Definição de limite para a reserva dos recursos foi incluída no parecer do relator do projeto de diretrizes orçamentárias para 2024

Em uma ofensiva para aumentar o controle sobre o Orçamento, o Congresso apresentou ontem três medidas para esvaziar o poder do Palácio do Planalto na hora de definir o destino do dinheiro público em 2024. Uma delas amplia as modalidades de emendas que o governo será obrigado a pagar, incluindo as de comissão, previstas em R$ 11 bilhões. 

Há ainda a criação de um calendário para a liberação desses recursos, que deverão ser reservados no primeiro semestre do ano. Em outra frente, deputados e senadores querem retirar R$ 9,3 bilhões dos R$ 61,3 bilhões previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma das prioridades do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e enviar o montante para seus redutos eleitorais no ano que vem. Todas as propostas precisam ser aprovadas pelo Parlamento para entrarem em vigor.

O prazo para a liberação das verbas foi incluído no parecer apresentado ontem pelo relator do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, deputado Danilo Forte (União-CE). O texto prevê que todas as emendas parlamentares devem ser empenhadas até o fim de junho. O empenho é a primeira fase da execução orçamentária, quando o dinheiro é reservado para ser gasto futuramente. Ou seja, o Executivo precisará assumir até o meio do ano o compromisso de pagamento para obras ou serviços determinados pelos deputados e senadores.

O objetivo de Forte, ao criar a data-limite para o empenho, é enfraquecer uma das principais armas de negociação usadas pelos articuladores políticos do Planalto. O ritmo de execução desses recursos costuma servir como moeda de troca do governo para obter apoio de parlamentares — é comum a liberação ser acelerada na véspera de votações de interesse do Executivo. O calendário contempla emendas que hoje o governo não é obrigado a desembolsar, a exemplo das verbas de comissão.

No caso desta modalidade, o valor é de R$ 6,8 bilhões em 2023 e chegará a R$ 11 bilhões caso o texto seja aprovado como está. Hoje, por não serem obrigatórias, o governo não precisa desembolsar sequer um real das emendas de comissão. Além de criar o calendário de empenho, Forte incluiu no relatório outra medida que diminuiria o raio de ação do Executivo. 

Por ela, o contingenciamento dessas emendas precisa seguir as mesmas regras das travas às despesas não obrigatórias da União, mecanismo que segue normas relacionadas à arrecadação ou aumento não previsto de despesas da administração federal. Isso significa que o Executivo só poderá bloquear o pagamento de emendas de comissão a partir de critérios técnicos pré-estabelecidos.

Em nota, a Secretaria de Relações Institucionais afirmou que o governo federal buscará acordo junto ao Congresso Nacional para manter na proposta da LOA todos os pontos considerados essenciais.

"Nesse contexto, o Novo PAC é tratado como absoluta prioridade, e os parlamentares poderão destinar recursos de emendas diretamente para as obras previstas no Programa. O orçamento deste primeiro ano do governo Lula 3 representa, antes de tudo, a retomada do diálogo e da consolidação do ambiente econômico no país, com o novo marco fiscal, que combina a responsabilidade socioambiental com a fiscal", afirmou a Secretaria.

Reação governista

Forte, contudo, cedeu em um ponto aos apelos do governo e atrelou a efetiva liberação desses recursos à arrecadação. Com isso, embora as emendas tenham que ser empenhadas no primeiro semestre, o pagamento poderá ser postergado caso haja frustração de receita. A exceção são as emendas relacionadas à área de saúde, que devem ser pagas obrigatoriamente até o meio do ano.

— No primeiro momento será feito o pagamento das emendas de saúde. Em um segundo momento, as prioridades dos parlamentares, dentro de um cronograma ao longo do ano. Isso dá previsibilidade, acomoda e diminui a pressão política — afirmou Forte.

A criação do calendário para a liberação das emendas incomodou o Palácio do Planalto e foi criticada por governistas, mas agradou a líderes de siglas do Centrão.

— Acho muito importante (ter um calendário), pois é ano eleitoral e só poderiam ser pagas (as emendas) após o segundo turno, caso não sejam pagas até o primeiro semestre — diz o líder do PP, Dr. Luizinho.

A votação do projeto da LDO na Comissão Mista de Orçamento (CMO) está prevista para a próxima terça-feira. O deputado Carlos Zaratini (PT-SP), que integra o colegiado, afirmou se opor à definição de prazos para as emendas.

— Seria ruim (empenhar tudo até o meio do ano) porque não dá para prever o que vai acontecer com o orçamento no restante do ano — disse o petista.

Em outra frente, no caminho inverso do que o governo desejava, deputados e senadores propuseram retirar parte do que foi reservado pelo governo no Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC), carro-chefe da gestão de Lula na área de infraestrutura. No mês passado, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, havia feito um apelo para que parlamentares enviassem recursos de suas emendas para turbinar o orçamento do programa.

Segundo um levantamento feito pelo GLOBO, contudo, os congressistas apresentaram emendas propondo remanejamento orçamentário que diminuiriam em cerca de 15% os recursos do governo para o programa e permitiriam que deputados e senadores indicassem novos destinos por meio de emendas de comissão. Assim, poderiam ter mais controle de onde o dinheiro público será aplicado.

Um dos remanejamentos, por exemplo, retirou R$ 1,9 bilhão de obras do PAC para destinar a ações tocadas pelo Ministério das Cidades, como a pavimentação de vias em municípios pequenos que são redutos eleitorais dos parlamentares.

Entre as obras que seriam beneficiadas estão a construção de trecho rodoviário da a BR-330, na Bahia, com investimento de R$ 3 milhões, e a adequação de uma rodovia entre Campo Grande e Terenos, no Mato Grosso do Sul, com R$ 205 milhões remanejados de valores do novo PAC.

Como os valores foram direcionados por meio de emenda de comissão, não é possível identificar qual parlamentar específico destinou os recursos. Essa modalidade tem funcionado com uma dinâmica similar à do antigo orçamento secreto: com determinado valor à disposição, os presidentes de cada colegiado encaminham um ofício à Secretaria de Relações Institucionais com a lista de beneficiários indicadas por deputados e senadores. Neste ano, dos R$ 6,8 bilhões à disposição para esse tipo de emenda, R$ 4,9 bilhões já foram empenhados.

Fundão turbinado

O relatório de Danilo Forte também passa pelo Fundo Eleitoral, de onde sai o dinheiro que banca as campanhas no país. Ele decidiu colocar um teto de R$ 4,9 bilhões para o montante a ser destinado durante a disputas municipais de 2024. A definição sobre o valor exato e a origem dos recursos, no entanto, serão tomadas mais à frente, na votação da Lei Orçamentária Anual (LOA). O montante supera em mais de cinco vezes o valor previsto pelo governo ao enviar o projeto: R$ 900 milhões.

Danilo Forte chegou a defender que o abastecimento do fundo fosse feito metade com investimentos do PAC e a parte com as emendas de bancada estadual, mas desistiu diante do impasse entre os colegas da Câmara.

Veja mudanças em jogo para o Orçamento de 2024

Calendário para emendas


Como é hoje

Apesar de serem impositivas, o governo não tem prazo para assumir o compromisso de pagamento para os programas ou as obras determinadas pelos deputados e senadores.

Como fica

O relatório do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024, do deputado Danilo Forte (União-CE), prevê que as emendas parlamentares impositivas, ou seja, de pagamento obrigatório pelo governo, deverão ser empenhadas (reservadas para gasto) no primeiro semestre. O empenho é a primeira etapa para a liberação de dinheiro. Assim, com a medida, o Congresso avança um pouco mais no controle do Orçamento da União.

Emendas impositivas no próximo ano
  • Emendas individuais R$ 25 bilhões
  • Emendas de bancadas estaduais R$ 12 bilhões
Esvaziamento do PAC

O que propuseram os parlamentares

Deputados e senadores querem retirar R$ 9,3 bilhões dos R$ 61,3 bilhões previstos para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), carro-chefe da gestão Lula na área de infraestrutura.

Entre as ações que receberão o dinheiro estão:

Adequação de trecho da BR-262 entre Campo Grande e Terenos, em Mato Grosso do SulConstrução de trecho da BR-354 entre Patos de Minas e Lagoa Formosa, em Minas Gerais Adequação da BR-365 entre Patos de Minas e Patrocínio, em Minas Gerais

O que propôs o governo

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, havia feito um apelo para que parlamentares enviassem recursos de suas emendas para turbinar o programa.

Próximos passos

Votação

A votação da LDO na Comissão Mista de Orçamento está prevista para a próxima terça-feira. A proposta ainda precisa ser aprovada em plenário.

Sanção presidencial

Caso seja aprovada pelo Congresso, a LDO é encaminhada para apreciação do presidente da República, que pode sancioná-la ou vetá-la. Eventual veto é submetido ao Legislativo, que tem prerrogativa de derrubá-lo.


Fonte: O GLOBO