Amair Feijoli, condenado por envolvimento na morte da missionária norte-americana Dorothy Stang, ocupa terras públicas. PF fez duas operações nesta terça-feira (29).
Amair Feijoli, condenado por envolvimento na morte da missionária norte-americana Dorothy Stang em Anapu (PA), foi preso pela Polícia Federal em duas operações que foram deflagradas nesta terça-feira (29) no Acre e Amazonas. Ele ocupa terras públicas dentro da Floresta Estadual do Antimary, unidade de conservação de responsabilidade do Estado e também estava com duas terras em Lábrea (AM).
Em novembro do ano passado, uma decisão da Justiça Federal havia determinado que ele saísse das terras em um prazo de 60 dias. A decisão foi resultado de uma ação civil pública ingressada pelo Ministério Público Federal do Acre (MPF-AC) que iniciou, em junho do ano passado, uma investigação pelo fato de Feijoli ter comprado a área da União em 2005 e ter começado a desmatar o local desde então.
A Polícia Federal deflagrou, nesta terça-feira (29), duas importantes operações de combate a crimes ambientais nos estados do Acre e Amazonas. Como resultados das duas operações, foram cumpridos quatro mandados de prisão preventiva, 25 mandados de busca e apreensão e 6 mandados de proibição de acesso e frequência à área Floresta Estadual do Antimary.
Os crimes ambientais foram detectados nas terras que Feijoli ocupa no Antimary e nas duas fazendas que ele comprou em Lábrea (AM).
"Entre os alvos de prisão estão um dos condenados pelo assassinato da missionária americana Dorothy Stang, morta no ano de 2005, no Pará, e o seu filho, que já possuía um mandado de prisão expedido pela Justiça de Sena Madureira, por tentativa de homicídio. Em virtude dos fatos apurados nas duas operações, os investigados poderão responder judicialmente pelos crimes de associação a organização criminosa, invasão de terras públicas, desmatamento, falsidade ideológica, estelionato e lavagem de dinheiro, entre outros delitos acessórios, cujas penas somadas podem ultrapassar 20 anos de prisão", diz a nota da PF.
800 campos de futebol desmatados
Fares Feghali, delegado regional de Polícia Judiciária, disse que o resultado foi efetivo e destacou que o grupo agia de forma criminosa na região.
“Hoje acreditamos que tivemos resultados efetivos no combate a grupos criminosos que vinha fazendo grilagem e devastação de terras da União e devastação do meio ambiente, com importante resultados, tirando de circulação, com medidas preventivas, pessoas de alta periculosidade, então os trabalhos de hoje foram muitos efetivos com relação a grilagem de terra, desmatamento que vem ocorrendo no estado do Norte e acreditamos que foi bem satisfatório”, disse.
Operação investiga crimes ambientais no Acre e Amazonas — Foto: Asscom/PF-AC
O advogado da família, Ayres Dutra, disse que ainda não teve acesso aos documentos. Ele confirmou que Feijoli está na seda PF e que teve o carro apreendido, além do celular da avó e da mulher que também estão em poder da polícia.
“Ainda não tive contato com a documentação de nenhuma das operações, em nenhum dos mandados, mas o que a gente pode adiantar é que o Amair cumpre no Brasil uma prisão perpétua, ele não consegue se desvencilhar do poder do Estado. Ele cometeu o crime contra a missionária Dorothy, contribuiu para que o crime fosse solucionado, cumpriu a pena dele, mas ele não consegue ter paz”, disse.
Ele disse que o cliente vai passar por audiência de custódia e destacou que as terras em Lábrea foram compradas e não são terras públicas.
Segundo PF, grupo cometia diversos crimes ambientais — Foto: Asscom/PF-AC
Ricardo Ferro, delegado da PF, disse que além do desmatamento, o grupo lucrava com outros crimes ambientais. “Também lucravam com venda de madeira e gado, criavam gado em área desmatada e ganhavam dinheiro com a venda dos animais. Essas pessoas desmatavam dentro da Amazônica Legal”, pontuou.
“O grupo criminoso estava fazendo o clássico nessa área da Amazõnia, que é o ciclo de invasão de terra pública federal, falsidade documental para esquentar essa propriedade e desmatamento para fins agropecuários. Além disso, estamos tentando averiguar a participação de outros personagens importantes. Interrompemos essas ações criminosas, foram mais de 800 hectares desmatados somente em 2022, o que equivale e a 800 campos de futebol de floresta nativa amazônica”, destacou.
Feghali finalizou reforçando que o envolvido já tem um histórico de crimes ambientais bastante conhecido. “São conhecidos na criminalidade ambiental com passado criminal e tiramos de circulação para evitar não só crimes ambientais, mas desmantelamos organizações criminosas.”
Polícia faz operação no Acre e Amazonas contra crimes ambientais — Foto: Asscom/PF-AC
Operação Terra Prometida
A Operação Terra Prometida é para reprimir organização criminosa destinada à prática de crimes de desmatamento, invasão de terra pública, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.
As investigações tiveram início a partir de denúncias de moradores extrativistas da Floresta Estadual do Antimary, que relataram intenso desmatamento para criação de gado e ameaças feitas pelos atuais posseiros da Fazenda denominada Canaã, que está inserida em gleba pública federal, na região amazônica do Município de Sena Madureira, interior do Acre. A terra atualmente é de Feijoli e sua família.
O total da área desmatada foi de 598 hectares, o que corresponde a quase 600 campos de futebol. Somados os desmatamentos cometidos pelos antigos e atuais invasores, o prejuízo ao meio ambiente alcançou um valor aproximado de R$ 18 milhões.
Operações contra crimes ambientais foram deflagradas pela PF — Foto: Asscom/PF-AC
Operação Xingu
Já a Operação Xingu foi deflagrada para reprimir diversos crimes ambientais praticados no sul do Amazonas, envolvendo um grileiro, dois pecuaristas e um técnico de georreferenciamento responsável pelo esquentamento de imóveis rurais junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e ao Cadastro Ambiental Rural.
A investigação foi iniciada a partir de denúncias de conflito agrário e desmatamento para exploração de gado na Região do Bom Lugar, localizada entre os Municípios de Boca do Acre e Lábrea/AM, que foram confirmadas por diligências de campo e análise de imagens de satélite.
A organização criminosa foi responsável por destruir cerca de 800 hectares de mata nativa amazônica, no ano de 2022, causando um prejuízo ao meio ambiente calculado em mais de R$ 17 milhões de reais, que serão objetos de ressarcimento.
As terras
A Floresta Estadual do Antimary foi constituída em 1997 pelo decreto estadual nº 046. Os antigos donos das terras atualmente ocupadas por Feijoli e sua filha, Patrícia Coutinho da Cunha, venderam a área em 2005. Porém, a Justiça entendeu que a venda não tem validade, uma vez que a área se trata de terra pública.
"Carlos Duarte Pinheiro e Pedro da Costa Alexandrino não observaram o marco temporal, uma vez que, segundo alega o próprio requerido Pedro, a ocupação se iniciou nos anos de 2004/2005", destaca.
Com a investigação, o MPF detectou também que Carlos e Pedro nunca moraram na área dentro da unidade de conservação, mas sim em Rio Branco, capital do Acre. Logo, não se enquadram no perfil de população tradicional, não fazendo jus à regularização fundiária.
"Trata-se, em verdade, de invasão de área pública e, em consequência, a venda da ocupação de áreas públicas aos requeridos Almair da Cunha Feijoli e Patrícia Coutinho da Cunha não tem validade jurídica, sequer autoriza indenização por benfeitorias em razão terem eles ciência fato que impede a aquisição", destaca o documento. Ocorre que a presença dos invasores oriundos do Projeto de Assentamento Wilson Lopes despertou conflito fundiário com pessoas que reivindicam parcela significativa de terras no interior da Unidade de Conservação, na propriedade denominada Fazenda Canaã. Esse conflito tem resultado em obstrução de passagens, ameaças e hostilidades, tendo os invasores procurado o Ministério Público para relatar os fatos e exigir providências", diz o pedido do MPF.
A Justiça entendeu que os documentos apresentados por Amair e pela filha não são válidos.
Área desmatada flagrada pela PF — Foto: Nucom/PF-AC
'Perseguido'
O advogado da família, Ayres Dutra, disse que há uma grande injustiça nesse caso, uma vez que as terras ocupadas por pai e filha estão documentadas. Ele disse ainda que deve recorrer da decisão.
“O Amair já foi intimado da decisão e ele vai tomar as providência jurídicas cabíveis, já que o próprio Supremo Tribunal federal [STF impede essas reintegrações, desocupações liminares sem se formar uma comissão e o seu Amair adquiriu um imóvel, que tem documento com certidão válida até hoje, e tá aí sofrendo mais uma grande injustiça. Essa floresta do Antimary foi criada sem terra, ou seja, ela não tinha imóvel, ela não era regulamentada, foi criada sob supostamente terra da União e dentro dos limites dessa floresta tinham propriedades particulares”, defende.
O advogado afirma ainda que a família é perseguida por invasores e que nada é feito com relação a isso. Ele também faz duras críticas à gestão da floresta.
“Quanto aos invasores que procuraram o MPF, não há nenhuma providência jurídica contra os mesmos e os desmandos lá são horrendos e vão ser informados ao Judiciário. A magistrada decidiu sem ouvir a outra parte, mas há tempo para tudo. Ele vai explicar o grande e evidente e cristalino direito. Seu Amair não é grileiro, comprou e está sofrendo uma injustiça e vai corrigi-la”, destaca.
Mapa mostra a área de conflito e a floresta — Foto: Reprodução
Conforme registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR), os proprietários declararam um tamanho total de 5.488,34 hectares, sendo explorados 200 hectares e todo o resto formado por vegetação nativa. A partir dos relatos das pessoas ouvidas no inquérito civil de que, após a venda da propriedade, os novos ocupantes teriam, além de ameaçar e hostilizar as pessoas locais, promovido abertura de extensas áreas.
"Constata-se, de 2020 para 2021, um aumento significativo na área desmatada, a qual se expande em 164,35 hectares. Isso corrobora as oitivas coligidas no inquérito civil que apontam para um intenso desmatamento após a vinda de Amair Feijoli para o local. Registre-se que a dinâmica de desmatamento tende a aumentar cada vez mais, em vista da suposição razoável de que o requerido Amair Feijoli não medirá esforços para rapidamente recuperar o valor investido", destaca o MPF.
Entenda
Conhecido como Tato, ele foi condenado a 18 anos por intermediar a morte de Dorothy Stang. Segundo a Justiça do Pará, foi ele quem contratou os pistoleiros Rayfran e Clodoaldo Carlos Batista para assassinar a missionária a mando de Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, e Regivaldo Pereira Galvão.
Nas terras dele, dentro da unidade, foram apreendidas três armas de fogo, sendo duas espingardas, um rifle calibre 22, munições calibre 12 e um colete à prova de balas que, provavelmente, faz parte do patrimônio da Polícia Militar, da Polícia Civil ou de uma das outras forças de segurança.
Quatro pessoas que estavam na fazenda foram presas por posse ilegal de arma de fogo de uso permitido. O delegado responsável pela operação, Marcos Frank, explicou que Patrick da Cunha, filho do fazendeiro, era procurado pela tentativa de homicídio, e o pai dele por ameaçar os moradores e, agora, pela posse ilegal de arma de fogo.
Briga por área de terras
A atuação da família na região, segundo os moradores, é criminosa, envolvendo ameaças e até tentativa de homicídio. Patrick Coutinho da Cunha, filho de Amair, é suspeito de atirar duas vezes em um agricultor por causa de uma briga por terras em Sena Madureira, interior do Acre.
O agricultor acusa Amair Feijoli de se apropriar de uma área de terras que ele comprou há dois anos no Ramal Cassirian, zona rural do município de Sena Madureira. Após a compra, o agricultor afirma que Amair começou a invadir uma área de 5 mil hectares que fica próximo da terra dele e acabou tomando sua propriedade também.
O homem havia dado uma paulada na cabeça de Amair, pai de Patrick, após cobrar uma dívida por uma terra que Amair teria tomado. Ele acabou baleado no tórax e na barriga, passou por cirurgia em um hospital de Rio Branco e foi liberado para ir para casa, na zona rural de Sena Madureira.
A briga ocorreu no final do mês de abril, mas o agricultor só denunciou o caso em maio, quando deixou o hospital.
O agricultor registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Sena Madureira. A defesa de Amair Feijoli e de Patrick da Cunha alega que os disparos foram feitos para tentar evitar que Amair fosse morto durante a briga.
Tabela no processo mostra o avanço do desmatamento na área — Foto: Reprodução
'Tentativa de homicídio', diz defesa
Ao g1, o advogado Ayres Dutra, que representa a família de Amair, afirmou que o cliente sofreu uma tentativa de homicídio. Segundo a defesa, Patrick teria atirado em direção ao chão para evitar que o pai fosse morto na briga. Dutra alegou também que Amair desmaiou e ficou desacordado após a briga.
"Não morreu por sorte, porque houve um revide, pegou essa paulada na cabeça por trás. Existe no Acre um movimento muito estranho e ilegal dando força para esses invasores desrespeitarem uma área que vai ser comprovada que está escriturada no Amazonas, existe um proprietário e não foi invadida. A inversão de valores é muito grande, mas já estamos colocando força para descobrir de onde está saindo isso", justificou na época.
O advogado acrescentou ainda que toda a confusão será esclarecida para que a justiça seja feita. "Esse rapaz que se diz vítima, que foi alvejado, na verdade, é um criminoso. Tentou tirar uma vida, impossibilitando seu Amair de se defender. Seu Amair só parou lá para tomar um refrigerante, e o rapaz deu uma paulada nele", pontuou.
O advogado afirmou também que há denúncias de diversos invasores na região e nenhuma providência foi tomada até o momento. Segundo eles, esses invasores querem tomar a fazenda que Amair comprou.
Estragos
Conforme dados do Instituto de Meio Ambiente (Imac), entre janeiro de 2021 e maio de 2022, a região ocupada ilegalmente pela família de Amair sofreu um desmate de 225,5 hectares. O instituto emitiu diversos autos de infração por diversos crimes ambientais, apreendeu equipamentos como: motosserras, combustível, correntes e outros.
A Rede Amazônica Acre teve acesso a alguns desses documentos e verificou que, durante esse período, o Imac multou Patrícia Coutinho da Cunha, filha de Amair, em mais de R$ 1,1 milhão por crimes ambientais cometidos na Unidade de Conservação Ambiental Floresta Estadual Antimary (FEA).
O major Kleison Albuquerque destacou ainda que o maior crime praticado na região pela família de Feijoli é o desmatamento ilegal na reserva.
Os órgãos ambientais vêm acompanhando a situação desde a mudança da família e, conforme as investigações, há vários pontos de desmatamentos que vêm sendo ampliados ao longo dos anos.
"Já pegaram a área aberta, então, ampliaram o desmatamento e mais, o incentivo às invasões que é um problema que o Acre vem enfrentando e eles estão expandido. O informe que a gente tem é que estão também no lado do Amazonas. Então, de imediato, esse desmatamento, mas também acho que a questão da impunidade.
Essa é a pior parte porque se a gente analisar que teve uma resposta imediata com Polícia militar, Civil, Imac, com a própria Semac e agora com a Seplag, que está coordenando o Grupo de Comando e Controle, o que fia a ação dele [Amair Feijoli] é a impunidade. A gente trabalha justamente nessa, não vou dizer lentidão, mas nesse tempo do processo legal. O processo legal é demorado e ele age justamente nesse espaço", criticou.
Fonte: G1
0 Comentários