Crianças passam longas horas sedentárias assumindo posturas inapropriadas para o corpo

É cada vez mais frequente, no âmbito de nossa clínica (e essa tendência se torna nítida ao compartilhar experiências com colegas, demonstrando que não se trata de um problema circunscrito, mas sim generalizado, não respeitando classe social, raça, crença religiosa, ou gênero), recebermos pacientes de uma faixa etária notadamente distinta daquela que frequentava nossos consultórios há 15 anos.

São jovens entre 12 e 25 anos queixando-se de dores nas costas e articulações. Tais desconfortos, em alguns casos, adquirem caráter limitante, afetando não somente o bem-estar físico, mas também o estado emocional dos pacientes. A progressão dessas dores para um quadro crônico instaura um ciclo vicioso, gerando irritabilidade, diminuição do limiar de dor e, por conseguinte, ampliação do sofrimento. Esse contexto impacta na capacidade de executar atividades cotidianas, culminando em quadros depressivos, perpetuando assim essa sequência que se avoluma como uma “bola de neve”.

Frequentemente, as dores têm origem em lesões musculares e articulares resultantes de agressões repetidas a essas estruturas. Tal situação, ocorrendo em uma fase da vida em que o sistema musculoesquelético ainda se encontra em desenvolvimento, torna o problema ainda mais grave.

O corpo humano é destinado ao movimento constante, com escassos intervalos de inatividade ao longo do dia. Contudo, o estilo de vida contemporâneo tem levado as pessoas a adotar condutas contrárias a essa natureza. Atividades corriqueiras que permeavam a infância de gerações passadas, têm gradativamente desaparecido.

Atualmente, crianças passam longas horas sedentárias em salas de aula, imersas no seu mundo tecnológico e permanecem em casa, nesta mesma situação, assumindo posturas inapropriadas para o corpo.

Embora a percepção da dor seja subjetiva e influenciada por diversos fatores biopsicossociais, frequentemente observamos que as dores estão relacionadas a lesões reais nas articulações. Tal quadro decorre do desenvolvimento inadequado desses jovens, consequência de posturas inadequadas, sedentarismo e enfraquecimento da musculatura de proteção articular, causados pelo uso excessivo da tecnologia. Essas lesões podem acompanhar o indivíduo ao longo de sua vida, afetando tanto sua aptidão física quanto mental e comprometendo sua capacidade produtiva.

Não é por acaso que a Organização Mundial da Saúde (OMS) relata que cerca de 80% da população global já sofreu, sofre ou sofrerá com dores nas costas, evidenciando a crescente prevalência desse problema à medida que imergimos cada vez mais nessa nova realidade.

Um exemplo notório do que devemos evitar em nossa rotina diária, seja no trabalho ou no lazer (especialmente comum na faixa etária mencionada), é a posição sentada em cadeiras ou sofás, pois desde a década de 1970 temos conhecimento, por meio de um estudo conduzido em cadáveres por um colega chamado Nachemson, que a pressão nos discos intervertebrais, estruturas que funcionam como amortecedores entre as vértebras, varia significativamente de acordo com a postura: pressão quando deitado: 25 N; pressão de pé: 100 N; pressão sentado: 150 N, podendo atingir até 250 N em postura inadequada.

De posse das informações, podemos começar estimulando as famílias a reduzir o tempo despendido em atividades sedentárias, principalmente aquelas em que o indivíduo fica sentado, exceto quando estritamente necessário. Ademais, é fundamental promover a prática de atividades físicas que envolvam uma variedade de movimentos corporais, em vez de restringir os nossos jovens a uma única forma de exercício, como é comum hoje.

É de suma importância que conscientizemos as famílias sobre a necessidade de orientar e supervisionar seus filhos e netos, para evitar a criação de uma geração de incapazes.


Fonte: O GLOBO