Reforma prevê devolução de imposto para baixa renda de produtos da cesta básica, contas de luz e de gás. Mas funcionamento ainda terá que ser regulamentado
A devolução do pagamento de valor desembolsado com imposto, o chamado cashback tributário, não é exatamente uma novidade no sistema brasileiro. Apesar de não ser conhecido por esse nome, é justamente isso que acontece com os descontos dados no Imposto de Renda para os gastos com saúde e educação há décadas. No entanto, esse é um benefício para a população de média e alta renda, como chama atenção o economista Edson Domigues, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O cashback criado pela Reforma Tributária, no entanto, está focado na baixa renda. O texto prevê a devolução do imposto pago em itens da cesta básica, nas contas de gás e de luz a famílias em situação de vulnerabilidade social.
Estudo assinado por Gonçalves, em parceria Débora Freire Cardoso, também professora da UFMG e subsecretária de Política Fiscal do Ministério da Fazenda, mostra que a política de cashback vai ampliar a capacidade de consumo de cerca de 90% das famílias brasileiras.
Entenda a devolução do imposto
Como vai funcionar o cashback?
Ainda não há definição sobre questões mais práticas do cashback . Essas informações não foram incluídas na PEC e vão ser regulamentadas posteriormente por lei complementar, por resolução do Ministério da Fazenda, do Tesouro e do Banco Central.
Gonçalves aponta como uma das referências para esse tipo de benefício no Brasil o sistema do Rio Grande do Sul. O estado já tem um sistema implementado, com um cartão de devolução do ICMS:
-Há um cartão eletrônico em que uma estimativa do gasto com cesta básica e imposto pago é retornado para as famílias que estão num cadastro de baixa renda - explica.
O professor destaca que outros países da América do Sul, como o Chile e a Colômbia, também têm um sistema de devolução de imposto nesse mesmo sistema, com cartão, em que uma estimativa de gasto de imposto associado à cesta básica retorna às pessoas que estão em um cadastro de baixa renda.
A experiência com pagamentos eletrônicos e o cashback
O Brasil tem uma ampla experiência em meios eletrônicos de pagamentos a pessoas de baixa renda, cadastro de pobreza e desigualdade. O professor destaca o CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais), a experiência bem-sucedida do pagamento do Auxílio Emergencial na pandemia e do bolsa família via cartão como vantagens para a implementação do cashback.
-O Brasil tem um ponto de partida muito avançado que vai ser importante quando for implementar a devolução de tributos. Para basear a experiência do cashback, nós temos também o Pix, um fenômeno de popularidade no Brasil, muito bem implementado pelo Banco Central, que também poderia ser uma forma de devolução. Então, acho que o Brasil tem amplo conhecimento nessa questão prática de devolução ou via cartão ou em outros sistemas que podem vir ser efetivados.
Qual a vantagem do cashback diante da desoneração ampla?
Do ponto de vista econômico e social, uma devolução de imposto para baixa renda é muito melhor do que a isenção ampla. Inclusive, diz Gonçalves, é melhor que a isenção da cesta básica como foi aprovado na PEC da Reforma Tributária.
Ele explica que cesta básica que vai ser isenta de tributo ainda vai ser definida e destaca que o ideal é que seja um conjunto bem restrito de produtos:
-Ao isentar alguns produtos do imposto, você acaba beneficiando toda as pessoas, inclusive as de renda alta e média, quando o objetivo era a população de baixa, por isso esse é um mecanismo ruim de tributação. O ideal é que o conjunto de produtos isentos de impostos pela cesta básica seja o menor possível. A ideia é reforçar a política do cashback, o retorno do tributo aos mais pobres, aí sim sobre uma cesta básica ampliada.
Na avaliação do economista e ex-ministro Maílson da Nóbrega o cashback ficou muito restrito e a Reforma Tributária acabou mantendo privilégios para os mais ricos.
-Os lobbies conseguiram criar um rosário de privilégios em benefício essencialmente dos ricos, quem viaja, paga escola privada, a melhor universidade. Privilégios gerados na Reforma Tributária de 1965, de certa forma, foram preservados. O cashback ficou muito limitado.
Fonte: O GLOBO
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