Ex-presidente brasileiro e candidato argentino idolatram Donald Trump, são populistas e se consideram 'outsiders' do sistema político
De forma geral, ambos idolatram o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Milei e Bolsonaro são populistas, utilizam as redes sociais como principal ferramenta eleitoral, movimentam a juventude e fazem duras críticas ao sistema político vigente. Pouco após Milei vencer as primárias argentinas (quando se definiram os candidatos que disputariam o pleito em 22 de outubro), Bolsonaro gravou um vídeo dizendo que tinha muito em comum com Milei.
—Temos muitas coisas em comum. Defendemos a família, a propriedade privada, o livre mercado, a liberdade de expressão, o legítimo direito à defesa e queremos, sim, ser grandes à altura do nosso território e de nossa população — afirmara o ex-presidente.
Bolsonaro não exerceu uma diplomacia presidencial durante os quatro anos em que governou o Brasil. Mantinha alianças com governos conservadores, com destaque para Polônia e Hungria, e acabou seu mandato praticamente isolado no cenário internacional.
Javier Milei também já deu várias indicações de que não tem uma agenda externa, o que tem preocupado diplomatas de seu país, segundo relatos reservados. Quer ser visto como um "outsider", ou seja, que não é ligado a grupo algum.
Mas os dois líderes têm diferenças, que ficaram ainda mais evidentes na campanha de Milei. Para o especialista em relações internacionais, Christopher Mendonça, na área econômica, principalmente, está claro que os estilos são distintos.
— Bolsonaro tem uma pauta mais conservadora e Milei uma agenda mais libertária. Por exemplo, o candidato argentino é a favor da extinção do Banco Central e do controle cambial pelo Estado. Bolsonaro, na contramão, propõe um Banco Central independente — diz Mendonça.
Os discursos de Milei e Bolsonaro têm como ponto comum o combate ao socialismo na região. Ambos fazem parte do Fórum de Madri, uma aliança internacional "para frear o avanço do comunismo na ibero-esfera".
Chama a atenção a proximidade de Milei com o filho do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro. Os dois se reuniram no fim de 2022 e, se depender de Eduardo, se o candidato argentino vencer a eleição contra Massa, a articulação para o reforço de um movimento de extrema-direita internacional, que ganhou força no início do governo Bolsonaro, pode ser ainda mais estimulada.
— Javier Milei é a versão com delay de Jair Bolsonaro , que, por sua vez, já era a versão com delay de Donald Trump. Estamos assistindo na Argentina ao filme que, no Brasil, foi exibido entre 2018 e 2022. É possível que, por características cívicas e institucionais, além de certo aprendizado com a história recente, os nossos vizinhos consigam escapar de um presidente antiinstitucional de ultradireita. Os prognósticos, contudo, não são tão encorajadores para os argentinos — afirma Dawisson Belém Lopes, professor de relações internacionais da Universidade Federal de Minas Gerais.
Para o consultor internacional Welber Barral, Bolsonaro e Milei são consequências do discurso antipolítica e da frustração coletiva com as soluções institucionais, fragilizadas pela situação econômica e empobrecimento de seus países. Também se identificam nas propostas simplistas e exóticas, cuja ineficácia é visível, mas que apelam ao sentimento popular.
— Entretanto, Milei é mais agressivo nas propostas de redução da intervenção estatal e da liberalização econômica, propostas que contrastam com a experiência recente de políticas econômicas argentinas — ressalta Barral.
Virgílio Arraes, da Universidade de Brasília, avalia que Milei combina o "messianismo político com o neoliberalismo econômico em grau avançado".
— O surpreendente é a aceitação do eleitorado — diz Arraes. —É o populismo bastante radical que encontra acolhida em uma população desanimada com a estrutura costumeira da política nacional —completa.
Agenda de costumes
Na agenda de costumes, assim como Jair Bolsonaro, o candidato argentino Javier Milei também utiliza dos temas ligados à moral para impulsionar a sua ação política. Ambos afirmam serem contra o aborto, por exemplo.
Bolsonaro tem um apoio considerável entre os evangélicos. Conforme Christopher Mendonça, essa, no entanto, não é uma característica de Milei, que, por se "vender" como um libertário, não tem em seu radar de ação orientar ou sugerir escolhas religiosas.
Milei considera que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser permitido. De acordo com o candidato, todo casamento é um contrato e, portanto, não deve encontrar restrições para além do interesse das duas partes. Não cabe ao Estado, segundo ele, mediar relacionamentos afetivos.
— Esse posicionamento se diferencia do que prega Bolsonaro, que se posicionou a favor da configuração tradicional da família sem que haja novos desenhos familiares — recorda Mendonça, doutor em política internacional.
Milei também se difere de Bolsonaro por defender a liberalização de drogas. O caráter libertário do candidato faz com que ele defenda o livre comércio, inclusive de produtos proibidos por lei. Bolsonaro tem posição contrária a qualquer tipo de flexibilização nesse sentido.
— De acordo com o candidato, não há motivos para proibir o uso de qualquer substância, desde que estas não sejam bancadas pelo Estado — observa Mendonça.
No caso das armas, Milei segue o mesmo raciocínio de Bolsonaro. Para ele, a regulamentação da compra deve ser menos rígida, possibilitando aos cidadãos a sua autodefesa armada.
Fonte: O GLOBO
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