Desde 2013, categoria fez um total de 10 greves em São Paulo

A greve que afetou parte importante do transporte sobre trilhos em São Paulo na terça-feira é resultado de uma queda de braço entre os metroviários e o governador Tarcísio de Freitas e revela uma tentativa da categoria de voltar a influenciar o debate político do estado, assim como fez em anos anteriores. Agora, porém, com uma pauta que tem potencial de mudar o futuro da classe.

De 2013 para cá, os funcionários do metrô fizeram um total de 10 greves. Só este ano foram duas: uma nesta terça e outra em março. Os dados foram levantados pelo diretor do Sindicato dos Metroviários, Altino Prazeres, a pedido do GLOBO. O tamanho do desafio de Tarcísio se mostra num simples fato: 2023 já é o ano com mais paralisações no metrô, ao lado de 2017. Veja os números:

Histórico de greves no Metrô de SP
  • 2013 - 0
  • 2014 - 1
  • 2015 - 0
  • 2016 - 0
  • 2017 - 2
  • 2018 - 1
  • 2019 - 1
  • 2020 - 1
  • 2021 - 1
  • 2022 - 1
  • 2023 - 2
A greve desta semana durou exatas 24h e parou todas as linhas do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) que não estão sob gestão da iniciativa privada. O governo e a prefeitura, para tentar minimizar os impactos, decretaram ponto facultativo e suspenderam o rodízio de carros.

Em 2014, durante o governo do então tucano Geraldo Alckmin, hoje vice-presidente da República, os metroviários promoveram uma paralisação que se estendeu por cinco dias e resultou na demissão de 42 funcionários por justa causa às vésperas da Copa do Mundo, que naquele ano ocorreu no Brasil. 

A greve foi marcada por confrontos entre policiais e manifestantes, além de reivindicações de reajuste salarial. Na época, Altino Prazeres — que presidia o sindicato — se tornou figura de destaque em meio às manifestações. Na última eleição, ele foi candidato ao governo de São Paulo pelo PSTU.

Contra as reformas

Em 2017, a categoria voltou aos holofotes com duas greves, uma em março e outra em abril. O mote, aqui, tinha também teor político: metroviários protestavam junto a outras categorias contra as reformas trabalhista e da Previdência do governo Michel Temer. De 2018 para frente, São Paulo teve praticamente uma greve por ano — a de 2020, porém, durou pouco mais de uma hora. Agora, a menos de três meses do fim do ano, Tarcísio acumula duas greves neste início de mandato.

Na desta terça, representantes das três categorias cobraram de Tarcísio um plebiscito para consultar a população sobre a desestatização da Sabesp e o avanço das concessões de linhas do metrô e trem. O argumento das entidades é que a entrega para a iniciativa privada significa um “desmonte dos serviços públicos”, o que pode resultar no aumento de tarifas do transporte e da água no estado.

— O fundamento da greve de ontem é a privatização. Há um embate entre o que historicamente os metroviários pensam e o que o atual governador defende. Diferente de outros anos, é um tema que mexe muito mais com a categoria — afirma Marco Antonio Carvalho Teixeira, professor de Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV) São Paulo.

O professor afirma que a categoria desempenha um trabalho essencial cuja paralisação atrapalha a rotina da cidade. Por isso mesmo, tem grande potencial de chamar atenção para o tema levantado.

— A categoria tem um peso. Ela possui uma capacidade grande de chamar atenção para as suas pautas, dada a natureza do trabalho que exerce. O movimento tem um alcance grande. Agora, se tem fôlego para continuar, é outra história — explica ele.

Greve opõe pré-candidatos

Embora o governo tenha tentado se blindar, não foi possível evitar a repercussão da greve e das reivindicações dos sindicatos nas estações e terminais, onde filiados a partidos de esquerda promoveram uma grande campanha contrária ao projeto de privatização do atual governo. Eles distribuíram panfletos, fizeram abaixo-assinado e até discurso em caixa de som portátil.

Nas redes sociais, não foi diferente. Mas ainda ganhou "um quê" eleitoral. Políticos como o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), pré-candidato à prefeitura de São Paulo, aproveitaram o momento de greve para disparar críticas contra o governador e ex-ministro bolsonarista Tarcísio de Freitas, que deve apoiar seu adversário, o prefeito Ricardo Nunes, na eleição municipal de 2024.

"A intransigência do governo de SP é a grande responsável pela greve de hoje no Metrô/CPTM. Os trabalhadores propuseram em juízo liberar as catracas em vez da paralisação, para não prejudicar os usuários. O governo estadual recusou a proposta. Apostou no conflito, e não no diálogo", escreveu o líder sem-teto, que já adota um tom moderado de olho no eleitorado do centro de cidade.

A direita reagiu, e passou a tratar a greve como uma iniciativa política, citando, inclusive, o fato de a presidente do Sindicato dos Metroviários, Camila Lisboa, ser filiada ao PSOL.

"Lamentamos que nossa população seja prejudicada por uma greve ideológica, apoiada por partidos como o PSOL, da presidente do Sindicato dos Metroviários. Uma greve que não está, sequer, respeitando decisão da Justiça", escreveu Ricardo Nunes, que chamou a paralisação de "greve político-ideológica".

O advogado de Jair Bolsonaro e ex-secretário especial de Comunicação Social (Secom), Fabio Wajngarten, que atua na campanha de Nunes, disse que a greve terá impactos nas próximas eleições:

"A população está mais informada, sabe quem está ao lado dela e quem está dificultando o seu já complexo dia a dia. São Paulo e o Brasil precisam de candidatos com valores claros e preocupados com o povo", afirmou Wajngarten.


Fonte: O GLOBO