Na manhã desta segunda-feira (28), a Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) foi palco de uma importante audiência pública que reuniu parlamentares, especialistas em segurança pública e representantes das policias que atuam no Estado. O encontro teve como foco o debate sobre o porte de armas por agentes de segurança pública durante sua folga, especialmente em ambientes festivos onde a venda de bebidas alcoólicas é permitida. A discussão foi proposta pelo deputado Adailton Cruz (PSB) e trouxe à tona um tema que envolve questões de segurança, legalidade e impacto na sociedade.
O deputado Adailton Cruz, autor do requerimento que deu origem à audiência, abriu o evento destacando a relevância do debate em um contexto onde a segurança dos cidadãos é uma preocupação constante. Ele ressaltou que, embora seja fundamental garantir o direito dos agentes de segurança a protegerem a si mesmos e a terceiros, é importante balancear essa prerrogativa com a preservação da ordem pública e a prevenção de incidentes.
“Este é um evento de extrema relevância e eu dou as boas-vindas a todos aqui presentes. Ressalto o nosso respeito e admiração pelos agentes, pois sabemos da árdua missão que é promover segurança. Eu, particularmente, não sou contra o porte de arma a nenhum agente, seja em atuação ou não. No entanto, o debate se faz necessário para ouvirmos aqueles que vivem essa realidade e sabem o que é promover a ordem em nosso Estado. Estamos aqui para debater a disciplina e regulamentação do uso da arma fora do expediente de serviço, em ambientes com venda e consumo de bebida alcoólica. Não podemos olhar para os agentes com medo, mas alguém que está bêbado e portando uma arma não transmite outra coisa a não ser temor”, disse Adailton Cruz.
Representando o delegado-geral José Henrique Maciel, o delegado Alex Cavalcante frisou que o debate serve para promover um ambiente de reflexão sobre o tema. “Todo policial reivindica que atua 24 horas por dia, com obrigação de agir em todas as vezes que se depara com situação de flagrante delito, seja qual for o lugar, de aglomeração ou não. Além disso, a arma pela legislação das policias, é tida como um direito do policial e equipamento de proteção. Não se trata de glamour ou vaidade, mas uma obrigação legal de agir independentemente de estar em serviço ou não. A legislação precisa ser atualizada, é necessário que tenhamos esse olhar para o agente, no que concerne à sua qualidade de vida e também o psicológico, pois tem que lidar com diversas situações estressantes”.
Diversos pontos de vista foram apresentados ao longo da audiência. A promotoria argumentou que o porte de armas por agentes em ambientes festivos pode contribuir para a dissuasão de crimes e ações violentas. No entanto, alguns críticos levantaram preocupações sobre o potencial aumento de conflitos armados e acidentes em espaços onde a presença de álcool pode exacerbar tensões.
O promotor Rodrigo Curti fez declarações a respeito do porte de arma de fogo por agentes de segurança pública em períodos de folga, destacando pontos de concordância e distinção entre as regulamentações para diferentes grupos.
De acordo com ele, há um consenso geral quanto ao porte de arma de fogo por agentes de segurança pública em seus momentos de folga, uma vez que tal permissão encontra respaldo na legislação. No entanto, ele apontou que a divergência reside na regulamentação para essas situações.
“A Lei 10.826, conhecida como Estatuto do Desarmamento, concede o direito ao porte de arma, tanto de propriedade institucional como particular, aos agentes de segurança pública em virtude da natureza de sua profissão. No caso dos policiais penais, o texto da lei exige a existência de mecanismos internos de controle para a concessão e uso da arma”, explicou.
O promotor também destacou as diferenças no tratamento do porte de arma para os policiais civis. Para eles, é necessário comprovar a necessidade da arma para segurança pessoal, sendo vedada sua condução ostensiva em locais públicos ou com aglomeração de pessoas. Ele expressou ainda, preocupação quanto ao uso inadequado dessas armas em locais de aglomeração, mas também reconheceu os desafios enfrentados pelos agentes de segurança pública em seu trabalho diário.
“O Ministério Público não se opõe ao porte de arma por policiais em seus momentos de folga, mas está focado em discutir mecanismos mais eficazes para controlar o acesso desses profissionais a locais com o uso de substâncias como bebidas alcoólicas e substâncias químicas, que podem afetar suas capacidades cognitivas e psicomotoras. É isso que estamos discutindo hoje nesse encontro”, complementou.
Isa, mãe de Wesley Santos da Silva, de 20 anos, que morreu em decorrência de tiros efetuados pelo policial penal Raimundo Neto durante a Expoacre 2023, falou sobre sua revolta por perder o filho e como isso tem impactado a vida da sua família. Ele também frisou que policiais com problemas psicológicos devem buscar ajuda profissional.
“Aqui foi falada a questão psicológica dos policiais, mas se eles estão com psicológico abalado, por que não procuram ajuda profissional? Por que vão a uma festa beber e importunar sexualmente mulheres? Foi o que aconteceu com o assassino do meu filho, um agente de segurança que em folga e portando uma arma, bebeu e importunou várias mulheres e matou uma pessoa de bem. Meu filho foi atingido por dois tiros e a namorada dele quatro. Meu filho era trabalhador e nunca tocou em uma arma, ele sustentava nossa casa e tinha três empregos. O assassino dele está em casa, solto. Não somos contra o armamento dos policiais, mas isso não dá a eles o direito de tirar a vida de inocentes, nem de importunar mulheres. Ele está livre, meu filho não volta mais”, lamentou.
Durante o debate, representantes de sindicatos e associações de agentes de segurança enfatizaram a necessidade do porte de arma por parte dos policiais, independente deles estarem ou não em serviço. Eles alegam que, por atuarem diretamente com cidadãos que infringem as leis, precisam portar armamento até mesmo durante a folga, como um ato em defesa da própria segurança.
O Coronel Gleison Dantas, na oportunidade representando o secretário de Segurança Pública do Estado, expressou seu reconhecimento pelo debate recentemente ocorrido. Com um tom pragmático, ressaltou a importância de evitar catástrofes e destacou o impacto direto sobre a sociedade quando ações equivocadas são cometidas por agentes de segurança.
“Embora a proibição do uso de armas não esteja nos planos, a abordagem se volta para a implementação de mecanismos que promovam o uso correto delas. A proposta inclui sensibilizar o cidadão que porta arma, atribuindo a ele um status diferenciado, o que poderia ser facilitado pelo Ministério Público, por exemplo. O foco é aprofundar o olhar sobre essa questão, realçando a relevância do Projeto de Lei aqui em discussão e a necessidade de unir esforços para aprimorar o cenário atual. A fiscalização será primordial, sem a intenção de desarmar os agentes de segurança, mas sim de garantir uma atuação mais segura e responsável”, enfatizou.
O equilíbrio entre a liberdade individual dos agentes e a segurança coletiva foi tema recorrente no debate, que tratou de perspectivas destacando a complexidade do assunto e a importância de se considerar múltiplos fatores ao se tomar uma decisão legislativa.
Ao final da audiência, não houve uma conclusão definitiva sobre a questão do porte de armas por agentes de segurança pública durante a folga em ambientes festivos com venda de bebidas alcoólicas. O deputado Adailton Cruz agradeceu a participação de todos e afirmou que as contribuições levantadas serão fundamentais para embasar futuras decisões relacionadas ao tema. Ele enfatizou mais uma vez que não é contra o porte de arma por parte dos agentes, mas também acredita que o sistema de controle deve ser expandido e que deve ser crime ingerir bebida alcoólica portando arma.
Em resumo, a audiência pública na Aleac trouxe à luz um debate complexo e multifacetado sobre o porte de armas por agentes de segurança pública durante momentos de lazer. O debate evidenciou a necessidade de se considerar cuidadosamente as implicações legais, éticas e sociais antes de tomar medidas que possam afetar tanto a segurança individual quanto a coletiva. Também a necessidade de maior acompanhamento psicológico ofertado aos agentes de segurança.
Os deputados Arlenilson Cunha (PL), Gene Diniz (Republicanos) e Dra. Michelle Melo (PDT) também participaram do debate dando seus respectivos posicionamentos acerca do tema.
Leis sobre o porte de armas no país
A Lei n° 10.826, do Estatuto do Desarmamento, prevê que pessoas que têm porte de arma para defesa pessoal não podem entrar armadas em locais onde há aglomeração, mas prevê o porte para agentes de segurança – mesmo fora de serviço, como: Forças Armadas, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Policiais militares e civis.
A Lei estabelece que as normas para esse uso fiquem sob a responsabilidade das corporações de cada estado. Das 27 unidades federativas do país, em 21 e no Distrito Federal, policiais militares e civis fora de serviço podem entrar armados em baladas. No Acre há essa permissão.
Desde 2019 tramita na Câmara Federal o Projeto de Lei n°433/2019, que proíbe servir bebida a pessoas que portem armas. A matéria foi apresentada pelo deputado Rubens Bueno (PPS) e aguarda designação de relator na Comissão de Finanças e Tributação (CFT). O artigo 2° da Lei diz que: “Fica proibido o consumo de bebida alcóolica em bares, restaurantes, boates e outros estabelecimentos congêneres por pessoas que estejam portando armas de qualquer tipo”.
No Acre, o deputado Adailton Cruz possui um projeto de lei que está em fase de conclusão, cujo objetivo é proibir o uso de bebida alcoólica por agente de segurança portando arma, estabelecendo inclusive sanções administrativas a quem desobedecer a lei. O parlamentar frisou que aguardará por 90 dias para que as corporações apresentem de forma mais clara os protocolos de controle do porte de arma de agentes que estejam em ambientes festivos. Serão feitos encaminhamentos da Comissão de Segurança da Aleac e também será pedido ao governo que institua um protocolo de apoio psicológico aos agentes de segurança.
Fonte: ALE/AC
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