Pastor usou um vídeo em que aparece a mãe de santo Marajoana de Xangô, da Tenda de Umbanda Luz da Vida, um padre e um pastor juntos em um culto ecumênico em janeiro de 2020 para criticar e ofender umbandistas. A denúncia foi feita em maio do ano passado.
O pastor Rodrigo Dias de São Paulo (SP) foi condenado, pela 5ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, a pagar indenização de R$ 12 mil de danos morais para a mãe de santo Marajoana de Xangô. Em maio do ano passado, o pastor usou seu canal no Youtube para criticar a presença de um padre, uma mãe de santo e um pastor entrando de mãos dadas em um templo religioso.
O vídeo em que os líderes religiosos aparecerem de mãos dadas é comentado pelo pastor Rodrigo. A postagem foi intitulada "Inacreditável! Pastor, padre e mãe de santo juntos na igreja. Onde iremos parar?". As imagens são de um culto ecumênico feito em janeiro de 2020 no Acre por formandos de psicologia e mostram a entrada de um padre, a mãe de santo Marajoana de Xangô, de mãos dadas em celebração.
Entre os formandos estava uma mãe de santo da Tenda de Umbanda Luz da Vida. O vídeo viralizou novamente e foi usado pelo pastor para criticar a celebração.
"Olhando apenas com os olhos carnais, pode parecer algo normal, para algumas pessoas pode ser até bonito, como atitude de pedir o fim da intolerância religiosa ou dos ataques contra outras religiões. Mas, olhando através de uma ótica espiritual, podemos ver que existem coisas muito mais profundas por trás dessa cena", dizia o pastor no vídeo.
Intolerância
A mãe de santo entrou na Justiça e denunciou o fato de sua imagem ter sido utilizada sem autorização, mas, acima disso, as palavras utilizadas pelo pastor que desqualificou as pessoas presentes no culto ecumênico e desrespeitou a religião.
Na contestação, o pastor afirmou que exerceu seu livre direito de manifestação do pensamento, de modo que em seu entendimento um pastor, padre e mãe de santo entrando juntos na igreja via na contramão do que está escrito na Bíblia.
Liminarmente, o vídeo foi removido da plataforma. A juíza de Direito Olívia Ribeiro definiu que a liberdade de expressão não pode ser utilizada para violar outro direito fundamental, que neste caso se trata da liberdade de crença e o livre exercício dos cultos religiosos, assegurados a todos os brasileiros na Constituição Federal.
A magistrada entendeu que a publicação causou danos morais à autora, tendo em vista que ela é a única representante de religião não adepta ao cristianismo, deste modo foi atribuída a sua pessoa e a sua religião semelhança com figuras demoníacas descritas na Bíblia.
“Vale consignar que nada obsta que qualquer pastor anuncie a mensagem do evangelho, orientando seus fiéis acerca daquilo que seria certo ou errado, pecado ou não, segundo a filosofia cristã, desde que respeite as diferenças religiosas, devendo ter atenção redobrada com o que é dito, publicado e postado na internet, em razão da velocidade e do alcance da informação”, destacou a juíza.
A reportagem entrou em contato com o pastor, mas não obteve retorno.
Denúncia
Após a denúncia, o Ministério Público do Acre (MP-AC) divulgou um comunicado de que vai investigar o suposto crime. "A denúncia será investigada pela Promotoria de Justiça Especializada de Defesa dos Direitos Humanos".
Além do referido pastor, a nota da Tenda na época também repudiava um canal religioso, do qual ele também aparece criticando e com discursos de ódio contra outras religiões. "Atacam diretamente a imagem da nossa dirigente espiritual Mãe Marajoana de Xangô e maximizam o preconceito contra as religiões de terreiro, em especial, à Umbanda", diz parte da nota.
O comunicado pedia ainda respeito à fé dos umbandistas e à líder espiritual citada pelo canal do qual o pastor participa.
"A Umbanda é paz e amor, é um mundo cheio de luz. É a prática do amor e da caridade para a expansão da consciência. O ecumenismo e a união de povos e culturas, a partir do respeito entre suas particularidades, é a expressão mais pura da prática real do que nos ensina Deus/Olorum/Zambi/Jeová/Allah...E ciente disso, não podemos aceitar que a Constituição Brasileira seja rasgada com práticas tão arcaicas e violentas de intolerância e preconceito".
'Respeite o meu sagrado'
A mãe de santo da Tenda Umbanda Luz da Vida que foi criticada pelo pastor, Marajoana de Xangô, destacou, na época, que intolerância religiosa é crime e exigiu respeito à sua fé, ao trabalho e a doutrina religiosa.
"Não somos coisas do demônio, senhor pastor. Conheça, para depois desbancar todo seu ódio contra seres humanos que respeitam a fé, e como cada um se encontra com seu encontro. Me respeite, respeite o meu sagrado, respeite os meus irmãos sacerdotes que não caminham com a sua forma intolerante de ser. Falta no senhor conhecimento, o mandamento mais precioso que Olorum, Deus, Olodumare, Shekinah, Elohin e todos os outros mil nomes simbólicos que existem sobre o divino que é o amor ao próximo", destacou.
Mãe Marajoana pede ainda que pessoas que agem assim como o pastor sejam denunciadas para evitar mais discursos de ódios que destroem ideologias.
"Respeite meu trabalho, a minha doutrina religiosa. Denuncie pessoas assim que são bitolados e fanáticos que machucam e destroem ideologias, da qual sua capacidade nunca irá alcançar e entender o que é Olorum (Deus). Vamos compartilhar para que isto não aconteça mais. Somos laicos e vivemos num país onde não há uma religião certa porque todas são casas que se religam com Deus", concluiu.
Fonte: G1
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