Ofensiva no litoral Sul de São Paulo começou após assassinato de soldado da Rota, na quinta-feira

A Baixada Santista, em São Paulo, é alvo de ações violentas que já provocaram a morte de ao menos 14 pessoas desde a última sexta-feira, quando teve início uma operação policial contra o crime organizado na região. 

As ações foram deflagradas após o assassinato de um soldado da tropa de elite da Polícia Militar paulista e têm sido questionadas em denúncias apresentadas à Ouvidoria na corporação por supostos excessos das forças de segurança e até tortura. Entenda abaixo a Operação Escudo no litoral Sul do estado:

A origem

A Operação Escudo realizada na Baixada Santista começou na sexta-feira passada, horas após o soldado Patrick Bastos Reis, da Rotas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), ter sido baleado na comunidade Vila Zilda, no Guarujá. Ele chegou a ser socorrido ao Pronto Atendimento da Rodoviária, mas não resistiu aos ferimentos. Um outro policial também foi atingido na mão esquerda.

Em publicação nas redes sociais, o secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, lamentou a morte e anunciou o início da ofensiva: "Não vamos descansar enquanto não acharmos os responsáveis por esse crime", escreveu.

Contexto da região

A Baixada Santista é um dos pontos mais importantes para os negócios internacionais do Primeiro Comando da Capital (PCC). A proximidade com o maior porto do Brasil, em Santos, ajuda no escoamento das remessas de cocaína pura escondidas em cargas lícitas dentro de navios. Já as comunidades encravadas em áreas de mangues e morros de difícil acesso favorecem as fugas dos criminosos e a camuflagem da droga.

A região passou a ser estratégica para a facção no início dos anos 2000, segundo o promotor de Justiça Silvio Loubeh, do Grupo Especial de Atuação no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Santos. Nas comunidades onde se estabelece, a facção paulista costuma controlar os homicídios para não atrair a polícia e não interromper a venda das drogas.

Saldo até a noite de terça-feira

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) informou no fim da tarde de terça-feira que 14 pessoas haviam morrido desde o início das operações policiais.

Pela manhã, dois policiais militares foram baleados em Santos. Segundo a SSP, uma policial de 34 anos foi baleada pelas costas por criminosos que fugiram de carro para o morro São Bento. Outros agentes foram ao local em busca dos suspeitos e, ainda segundo o governo, foram recebidos a tiros disparados com pistolas e fuzis. Um segundo policial foi atingido na perna e um suspeito morreu no tiroteio.

Ao menos 32 pessoas já foram presas e 20,3 quilos de drogas, apreendidos. Os policiais também apreenderam 11 armas, dentre elas a pistola que teria sido usada no assassinato do soldado Patrick Reis. O suspeito de ter executado o crime, Erickson David Silva, entregou-se no domingo. Segundo as autoridades paulistas, ele assumiu a autoria dos disparos que mataram o policial. O irmão de Erickson também teve a prisão pedida.

Denúncias

A Ouvidoria das Polícias de São Paulo informou que tem recebido denúncias por excessos das forças de segurança desde o fim de semana, e que novos relatos “não param de chegar novas denúncias”, conforme declarou o chefe do órgão, Claudio Silva.

A ouvidoria disse haver "necessidade de criteriosa apuração das reais circunstâncias" das mortes ocorridas por policiais porque "os relatos de moradores da região preocupam, ensejando ações de acompanhamento e prevenção por mecanismos de proteção de Direitos Humanos, no controle da atividade estatal".

Em grupos nas redes sociais, moradores de diversas comunidades relatam um clima de apreensão e medo. Uma moradora da Vila Edna, que não quis se identificar, contou que não teve coragem de levar seu filho à escola na segunda-feira porque desde sábado há ações constantes da Rota na área em que mora, com “batidas nas casas das pessoas procurando por bandidos” e frequentes barulhos de trocas de tiros.

Reação de Tarcísio

O governador paulista saiu em defesa das forças de segurança do estado. Disse que não iria tolerar “excessos”, mas considerou que os relatos surgidos até aqui são “narrativas”, e que é preciso “ter respeito aos profissionais que estão trabalhando pela segurança pública”.

— Quem é que vai subir numa área dominada pelo crime e vai ser recebido de uma forma amistosa? A polícia não quer o confronto, isso não interessa para ninguém. Quando você faz uma asfixia em um local, você tem uma reação. 

Isso significa que a operação está gerando incômodo, que está prejudicando o ‘business’. Nós não queremos o combate, mas também não vamos nos curvar ao crime. Se houver excesso, nós vamos investigar. Se houver, porventura, a gente não vai tolerar excesso — declarou na terça-feira.

Tarcísio chamou a situação na Baixada de "guerra contra o narcotráfico" e disse que a polícia vai entrar em confronto apenas "em último caso", se "dispararem contra ela primeiro".

Investigações

Além da Ouvidoria das Polícias, outros órgãos e entidades monitoram os acontecimentos na Baixada Santista. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo reuniu na tarde de terça-feira diversas organizações e lideranças políticas, na sede da organização, no Centro da capital paulista, e montou um comitê de crise para apurar as mortes causadas durante as ações policiais.

Integram esse comitê ao menos sete organizações, como a Ouvidoria da Polícia de São Paulo, o Sindicato dos Advogados de São Paulo, o Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São Paulo, além da própria OAB.

O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) foi convidado para o encontro desta terça-feira, mas não compareceu. No órgão, promotores do Tribunal do Júri na Baixada Santista e do Grupo de Atuação Especial de Segurança Pública (GAESP) foram destacados para acompanhar as ações policiais.


Fonte: O GLOBO