Durante greve dos caminhoneiros, em 2021, ele chegou a dizer que tinha apoio para 'manter os braços cruzados'; agora, foi preso por suspeita de interferência nas eleições

O ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques, que foi preso nesta quarta-feira por suspeita de interferência nas eleições presidenciais, já foi alvo de outras polêmicas. Em maio de 2022, o Ministério Público Federal de Goiás instaurou um procedimento para apurar a extinção das Comissões de Direitos Humanos da PRF, que monitoravam os processos disciplinares contra agentes — e foram interrompidas após uma portaria assinada por Vasques.

A discussão sobre a conduta dos agentes da PRF teve destaque após a morte de Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, em Sergipe. Em 25 de maio, ele foi parado em uma blitz por conduzir uma moto sem capacete, mas acabou sendo imobilizado, amarrado e colocado no porta-malas de uma viatura. Dentro do veículo, os policiais detonaram uma bomba de gás lacrimogêneo, criando uma espécie de câmara de gás. Ele chegou a ser levado ao hospital, mas morreu de asfixia mecânica.


'Câmara de gás': homem morre ao ser colocado em viatura da PRF em Sergipe

Antes do caso de Genivaldo Santos, a procuradora Mariane Oliveira já havia determinado a abertura de um ato para apurar a “ocorrência de eventuais retrocessos na tutela e proteção dos Direitos Humanos” no âmbito da instituição. Uma semana depois, em 14 de maio, ela enviou um ofício direto a Vasques perguntando “de que maneira a garantia deste direito fundamental seria assegurado”, e deu um prazo de 20 dias para a resposta. Dias depois, a morte levou à abertura de um inquérito.

Na ocasião, a PRF havia dito ao GLOBO que “não compactua com qualquer afronta aos direitos humanos, sendo uma das instituições policiais que mais atua diretamente nesta causa”. A corporação ainda afirmou que a disciplina de Direitos Humanos não deixou de ser aplicada durante a formação de novos policiais, e que instaurou um processo disciplinar para “elucidar os fatos” ocorridos em Sergipe. Além disso, afirmou que os agentes envolvidos foram afastados.

Operações letais

A morte de Genivaldo não foi a única. Em maio de 2022, a PRF atuou em parceria com o Batalhão de Operações Especiais (Bope) em uma operação realizada na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro — e que deixou ao menos 25 pessoas mortas. Em fevereiro daquele ano, agentes estiveram ao lado da Polícia Militar na mesma região, e cerca de oito pessoas morreram. Na ocasião, a PM afirmou que os agentes cumpriam “mandados de prisão contra uma quadrilha de roubo de cargas”.

Já em outubro de 2021, pelo menos 25 pessoas morreram após uma ação conjunta da PRF com a PM de Minas Gerais em Varginha, sul do estado. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal, a operação, que ocorreu em duas chácaras, buscava combater o chamado “novo cangaço”, e disse que os bandidos atacaram os policiais. No primeiro confronto, 18 criminosos morreram, e 10 fuzis foram recuperados, além de outras armas, munições, granadas e coletes a prova de balas.

Compra de blindados

O Ministério Público Federal abriu uma investigação criminal sobre a compra de veículos blindados pela Polícia Rodoviária Federal do Rio de Janeiro. De acordo com o MPF, foram identificadas inconsistências na documentação da licitação, vencida pela empresa Combat Armor, além da falta de justificativa de necessidade de urgência para a compra dos chamados “caveirões”. Conforme revelado pelo Jornal Nacional, nove blindados estavam parados e sem uso no pátio da PRF.

'Respaldo do Planalto'

Em 6 de setembro de 2021, Vasques foi convocado por ministros do governo para explicar como enfrentaria a greve de caminhoneiros, que bloqueavam estradas em todo o país e pediam a destituição de integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF). 

Naquele dia, ele afirmou que não pretendia intervir, e que contava com “respaldo de autoridades do Palácio do Planalto para manter os braços cruzados”. Diante da inércia, o então ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas atuou pessoalmente para convencê-los a liberar as estradas.

Freitas gravou um vídeo, distribuído aos líderes do movimento, em que apelava para que eles desobstruíssem as rodovias. Com o tempo, o protesto foi perdendo musculatura, e o fluxo acabou sendo restabelecido. Declaradamente apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro, Silvinei Vasques foi alçado ao comando da PRF em abril de 2021, cerca de um mês depois da chegada de Anderson Torres ao Ministério da Justiça, pasta à qual a Polícia Rodoviária Federal é vinculada.

Operação eleitoral

De acordo com as investigações da Polícia Federal, integrantes da PRF direcionaram recursos humanos e materiais “com o intuito de dificultar o trânsito de eleitores” no segundo turno das eleições presidenciais de 2022, quando foi realizado um patrulhamento ostensivo direcionado à região Nordeste do país, reduto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ainda conforme o inquérito, os crimes apurados teriam sido planejados desde o início de outubro daquele ano.


Fonte: O GLOBO