Empréstimo junto ao Novo Banco de Desenvolvimento, presidido pela ex-presidente Dilma, foi firmado com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad

Um empréstimo de US$ 1 bilhão do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês, também conhecido como “Banco dos Brics”) para o Brasil, contratado no último dia 12 para apoiar o financiamento a pequenos negócios, servirá, na verdade, para ressarcir investimentos já feitos pelo Tesouro Nacional no Peac, programa de garantia de crédito do BNDES. Não haverá ampliação da capacidade do Peac, como os bancos privados chegaram a defender, no fim do primeiro semestre.

Na capacidade atual, o Peac deverá avalizar 40 bilhões este ano em empréstimos para pequenos negócios, incluindo MEIs, como revelou O GLOBO em agosto. O BNDES reafirmou agora essa projeção e informou que ainda não há um valor para 2024. Até o último dia 20, o valor estava em R$ 33,6 bilhões avalizados este ano.

Mecanismo similar ao seguro-fiança

O Peac funciona como um seguro-fiança de aluguel imobiliário, oferecendo ao tomador do empréstimo a garantia, assim como o seguro permite ao inquilino alugar a moradia sem um fiador. O aval vem de um fundo do BNDES, o FGI. Quem empresta são os bancos privados, com recursos deles. Se o cliente que tomou o empréstimo dá calote, o aval cobre a perda.

BNDES: sede do banco no Centro do Rio — Foto: Fábio Rossi/Agência O Globo

Reaberto em 2022

Lançado pelo governo federal em 2020 para enfrentar a crise da Covid-19, o programa partiu de um aporte de R$ 20 bilhões do Tesouro no FGI. Ele teria vigência apenas até dezembro de 2020, mas foi reaberto em agosto do ano passado, ainda no governo Bolsonaro.

Economistas que participaram das mudanças nas políticas do BNDES no governo Temer – como Vinicius Carrasco, ex-diretor do banco de fomento, e Fábio Kanczuk, que foi do Ministério da Fazenda e, já no governo Bolsonaro, diretor do Banco Central (BC) – criticam a continuidade do programa.

Isso porque ele estimula a contratação de crédito para empresas, num momento em que o BC vem mantendo os juros elevados para conter financiamentos e frear a inflação. O Peac foi fundamental no auge da pandemia, quando as empresas precisavam de capital de giro para enfrentarem as restrições ao contato social, mas deveria ser temporário, argumentam os economistas.

Na contramão da expansão do BNDES

Apesar da continuidade do programa – aprovada em lei em abril –, a decisão do Ministério da Fazenda sobre o uso do empréstimo do NDB vai na contramão da expansão do BNDES. Também evita novos gastos para o Tesouro, num cenário em que a equipe do ministro Fernando Haddad busca fontes de receitas, para fechar as contas de 2024 com déficit zero.

Em junho, uma reunião da Febraban, entidade que representa os bancos privados, chegou a debater a possibilidade de um novo aporte do Tesouro no Peac, em torno de R$ 2 bilhões, como estratégia para enfrentar a escassez de financiamentos provocada pela crise financeira das Americanas.

O empréstimo com o NDB foi firmado em reunião do ministro Haddad com a presidente da instituição multilateral, a ex-presidente Dilma Rousseff, durante o encontro anual do FMI e do Banco Mundial, no Marrocos. A operação foi anunciada como destinada ao Peac. O empréstimo tem prazo de 30 anos e juros de 1,64% ao ano, informou o Ministério da Fazenda.

Questionado se o financiamento turbinaria a capacidade de garantir empréstimos do Peac, o BNDES informou, em nota, que “o empréstimo tem o objetivo de reembolsar a União pelos aportes já feitos”, sem “compromissos adicionais”.

“O mutuário (tomador do empréstimo) é a União, representada pelo Ministério da Fazenda. O BNDES figura como executor, já que é o gestor do FGI-PEAC. O empréstimo tem o objetivo de reembolsar a União pelos aportes já feitos no FGI-PEAC. O contrato não implica em compromissos adicionais por parte do BNDES, cujas responsabilidades estão normatizadas nos regramentos já existentes do FGI-PEAC”, diz uma nota do banco.


Fonte: O GLOBO