Planalto avalia que há placar desfavorável e entende que análise do tema deva ocorrer já com presença de Flávio Dino

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva trabalha para que haja um pedido de vista no julgamento desta quarta-feira no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a nomeação de políticos para o comando de estatais, possibilidade defendida pelo Palácio do Planalto.

Caso haja o pedido de vista, a apreciação do tema seria interrompida, e o Planalto ganharia tempo para defender a tese até que a Corte tome uma decisão definitiva sobre o assunto, já com a composição completa do tribunal.

Auxiliares do Palácio do Planalto e integrantes do STF acreditam que, hoje, o cenário no julgamento da matéria é desfavorável ao governo, com maioria de votos a favor da derrubada da medida concedida pelo ministro aposentado Ricardo Lewandowski, que suspendeu trechos da Lei das Estatais que tratam do assunto.

Desde setembro, quando houve a aposentadoria da ministra Rosa Weber, o Supremo conta com apenas dez ministros. Por isso, a avaliação de integrantes do núcleo jurídico do governo Lula é que o ideal seria que o martelo sobre a previsão contida na Lei das Estatais fosse batido com o quórum completo, já com o novo integrante da Corte.

Indicado pelo presidente no último dia 27, o ministro da Justiça, Flávio Dino, ainda precisa ser sabatinado e aprovado pelo Senado. Há expectativa no governo de que, se aprovado, Dino vote a favor da tese do Planalto.

Liminar de março

A Lei das Estatais, aprovada em 2016, proíbe que uma pessoa que atuou, nos últimos três anos, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização de campanha eleitoral seja nomeada para o conselho diretor ou diretoria de estatais.

Em março, Lewandowski, hoje aposentado, considerou esse trecho inconstitucional e proibiu apenas a manutenção do vínculo partidário a partir do momento em que a pessoa assume o cargo de diretor ou conselheiro. Além disso, o ministro também suspendeu outro trecho, que impede que ministro de Estado e parlamentares sejam indicados para a diretoria e conselho das estatais.

No STF, também há a avaliação de que o julgamento desta quarta-feira será paralisado por um pedido de vista. Pelas regras internas da Corte, os ministros que pedem vista têm até 90 dias para devolver o caso para julgamento, que posteriormente precisa ser pautado pelo presidente.

Além do tempo regimental, o governo também conta com a suspensão dos trabalhos no Supremo em razão do recesso do Judiciário, que começa no próximo dia 20 e vai até fevereiro de 2024.

'Ponto a ponto'

Nos últimos dias, integrantes do time jurídico do governo intensificaram o seu trabalho na Corte para mostrar os argumentos a favor da manutenção da decisão dada por Lewandowski. Um memorial elaborado pela Advocacia-Geral da União (AGU) com uma espécie de "ponto a ponto" foi entregue pessoalmente pelo ministro-chefe do órgão, Jorge Messias, à maioria dos ministros do Supremo.

Messias já conversou com mais da metade dos ministros do STF sobre o assunto e tem chamado atenção para a tese do governo. O Planalto defende que a lei foi aprovada em um contexto adverso, pós Lava-Jato, em um momento do que considera "criminalização da política" pós-escândalos de corrupção e que a lei parte de pressupostos que, no entendimento do governo, são equivocados, não têm base constitucional e contém excessos.

Entre os ministros com os quais Messias já conversou sobre o tema estão Gilmar Mendes, André Mendonça, Nunes Marques e Cristiano Zanin — que herdou a relatoria do processo por ser o sucessor de Lewandowski no Supremo, mas não votará uma vez que o ministro aposentado já apresentou o seu posicionamento.

Auxiliares do STF avaliam que caso a liminar seja derrubada, há riscos de que indicações realizadas enquanto a medida estava em vigor podem ser consideradas ilegais.

Petrobras

Com isso, um dos atingidos poderia ser o atual presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, que até o ano passado exercia um mandato de senador pelo Rio Grande do Norte. O entendimento na Corte é que somente se houver uma modulação dos efeitos, ou seja, uma adequação sobre a extensão da decisão, essas nomeações poderão ser mantidas.

No memorial que foi entregue na véspera do julgamento aos ministros, o advogado-geral da União aponta que a quarentena para os políticos prevista na lei das estatais "estabelece discriminações desarrazoadas e desproporcionais — por isso mesmo inconstitucionais — contra aqueles que atuam, legitimamente, na esfera governamental ou partidária".

“Seria razoável pressupor que profissionais da iniciativa privada detém uma maior qualificação gerencial? As indagações revelam a ausência de razoabilidade”, diz ainda a AGU.

A Lei das Estatais foi criada em 2016 durante o governo Michel Temer (MDB) e restringe indicações de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos públicos ou tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura decisória de partido político ou na organização e na realização de campanha eleitoral.

Na decisão de março, Lewandowski flexibilizou uma série de restrições previstas na norma, como critérios mais duros para a indicação às diretorias e aos conselhos de administração de companhias públicas controladas pela União.

A liminar de Lewandowski foi levada ao plenário para confirmação dos demais ministros, mas o julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Antes da medida urgente, o Supremo começou a julgar o mérito da ação, mas o caso foi suspenso por pedido de vista do ministro André Mendonça.

Em uma espécie de "manobra" para driblar o pedido de mais tempo para analisar a ação, dias depois Lewandowski acolheu a liminar para suspender o trecho da lei.

É com o voto de Mendonça que o julgamento será iniciado nesta quarta-feira. A previsão é de que o ministro dê um voto no sentido contrário ao de Lewandowski, mantendo a quarentena de três anos para dirigentes partidários e pessoas que tenham trabalhado no comando de campanhas eleitorais assumirem cargos de direção em empresas estatais.


Fonte: O GLOBO