Acordo alinhavado com o Planalto prevê que as 12 vice-presidências do banco sejam ocupadas por indicados do bloco partidário

Em novo movimento para atender aos interesses do Centrão, Luiz Inácio Lula da Silva iniciou as mudanças na cúpula da Caixa Econômica Federal e demitiu a presidente do banco, Rita Serrano, que dará lugar a Carlos Antônio Vieira Fernandes, apadrinhado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). A acomodação surtiu efeito imediato: após semanas de adiamento, os deputados aprovaram na noite de ontem o projeto que prevê a taxação dos “super-ricos”, parte essencial da agenda econômica do governo.

Contando mandatos interinos, esta é a sexta troca na presidência da Caixa desde 2018. Ou seja, em média, cada ocupante fica no cargo por um ano. O banco desperta a cobiça de políticos por operar programas que garantem visibilidade e entregas na ponta da sociedade, como o Minha Casa Minha Vida e o Bolsa Família, ambos de forte apelo eleitoral, além de fornecer crédito a projetos de infraestrutura de estados e municípios.

A ofensiva do Centrão terá novos capítulos, já que o acordo alinhavado com o Planalto prevê que as 12 vice-presidências da Caixa também sejam ocupadas por indicados do bloco partidário. A estratégia é repartir o espaço entre PP, Republicanos, PSD e União Brasil. O loteamento resultou em escândalos em governos petistas, com acusações de desvios levadas à Justiça. Já na gestão de Jair Bolsonaro, Pedro Guimarães, que presidiu o banco, virou réu por assédio sexual. Ele nega as acusações.

A troca aprofunda a aliança de Lula com o Centrão, consolidada em setembro com a entrada dos deputados André Fufuca (PP-MA) no Ministério do Esporte e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) na pasta de Portos e Aeroportos. Na campanha eleitoral, o presidente chegou a afirmar que, se eleito, teria que “dar um jeito” no grupo.

Prioridades

Lula selou a troca em uma reunião com Serrano no Palácio do Planalto. Em nota, o governo afirmou que o presidente agradeceu o trabalho e dedicação e que ela aumentou a “eficiência e rentabilidade” da instituição. No Ministério da Fazenda, a mudança foi vista como um gesto necessário para destravar a agenda econômica. O ministro Fernando Haddad estipulou como meta zerar o déficit público no ano que vem, o que depende da aprovação de uma série de projetos no Congresso.

Somada à pressão do Centrão, uma exposição na Caixa Cultural que retratou Lira dentro de uma lata de lixo contribuiu para a queda. A mostra irritou Lula, segundo interlocutores, e o presidente teria questionado a Casa Civil na segunda-feira sobre o andamento do processo de nomeação de Vieira Fernandes — cabe à pasta fazer uma checagem antes de as trocas serem formalizadas.

Servidor de carreira da Caixa, Vieira Fernandes começou a pavimentar sua ascensão no banco há dez anos, no governo Dilma Rousseff. A partir de 2013, ocupou postos-chave em ministérios de orçamento robusto, o que o aproximou do trâmite de liberação de emendas parlamentares e estreitou sua relação com o Congresso.

Na função de secretário-executivo do Ministério das Cidades, foi braço-direito de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), hoje líder da Maioria na Câmara; e de Gilberto Occhi, nome próximo ao Centrão. A experiência o levou a exercer a mesma função na pasta da Integração Nacional, quando Occhi foi para o cargo. 

Vieira Fernandes também presidiu o Funcef, fundo de pensão dos funcionários da Caixa, já no governo de Michel Temer. A amigos, ele disse ontem que uma conjunção de fatores o levou à indicação. E também relatou que foi aconselhado a se recolher até a publicação no Diário Oficial, para evitar entrar na mira de adversários.

Passivo de escândalos

O loteamento político da Caixa em sucessivos governos vem sendo acompanhado de escândalos. Em um deles, o desdobramento de uma investigação sobre desvios no banco resultou em uma condenação a Geddel Vieira Lima, que foi vice-presidente da instituição. 

Policiais encontraram R$ 51 milhões em espécie em um imóvel ligado a Geddel, dinheiro que a acusação sustentou ser propina, o que ele nega. O Supremo Tribunal Federal manteve a condenação por lavagem de dinheiro, mas o absolveu por associação criminosa.

Já os ex-presidentes da Câmara Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves foram condenados em primeira instância em processos ligados a desvios na Caixa, mas depois foram absolvidos. Eles negam irregularidades (Colaboraram Lauriberto Pompeu e Renan Monteiro)


Fonte: O GLOBO