Ministra já disse que estrada "não é viável economicamente e ambientalmente" e PT orientou contra, mas governo apoiou iniciativa na Câmara

A Câmara aprovou nesta terça-feira, por 311 votos favoráveis e 103 contrários, um projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental e abre caminho para liberar o uso da estrutura de uma rodovia que liga os estados do Amazonas e de Rondônia. Com cerca de 900 quilômetros de extensão, a estrada liga Manaus (AM) e Porto Velho (RO) e foi construída no início dos anos 1970, durante a ditadura militar. A via foi abandonada na década seguinte. A iniciativa agora será enviada ao Senado.

Hoje a estrada possui trechos praticamente impossíveis de transitar. O governo do Amazonas e parlamentares do estado desejam asfaltar o meio da rodovia para viabilizar o uso dela. A votação representa uma derrota para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Em novembro, ela disse que a rodovia BR-319-RO/AM "não é viável economicamente e ambientalmente".

Pelo PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o deputado Nilton Tatto (SP) recomendou voto contra o texto. Apesar disso, a liderança do governo na Câmara, representada pelo vice-líder Emanuel Pinheiro Neto (MDB-MT), orientou favorável ao projeto.

O projeto não passou por votação nas comissões e tramitou com regime de urgência, sendo analisado diretamente em plenário. O autor do texto é o deputado Maurício Carvalho (União-RO) e ele foi relatado por Capitão Alberto Neto (PL-AM).

No dia 28 de novembro, durante a sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs, do Senado, Marina respondeu a uma queixa de senadores de que a obra não foi viabilizada por atuação dela.

– Eu não vou permitir dizer que a estrada não foi feita porque fui eu que não dei a licença (ambiental). A estrada não foi feita porque é uma estrada difícil de provar a viabilidade econômica, a viabilidade social – declarou.

– Não tenho dúvida de que as pessoas querem ter o direito de ir e vir, mas a viabilidade econômica e ambiental, a não ser que seja para converter as áreas de mais de 400 quilômetros de floresta virgem em outro tipo de atividade, não tem viabilidade – completou.

Na sessão da CPI, a ministra do Meio Ambiente ainda disse ser contra fazer uma estrada "no meio da floresta".

– Socialmente, até a gente entende. Agora, ambientalmente e economicamente, não se faz uma estrada de 400 quilômetros, no meio de floresta virgem, apenas para passear de carro, se não estiver associada a um projeto produtivo.

Na sessão de hoje da Câmara, o deputado Capitão Alberto Neto criticou a fala de Marina.

– A ministra Marina Silva falou que as pessoas querem a estrada para passear. Ela humilha o povo do Norte. Nós não queremos uma estrada para passear, queremos ter o direito de ir e vir.

Já o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) anunciou que seu partido deve questionar a medida no Supremo Tribunal Federal (STF).

– Se atingir impacto ambiental e for inconstitucional o que está aqui, o PSOL entrará com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.

O texto também recebeu críticas de organizações ligadas à preservação do meio ambiente. O Instituto Socioambiental e o Observatório do Clima divulgaram uma nota em que reclamaram que " estradas na Amazônia implantadas sem licenciamento ambiental cuidadoso se tornam indutoras do desmatamento ilegal, da grilagem de terras e de outras atividades não permitidas pela legislação , com significativo impacto climático".

Por outro lado, o governo federal é favorável ao debate sobre a iniciativa. No mês passado, o ministro dos Transportes, Renan Filho, publicou uma portaria que cria um grupo de trabalho sobre o tema.

O ministro determinou que a equipe deve se reunir a cada 20 dias e ser composta por integrantes de secretarias executivas do Ministério dos Transportes, do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e da Infra S.A. O prazo de funcionamento do grupo de trabalho é de noventa dias, podendo ser prorrogado por igual período.

Na justificativa do projeto aprovado hoje, o deputado Maurício Carvalho disse que a rodovia é "é fundamental para garantir o acesso contínuo e seguro a serviços essenciais, como saúde, educação, abastecimento de alimentos e transporte de mercadorias e sua repavimentação abrirá oportunidades para o desenvolvimento econômico da região".

"A BR-319 é uma importante via de integração regional, de interesse e segurança nacional, que conecta o estado do Amazonas e Rondônia. Com sua trafegabilidade comprometida e com o rio Madeira registrando historicamente seu menor nível, a população enfrenta dificuldades para receber assistência médica, suprimentos básicos e mercadorias", disse ainda o deputado.


Fonte: O GLOBO