Títulos argentinos operam em queda. Resultado 'prolonga a enorme incerteza por quatro semanas', afirma economista da Bloomberg

Os investidores argentinos voltaram a se preparar para uma liquidação depois que o ministro da Economia, Sergio Massa, teve um desempenho melhor do que o previsto na votação presidencial de domingo, frustrando as esperanças de uma vitória absoluta de um candidato mais favorável ao mercado.

Os títulos em dólar do país - já negociados abaixo de 30 centavos de dólar - ampliaram suas perdas nesta segunda-feira, com cinco deles, incluindo a nota de 2029, figurando entre os de pior desempenho nos mercados emergentes.

O peso pode se enfraquecer nos mercados cambiais paralelos, na expectativa de que os argentinos corram para comprar dólares, uma vez que o governo continua com as políticas de gastos que são vistas como um estímulo à inflação, que já ultrapassa 130%.

O peronista Massa, candidato pela coalizão União pela Pátria, surpreendeu os especialistas na noite de domingo ao obter 37% dos votos, forçando a realização de um segundo turno no mês que vem com o segundo colocado, Javier Milei, ultraliberal radical, que obteve 30% de apoio com 97% dos votos apurados.

A maior questão para os investidores é saber para quem os apoiadores da candidata que ficou em terceiro lugar, Patricia Bullrich, migrarão no segundo turno, marcado para 19 de novembro.

A final entre Massa e Milei foi o resultado que preocupa os investidores em títulos, pois prolonga a incerteza em um momento em que a Argentina precisa desesperadamente de mudanças na política. A maioria das notas internacionais da Argentina permaneceu abaixo de 30 centavos de dólar nas últimas semanas, num patamar que sinaliza o risco de novo calote nos pagamentos, previstos para o ano que vem, da dívida já renegociada após o último default da Argentina.

- Massa primeiro, Milei depois é possivelmente o pior cenário para os mercados. Isso prolonga a incerteza, que já é alta, por mais quatro semanas, e é provável que nenhum dos dois forneça detalhes granulares sobre seus planos de política. Massa poderia agora dobrar sua abordagem populista de um peso artificialmente forte, intervencionismo e medidas fiscais onerosa - afirma a economista Adriana Dupita.

Os preços dos títulos cairão de três a quatro centavos com as apostas de que o governo se sentirá autorizado a manter suas políticas econômicas por mais tempo, alimentando ainda mais a inflação e pressionando mais o peso para baixo, de acordo com Alejo Costa, estrategista-chefe do BTG Pactual em Buenos Aires.

- O governo fará de tudo e mais um pouco antes do segundo turno, ampliando as políticas recentes - afirmou Costa.

Uma possibilidade, segundo Costa, é tentar conquistar os eleitores com uma nova rodada de gastos que o governo não pode arcar.

Nos últimos meses, Massa concedeu cheques de assistência social aos trabalhadores, bônus para aposentados e cortes de impostos para 99% da população, sendo que este último deverá custar ao governo cerca de 0,8% do PIB, ou cerca de US$ 3,5 bilhões pela taxa de câmbio oficial.

Tudo isso aumentou a pressão sobre uma situação econômica já terrível, com o país caminhando para sua sexta recessão em uma década, em meio a uma inflação brutal e uma moeda que perdeu mais de 90% de seu valor nos últimos quatro anos.

Os investidores esperavam uma apresentação mais forte de Milei ou Bullrich, acreditando que qualquer um deles buscaria uma reforma econômica mais agressiva como presidente.

- O resultado preferido pelo mercado teria sido um forte apoio popular a Patricia Bullrich e sua equipe de tecnocratas ortodoxos experientes"- disse Graham Stock, estrategista sênior de mercados emergentes da RBC Bluebay Asset Management. - Massa e Milei anunciam uma maior incerteza.

- A liderança de Massa no primeiro turno lhe dá incentivo para adiar o realinhamento da taxa oficial do peso. Um novo aumento da taxa de juros é uma possibilidade - com poucos dólares nos cofres de reserva, o governo pode querer aumentar os custos de financiamento para reduzir a demanda por dólares e aliviar a pressão sobre os mercados paralelos - disse Adriana Dupita.

Propostas radicais de Milei

Milei conquistou seguidores com uma proposta radical de eliminar totalmente o peso e usar o dólar americano como moeda oficial do país. A medida é vista como de alto risco, com alguns economistas alertando que ela poderia alimentar ainda mais a inflação. Sua forte atuação nas primárias de agosto pegou os mercados de surpresa, com os investidores correndo para vender os títulos em meio a preocupações sobre sua capacidade de governar.

Inicialmente, o peso argentino se fortaleceu nos mercados de criptomoedas na noite de domingo, ganhando até 20% em relação a uma moeda estável vinculada ao dólar, depois que os resultados preliminares foram divulgados, mostrando Massa à frente antes da redução. Os investidores podem ter apostado que o governo adiaria uma desvalorização da taxa de câmbio oficial.


Fonte: O GLOBO