Presidente tenta conciliar alianças com rivais declarados, como Arthur Lira e Renan Calheiros, e é pressionado em alguns casos pelo PT por conta de apoios

A miscelânea partidária que reúne 13 siglas na base governista tem obrigado Luiz Inácio Lula da Silva a enfrentar contratempos com disputas regionais entre aliados em pelo menos nove estados. Em algumas delas até o PT, seu partido, vem pressionando o presidente a escolher lado nas desavenças, já que na maior parte das vezes ele adota postura neutra para evitar que os embates afetem o Palácio do Planalto.

As contendas, que tendem a se acirrar com as articulações para a eleição municipal de 2024, envolvem a rixa entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o senador Renan Calheiros (MDB-AL); mantêm distantes o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), e a bancada petista de Minas Gerais; e geram mal-estar entre o líder do governo Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) e o seu colega Davi Alcolumbre (União-AP), entre outros.

O problema mais recente se deu em torno das discussões sobre a criação da CPI da Brakem, que colocaram em lados opostos Renan Calheiros e Arthur Lira, hoje aliados de Lula, mas de grupos políticos rivais em Alagoas. 

O emedebista foi o responsável por propor a investigação parlamentar e tem cobrado respaldo do Planalto para tirá-la do papel. Já o deputado trabalha para inviabilizar a instalação do colegiado, que deve ter entre os alvos o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), de quem Lira é próximo.

O governo até tentou selar um armistício, mas não houve um acordo. Apesar de senadores governistas trabalharem para barrar a comissão, sob argumento de que a CPI pode amplificar a crise, Renan conseguiu convencer líderes a indicarem os integrantes do colegiado, que poderá começar a funcionar nesta semana.

Em meio à queda de braço no Congresso, o governo organizou um evento para anunciar investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em Maceió, no fim de outubro, e convidou os dois aliados. Lira foi, Renan, não, para evitar a foto ao lado do rival.

Também há focos de incêndio político em Sergipe. Em maio, o senador Rogério Carvalho ficou de fora de um evento que contou com a participação do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo. Carvalho e Macêdo, ambos do PT, disputam espaço e tentam influenciar a escolha do candidato na capital, Aracaju, para disputar a eleição municipal do ano que vem. O ministro articula para lançar Eliane Aquino (PT), algo que é rejeitado pelo senador.

O boa relação de Lula com Rodrigo Pacheco, possível candidato ao governo de Minas em 2026, irrita uma ala do PT. Nos bastidores, integrantes do partido afirmam que o presidente dá protagonismo excessivo a Pacheco (PSD-MG), preterindo lideranças da sua própria legenda em Minas Gerais. 

No mês passado, por exemplo, Lula recebeu Pacheco, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Tadeu Martins Leite (MDB), para discutir a dívida do estado. Nenhum representante do PT esteve no encontro.

Depois da reunião, Pacheco apresentou um plano para ajudar a combater a crise fiscal e sugeriu federalizar empresas estatais de Minas. O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) discorda da iniciativa e apresentou um plano alternativo que consiste em um recálculo do pagamento da dívida previsto no Regime de Recuperação Fiscal.

O cenário também pode ser desfavorável para o deputado Rogério Correia (PT), que avalia concorrer à prefeitura de Belo Horizonte e deve enfrentar o PSD, partido do atual prefeito Fuad Noman e de Pacheco.

— Esse movimento (de afinamento entre Lula e Pacheco) é bom porque isola o governador Romeu Zema. O que vai acontecer depois, se Rodrigo vai ser candidato a governador ou não, é parte do futuro — minimiza Rogério Correia.

Outra reunião no Planalto que excluiu um aliado envolveu o governador do Amapá, Clécio Luis, que esteve em Brasília no último dia 23 para tratar do reajuste na conta de energia do estado. O senador Davi Alcolumbre (União-AP) participou da conversa, que ocorreu na ausência do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues, excluído da agenda com o presidente.

Os dois disputam protagonismo local, numa corrida que se acirra com a proximidade das eleições municipais. Randolfe tem se aproximado do atual prefeito de Macapá, Doutor Furlan (Podemos), que é adversário de Alcolumbre.

Também há discordâncias no Ceará entre o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT), o senador Cid Gomes (PDT) e o deputado Eunício Oliveira (MDB). A disputa envolve o interesse dos três em concorrer ao Senado em 2026 e em influenciar nas eleições de 2024.

O governo também se mantém alerta ao cenário maranhense, espaço de atuação dos ministros da Justiça, Flávio Dino, e o das Comunicações, Juscelino Filho. O PSB, de Dino, e o União de Brasil, de Juscelino, devem se enfrentar na disputa pela prefeitura de São Luís. 

Além disso, Juscelino é o personagem principal de um inquérito em que a Polícia Federal, órgão vinculado à pasta de Dino, investiga suspeitas de desvios de emendas parlamentares. O ministro da Justiça, contudo, alega não ter interferência no trabalho dos policiais.

Embora com menos intensidade, a eleição de 2026 também tem potencial de desgastar aliados de Lula em Pernambuco. O senador Humberto Costa (PT-PE) é apontado como possível candidato a governador. 

Já o ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, do Republicanos, articula candidatura ao Senado numa chapa em que o PSB indicaria o nome ao governo. O ministro da Pesca, André de Paula, do PSD, por sua vez, apoia a atual governadora Raquel Lyra (PSDB), e deve fazer campanha pela reeleição dela.

— Sei que estamos alinhados à governadora e nessa condição nós estaremos no palanque dela para candidata à reeleição em Pernambuco. Como vai estar Silvio, como vai estar o PT, tudo isso a gente só vai saber lá na frente – afirmou André de Paula.

Outro exemplo é um desgaste entre os senadores Irajá Abreu (PSD-TO) e Professora Dorinha (União-TO). Dorinha venceu Katia Abreu (PP-TO), mãe de Irajá, na eleição ao Senado em 2022. Ela também conseguiu indicar um nome à superintendência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Paranaíba (Codevasf) no Tocantins, cargo que era almejado pelo senador. Irajá tem demonstrado incômodo com o governo e criticou a Reforma Tributária.

Por outro lado, uma das rivalidades que o governo conseguiu esfriar foi a que envolve o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), e o ministro da Casa Civil, Rui Costa. Os dois são de grupos antagônicos na Bahia. Elmar, contudo, intensificou movimentos para buscar o apoio do Planalto com o objetivo de se viabilizar como candidato a presidente da Câmara.


Fonte: O GLOBO