Dado veio mais baixo do que era estimado. Economistas não esperam, no entanto, que o BC acelere o ritmo de redução da Selic

A inflação oficial em agosto, medida pelo IPCA, foi de 0,23%, após ter ficado em 0,12% em julho. O resultado foi influenciado pelo aumento da conta de energia elétrica residencial, com o fim do chamado “Bônus Itaipu”, um desconto especial aplicado na conta de luz dos consumidores em julho.

Apesar desse aumento pontual, a leitura do mercado é que o resultado reforça as expectativas de uma nova redução de juros em 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na próxima semana, o que levaria a taxa ao patamar de 12,75% ao ano.

Isso porque o mercado esperava uma alta ainda maior dos preços no mês passado. A mediana das projeções de 36 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data apontava expectativa de 0,29% no IPCA. Além disso, a inflação de serviços, que vinha sendo reiteradamente um fator de preocupação para o Banco Central (BC), perdeu fôlego.

Na passagem de julho para agosto, a alta dos preços desses itens foi de 0,25% para 0,08%. No acumulado em 12 meses, a taxa caiu de 5,63% em julho para 5,43% no mês passado, o menor patamar desde janeiro de 2022.

Pouca chance de acelerar

Em seus últimos comunicados, o BC colocou o processo de desinflação de serviços como um dos fatores a serem observados para avaliar a sequência de cortes nos juros. Além disso, a autoridade monetária aguarda que as expectativas voltem a convergir mais para a meta e observa a evolução da atividade econômica, que tem se mostrado mais forte do que o previsto.

Ainda assim, apesar da trajetória benigna na inflação, economistas não esperam que o BC acelere o ritmo de redução dos juros em razão de fatores como o cenário externo negativo nas últimas semanas, a atividade econômica mais forte e preocupações com o cenário fiscal.

— Mesmo com o cenário externo e o câmbio marginalmente piores, essa queda em serviços é bem positiva para a política monetária, que deve seguir em queda nesse ritmo de 0,50 ponto percentual — disse a economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória.

Em relatório, Alberto Ramos, do Goldman Sachs, afirma que preços mais baixos de alimentos e inflação moderada devem apoiar a continuidade do corte de juros. Mas avalia que a margem para acelerar o ritmo de redução é limitada por uma atividade econômica resiliente e pelo fiscal expansionista, entre outros fatores.

Para especialistas, mesmo o aumento recente da cotação do barril de petróleo do tipo Brent no mercado internacional e o dólar mais alto não devem impactar negativamente as expectativas de inflação, tendo efeito sobre os ritmos de corte dos juros somente em 2024.

Ontem, o barril do Brent para novembro fechou a US$ 92,06. Para Rafaela, se o petróleo se consolidar em um patamar mais alto, com câmbio pressionado, poderemos ter novas altas de combustíveis, mas com impacto maior nos juros em 2024.

No cenário doméstico, o que limita um corte mais agressivo dos juros, na avaliação dos analistas, é a incerteza se o governo conseguirá assegurar as receitas necessárias para colocar o arcabouço fiscal de pé. Caso existam sinais de que isso não ocorrerá, pode haver deterioração de expectativas.

— Vimos uma queda de arrecadação significativa em julho e devemos ter números ainda fracos em agosto. Isso traz preocupações sobre o cumprimento da meta. Cenários externo e preocupação com o fiscal impedem uma melhora adicional nas expectativas mais longas de inflação. Dificilmente, veremos um corte de 0,75 ponto percentual nas próximas reuniões — afirmou Rafaela.

Já a economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, avalia que, após a divulgação do IPCA, ainda há espaço para uma redução de 0,75 ponto nos juros na reunião de dezembro.

— Apesar de a atividade ter surpreendido positivamente no primeiro semestre, vislumbramos uma estabilização no terceiro e no quarto trimestres — afirmou.

Energia e gasolina

Com o resultado de agosto, a taxa acumulada em 12 meses acelerou de 3,99% em julho para 4,61% no mês passado. Esse movimento era esperado em razão da base de comparação. No segundo semestre do ano passado, na esteira das eleições presidenciais, houve isenção de tributos de combustíveis, energia e telecomunicações.

Em julho e agosto do ano passado, o país teve deflação influenciada por estes itens. Ainda assim, o resultado segue dentro do teto da meta fixada para este ano. O alvo é de 3,25%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual.

A maior pressão no mês de agosto, segundo o IBGE, foi a energia elétrica, com alta de 4,59% em razão do fim do bônus de Itaipu, um saldo positivo na conta de comercialização de energia elétrica da usina de Itaipu no ano passado, que foi repassado para as contas de luz em julho.

Entre os grupos pesquisados, Habitação subiu 1,1% com a energia elétrica. Houve alta ainda em Saúde e cuidados pessoais (0,58%) e Transportes (0,34%). Em compensação, o grupo Alimentação e bebidas teve queda de 0,85%, influenciado pela alimentação no domicílio e itens como batata, tomate, frango e carnes.

O IPCA acumulado no ano ficou em 3,23%. Em 2023, a maior vilã é a gasolina, com alta de 13,02% de janeiro a agosto. Os outros itens com maior impacto foram o emplacamento e licenciamento de veículos (13,64%), planos de saúde (8,24%), energia elétrica (7,35%) e ensino fundamental (10,63%).


Fonte: O GLOBO