Uma informação de inteligência sobre uma fuga de traficantes no final de setembro pela Baia de Guanabara foi usada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro nas reuniões com o governo federal para justificar a necessidade de uma operação especial para patrulhar portos e aeroportos.

O episódio ocorreu no dia seguinte a uma reportagem do Fantástico que mostrou que o tráfico mantinha um "centro de treinamento" de táticas de guerrilha na favela da Maré, um dos maiores complexos de favelas do Rio, próximo de escolas e creches.

A Maré, onde moram cerca de 140 mil pessoas, é margeada pela Baía de Guanabara.

A matéria foi exibida na TV Globo na noite de domingo, 24 de setembro, quando a polícia planejava uma operação para prender os chefes das quadrilhas.

Não deu tempo. De acordo com a informação apurada depois pela Polícia Civil de Cláudio Castro, no dia seguinte dois grupos de líderes de duas facções diferentes fugiram em barquinhos pela Baía de Guanabara e foram se abrigar em favelas já dominadas por eles mesmos.

No relato feito aos integrantes do governo federal que participaram da negociação para a formação da GLO, os traficantes do Terceiro Comando Puro (TCP) foram para o morro do Dendê, na Ilha do Governador, enquanto os do Comando Vermelho (CV) teriam ido para o morro do Salgueiro, em São Gonçalo.

E tudo a bordo de barquinhos que saíram de deques pequenos e cruzaram a Baía sem ser detectados pelo patrulhamento de rotina – e nem pela própria polícia, evidentemente.

Assim, quando a operação policial efetivamente aconteceu, no início de outubro, o poder público retomou a posse do local onde os treinamentos ocorriam – mas os chefes das quadrilhas já estavam bem longe dali.

O episódio foi usado nos bastidores das negociações com o governo Lula por Claudio Castro (PL-RJ) para ilustrar a necessidade de reforçar o patrulhamento na Baía, nos portos e nos aeroportos.

Interlocutores ligados a Castro dizem, no entanto, que o governo estadual não pediu expressamente uma GLO, ou Garantia da Lei e da Ordem. Só queria que o patrulhamento fosse reforçado, para evitar o transporte de armas e drogas pelos portos e aeroportos do Rio de Janeiro.

Pela GLO instalada na última quarta-feira (1) o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estendeu aos militares poderes que de patrulhamento que, hoje, são da Polícia Federal e da Receita Federal.

Junto com a PF, a Marinha vai reforçar a atuação na Baía de Guanabara (RJ); - Baía de Sepetiba (RJ); Porto de Santos (SP) e Lago de Itaipu. Com PF e Receita, a Aeronáutica vai atuar nos aeroportos e nas fronteiras do Brasil com outros países, especialmente nos estados do Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

Está prevista ainda a formação de uma força-tarefa para montar operações de inteligência destinadas a desmantelar os esquemas financeiros do crime organizado em ações de tráfico, milícias e narcomilícias.

Apesar de formalmente ser uma GLO, os ministros de Lula vem tentando diferenciá-la das outras dizendo que esta é uma GLO "restrita" a portos e aeroportos, ou uma GLO "diferente".

O cuidado tem a ver com o fato de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não queria convocar os militares para atuar na segurança pública.

Temia chamar para si a responsabilidade por um assunto que, em tese, é de competência estadual – o combate ao crime organizado no Rio.

Acabou convencido a convocar a GLO, mas ainda tem procurado se distanciar da iniciativa. Na solenidade em que a GLO foi anunciada, Lula não respondeu perguntas dos jornalistas.

Nas entrevistas que tem dado sobre o assunto, Dino faz questão de dizer que a GLO vai atuar apenas em áreas que já são responsabilidade da União e não vão invadir competências dos governos


Fonte: O GLOBO