurso, mas invalidar as notas que o deputado deu à candidata. Dias antes do evento, ele havia publicado nas redes sociais que “um homem biológico (que se acha mulher)” estaria “tirando o lugar das mulheres de verdade no concurso”. Afirmou, ainda, que “o povo da cidade não concorda com esse tipo de barbaridade”.

— Nós entramos imediatamente com uma ação na Justiça pedindo para que ele retirasse o conteúdo e se abstivesse de publicar coisas que fossem além da liberdade de expressão — disse o advogado Thauan Maia de Moraes. — Infelizmente, este pedido não foi reconhecido pelo juiz, que entendeu que aquilo não caracterizava transfobia.

Ele resolveu, então, recorrer ao Ministério Público, que “reconheceu o crime de racismo e considerou que o caso tinha âmbito federal, porque [as declarações] foram na internet, propagando-se por todo o país”. O caso foi encaminhado ao Ministério Público Federal e, segundo o advogado, o deputado vai “responder pelo crime de homofobia, que é análogo ao crime de racismo”.

O concurso

No dia do concurso, Moraes disse ter ido ao local. Lá, foi “surpreendido pela anunciação do deputado como um dos membros da mesa de jurados”. De acordo com ele, a notícia causou “estranheza”, já que Lopes já havia manifestado “seu descontentamento quanto à candidata, que, segundo ele, não poderia participar”. O advogado decidiu tentar contestar a participação dele como avaliador.

— A organização, porém, não nos atendeu. Eu registrei um boletim de ocorrência no mesmo dia, e pedimos para que o juiz de plantão suspendesse o concurso imediatamente, de modo que a dignidade dela não fosse violada. Mas o poder judiciário não conseguiu nos atender a tempo. Então, acrescentei à petição um pedido para que fosse declarada, em liminar, a parcialidade dele no evento.

Em nota divulgada nesta quinta-feira pela Prefeitura de Ermo, foi informado que “o convite direcionado aos jurados deu-se em oportunidade anterior aos acontecimentos que originaram os fatos debatidos no processo judicial”. Para a defesa, a decisão “atesta a parcialidade do deputado”, já que, na visão do advogado, “ele não poderia ter feito as publicações se sabia que iria julgá-la no concurso”.


Fonte: O GLOBO