Nenhum alimento tem superpoderes, e nenhum é, por si só, garantia de saúde. O melhor que você pode fazer, no que diz respeito a alimentação, é manter uma dieta balanceada. Sem ela, nenhum superalimento salva

Todo mundo já leu em jornais e revistas sobre alimentos indispensáveis para uma boa saúde, muitas vezes com exageros relacionados ao papel dessa ou daquela comida na prevenção de doenças ou como ingrediente indispensável ao funcionamento adequado do corpo humano. 

São textos do tipo “dez alimentos que não podem faltar na sua mesa”, ou “dez alimentos para prevenir...” insira aqui câncer, osteoporose, cardiopatias, colesterol, pressão alta. Mais de cem alimentos já foram catalogados como “super”, incluindo mirtilos, salmão, espinafre, couve, abacate, brócolis, algas, castanhas, nozes, tomates, goji, chia, kefir, kombucha...

Alimentos são elevados a “super” geralmente porque contêm algum micronutriente em grande quantidade, e este micronutriente está associado ao suposto poder de curar ou prevenir doenças. São antioxidantes, vitaminas e/ou minerais que também estão presentes em outros alimentos e que conseguimos suprir normalmente com uma dieta balanceada.

Por exemplo, mirtilos têm grandes quantidades de vitamina C, mas limões e laranjas também. Couve tem vitamina A, mas não tanto quanto cenoura, por exemplo. Em geral, não há nada que um único alimento possa ter de tão especial a ponto de torná-lo indispensável ou insubstituível. Micronutrientes existem em diversos alimentos e combinações. 

Mas vender algo prometendo superpoderes é sempre bom marketing. Mais ainda se o alimento “superpoderoso” estiver encalhado. De acordo com o Relatório Nielsen de Saúde e Bem-Estar, publicado em 2015 nos EUA, 80% dos respondentes enxergam alimentos como remédios. Reportagem no jornal britânico The Guardian de 2016 aponta que 61% dos entrevistados dizem comprar alimentos que acreditam ter superpoderes para nutrição e saúde.

A primeira grande campanha de marketing para elevar um alimento a “super” talvez tenha ocorrido nos Estados Unidos durante a I Guerra Mundial, com a promoção da banana – incluindo publicidade para incorporá-la ao café da manhã, misturada ao cereal. 

Era uma época de escassez, mas a banana estava disponível e barata. Empresas como a United Fruit Company começaram a publicar panfletos exaltando as qualidades nutricionais da banana. A campanha só esqueceu de contar que a United Fruit Company era conhecida por suas condições de trabalho em regime de semiescravidão e pelo racismo com que tratava os funcionários.

Um exemplo mais moderno e que passa quase despercebido entre outros mais óbvios como quinoa e chia, é o abacate. Promovido por ser rico em gordura monoinsaturada, ou “gordura saudável”, a fruta tornou-se a mais popular dos EUA. Este tipo de gordura é realmente mais saudável para o sistema cardiovascular, mas o abacate não é a única fonte. 

Encontramos o mesmo tipo de gordura no azeite, alguns peixes, nozes e vários outros alimentos. Apesar de saudável, o abacate é um alimento rico em energia, e portanto, bastante calórico, o que não é problema para um consumo moderado, mas o marketing “super” estimula o excesso.

A narrativa do “superalimento” também tem impactos econômicos e ambientais. A corrida para plantar o abacate adorado pelos americanos criou um problema de desmatamento no México. Além disso, as plantações consomem muita água. Os abacates são pesados e precisam de refrigeração no transporte. Pode ser saudável para quem come, mas não é sustentável para o planeta.

O marketing de superalimento usa jargão e estudos supostamente científicos para convencer o consumidor a optar por certos produtos. Infelizmente, nenhum alimento tem superpoderes, e nenhum é, por si só, garantia de saúde. O melhor que você pode fazer por seu corpo, no que diz respeito a alimentação, é manter uma dieta balanceada. Sem ela, nenhum superalimento salva.


Fonte: O GLOBO