Líderes do ranking mundial, elas podem levar o Brasil de volta ao ouro em Jogos Pan-americanos em Santiago; amigas desde 2014, elas só discordam na hora do cardápio: uma prefere massa e a outra, churrasco

O vôlei de praia do Brasil estreia neste sábado nos Jogos Pan-americanos com a dupla sensação Duda e Ana Patrícia, líderes do ranking mundial, que enfrenta Molina e Soler, de El Salvador, às 16h30 (de Brasília) no Parque Peñalolen, em Santiago. No masculino, a dupla formada por André e George, quinta colocada na lista, enfrenta às 18h30 Flores e Guatemala, também de El Salvador. 

O Brasil é o principal medalhista da modalidade, incluída no programa desde 1999. São cinco ouros, três pratas e quatro bronzes. Mas, desde a edição de 2011 o Brasil não sobe ao lugar mais alto do pódio. Os últimos campeões foram Juliana Silva e Larissa França, e Alison Cerutti e Emanuel Rego.

Parece que o momento é propício para a retomada. Duda e Ana Patrícia dificilmente ficam fora do pódio. Neste ano, venceram quatro etapas do Circuito Mundial, em cinco finais disputadas. Na última etapa, em Paris, cidade sede dos Jogos Olímpicos de 2024, elas venceram os seis jogos, perdendo apenas um set. Elas lideram a corrida pelo título internacional e devem confirmar o bicampeonato.

A lista dos pódios inclui a prata no Campeonato Mundial, disputado no último final de semana, em Tlaxcala, no México (no ano passado, elas haviam sido ouro). E oito títulos no Circuito Brasileiro, em oito etapas disputadas. Elas já são campeãs nacionais por antecipação.

— Estamos bem, graças a Deus. A gente se diverte muito, apesar das responsabilidades e da pressão. A gente gosta muito do que faz e tentamos aproveitar tudo. O tempo passa rápido — diz Duda, de 25 anos, um ano a menos que a parceira.

Duda: estrela do vôlei de praia, tem defesa e ataque como pontos fortes — Foto: Divulgação FIVB

Elas se juntaram como dupla após os Jogos de Tóquio-2020 e representam o Praia Clube. Duda estava com Ágatha: elas conquistaram oito ouros no Circuito Mundial e terminaram na nona colocação na Olimpíada. Ana Patrícia foi quinta colocada em Tóquio ao lado de Rebecca, além de terem sido campeãs brasileiras e de terem conquistado pódios em etapas internacionais.

— A frase que mais ouvi na vida é que eu deveria me juntar à Duda. Nós duas vivemos nossos processos, respeitamos nossos projetos e parceiras. A gente não havia planejado nada, mas acho que há planos que não mandamos, que acontecem quando tem de acontecer. Planos de Deus — declara Ana Patrícia, que comenta que Duda a apoiou demais pós-Tóquio, quando foi duramente criticada nas redes sociais.— Foi muito pesado e me pegou a ponto de repensar minha carreira. Nunca havia vivido esta coisa sombria da internet.

Amizade antiga

Não é hoje que ambas se dão bem na quadra e fora dela. Elas já estiveram juntas lá atrás, na época juvenil. Há nove anos ganharam o primeiro título internacional juntas, os Jogos Olímpicos da Juventude de 2014 (China). Também foram bicampeãs Mundiais sub-21 em 2016 (Suíça) e 2017 (China). Ana Patrícia diz que há muito "respeito e empatia mútuo"

— Essa conexão me marca muito. Em 2014, Duda já estava se consagrando e me abraçou de uma forma que acho não teria tido de outra pessoa. Eu tinha seis meses de vôlei. A partir daí, já começou a ser construída uma relação de amizade que se perdurou até hoje. Agora, amadurecidas, a gente também conseguiu manter a nossa criança daquela época — diz Ana Patrícia que conta o que elas gostam de fazer além de dormir e ganhar: — Comer. A Duda gosta de comida italiana e eu, de churrasco. A gente não exagera, esta é uma questão tranquila. A gente aproveita os momentos.

Ana Patrícia fala que as duas riem de tudo, pegam no pé da comissão técnica juntas. Duda diz que nunca esqueceu a estreia internacional da dupla, na China. Elas são novas, mas têm muitas histórias para contar.


Ana Patrícia: levanta a bola para a dupla mas é quem 'manda' no bloqueio — Foto: Divulgação FIVB

— Éramos duas crianças, com uns 15 anos. A gente nem sabia o que estava fazendo. Trazemos desta época nossa união, amizade e o jeito criança mesmo. Estamos amadurecidas, mas isso se mantém e é importante para uma dupla de vôlei de praia — afirma Duda.

O técnico Lucas Palermo acompanha essa evolução de ambas desde a época dos Jogos da Juventude. Ele foi assistente técnico da Cida, mãe da Duda, que era técnica na base. Iniciou o trabalho com Duda como preparador físico em 2013, quando ela era uma menina.

— Elas amadureceram muito depois dos Jogos da Juventude ao tomarem caminhos distintos. Ágatha tinha acabado de ser medalhista olímpica e Duda teve cinco anos extremamente profissionais a seu lado. E a Ana Patrícia teve o preparador físico Oliveira Neto e o técnico Reis Castro, que trabalharam com a Larissa, Talita e Juliana, como excelentes professores. 

Além de Rebecca que lhe ajudou neste desenvolvimento também — pontua Lucas, que voltou ao convívio com Ana Patrícia agora, no final de 2021. — Duda tem muito da simplicidade da Cida e a vontade de ajudar o próximo. Duda é um fenômeno. E além disso, é uma super trabalhadora. Teria tudo tecnicamente falando para ser 'encostada' porque tem o dom. E a Patrícia é outra que se dedica 100% e joga o que joga. Elas estão focadas e querem atingir sempre o melhor resultado. Qual seria? Campeãs olímpicas.

Ele afirma que elas estão "num nível técnico muito bom e com espaço para crescimento exponencial". Mas que não se pode falar em favoritismo antes de entrar em quadra. Ele cita quatro times no mesmo nível: os times americanos (Hughes e Cheng e Kloth e Nuss), da Austrália (Clancy e Maria Fé) e do Canadá, com Melissa e Brandie. As canadenses estão em Santiago.

—Estamos entrando na quinta semana seguida de competições. Fizemos grande esforço para estar aqui. É o nosso primeiro Pan porque a competição chocava com outras no calendário. E estamos abertas a viver essa experiência, brigar por esta medalha — fala Ana Patrícia.

Segundo ela, a dupla não fica olhando o ranking, contando pontos na corrida para Paris. Elas querem evitar maior ansiedade e também porque acreditam que ainda tem muito tempo pela frente. A lista das classificadas será conhecida em junho de 2024.

— Mas, se estivermos em Paris, quero viver a experiência olímpica. Porque em Tóquio, eu fui muito neurótica, uma rocha. Não olhava outra coisa. E não era eu... não tenho uma foto, nem na vila, nem com outros atletas. Eu sou muito avacalhada, gosto de curtir, brincar. Sempre com foco na quadra.


Fonte: O GLOBO