Corporação tenta reagir às críticas de que se omite na atuação na região e de que tem se negado a disponibilizar aeronaves para entregas de cestas básicas e transporte de ajuda humanitária
O Exército tenta reagir às críticas de que se omite na atuação na região e de que tem se negado a disponibilizar aeronaves para entregas de cestas básicas e transporte de ajuda humanitária, feitas dentro e fora do governo. O comandante do Exército, Tomás Paiva, chegou nesta terça-feira para visitar o território, e vai mais uma vez ao território ianomâmi até o fim de fevereiro.
O PSOL, partido da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, aprovou na segunda-feira uma resolução que responsabiliza o Ministério da Defesa por negligência com os ianomâmis. A deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) mandou um ofício ao ministro José Múcio detalhando as cobranças da legenda. E o chefe da Casa Civil, Rui Costa, coordenador da operação interministerial para atender a região, havia pedido a Múcio uma solução definitiva para a presença das Forças Armadas no local.
A mesma resolução do PSOL que critica o Ministério da Defesa elogia a atuação de Guajajara, lembrando a demarcação de oito territórios em seu primeiro ano de gestão na pasta dos Povos Indígenas. A ministra teve alta nesta terça no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina, onde havia sido internada na sexta-feira por picos de pressão alta. Guajajara deve seguir em repouso nos próximos dias.
— Não podemos culpar um ministério que tem um ano de existência, quando sabemos que o garimpo só vai ser combatido verdadeiramente com a atuação efetiva do Exército e da Força Nacional. Ainda acompanhamos a situação com muita preocupação — disse Xakriabá.
Justiça pede plano
No ofício que mandou a Múcio, a deputada reclamou da ineficácia do controle do espaço aéreo, da falta de correção de pistas de pouso — que impede a logística de distribuição de alimentos e a mobilidade de equipes dentro do território ianomâmi — e do fechamento do posto de suprimento de combustíveis da aldeia indígena Palimiú.
A resolução do partido foi feita no mesmo dia em que Justiça Federal de Roraima determinou que o governo apresente em 30 dias um novo plano de ações contra o garimpo ilegal no território, sob pena de multa de R$ 1 milhão em caso de não cumprimento. Atendendo a um pedido do Ministério Público Federal, a decisão cita a “inércia do Estado brasileiro em elaborar um planejamento efetivo para a instalação de bases de proteção e retirada dos invasores”.
Também na segunda-feira, a FAB interceptou um avião suspeito de tráfego aéreo ilegal em uma áreas próxima da região da Terra Indígena Yanomami. Segundo a FAB, depois de serem descumpridas ordens de mudança de rota, “foi necessário que a defesa aérea realizasse o tiro de aviso”, disparado por um caça Super Tucano, o que levou o Cessna a um pouso forçado em uma pista de terra. O piloto conseguiu fugir. Mas agentes da PF apreenderam o monomotor.
Culpa rechaçada
Integrantes do comando do Exército rechaçam que a instituição seja a única culpada pelos problemas da região e argumentam que a força-tarefa abrange diferentes ministérios do governo, além de a atuação no local ser historicamente complexa. Eles admitem, no entanto, recrudescimento do garimpo ilegal, que havia feito um movimento de queda, mas voltou a crescer nas últimas semanas. Agora, trabalham internamente para afastar da Força a responsabilidade única pela volta de casos de garimpo ilegal na região reforçando a necessidade de mais investimentos. A expectativa é que o pedido formulado pelo Exército seja bem recebido pelo Palácio do Planalto.
A região já possui dois pelotões especiais de fronteira, nas áreas de Surucucu e Auaris, cada um com 60 homens. O plano do Exército é construir mais dois destacamentos — unidades que têm metade do contingente de um pelotão — nas calhas dos Rios Uiaiacás e Mucajaí. Cada um desses destacamentos demandaria a construção de uma pista de pouso própria.
O Exército reconhece que a pista de Surucucu não está própria para pouso de aviões, apenas de helicópteros, que têm limitação para transporte de passageiros e mantimentos. Um dos planos em avaliação é manter um helicóptero à disposição do território baseado em Boa Vista e que pudesse ser acionado em caso de emergência.
Os militares também vêm sendo criticados por oferecerem limitado apoio aéreo para entrega de cestas básicas. O Exército, por sua vez, aponta necessidade rigorosa de cumprir escala de manutenção das aeronaves e alto custo — de R$ 12 mil — por hora de voo na região. A Força dispõe de 18 aeronaves para toda a Amazônia, das quais apenas um terço está em operação, devido à grande manutenção dos veículos.
Das 95 aeronaves dos Exército brasileiro, 12 entrarão em desuso em 2025, quando o governo vai fazer a reposição, em mesmo número, usando o modelo Black Hawk, usado pelo Exército americano. A proposta de compra já foi discutida com o presidente Lula.
Desde janeiro de 2023, as Forças Armadas integram a força-tarefa do governo no território para combater o garimpo ilegal e reforçar a assistência humanitária. No período, foram destruídos 340 acampamentos de garimpeiros e reduzidas 85% das áreas de mineração ilegal, segundo o Ibama.
De acordo com o Ministério dos Povos Indígenas, foram distribuídas mais de 50 mil cestas básicas e 307 crianças diagnosticadas com desnutrição grave ou moderada foram recuperadas. Questionado pelo GLOBO sobre atuação das Forças Armadas na região, a pasta afirmou, por meio de nota, que embora a crise não tenha sido totalmente solucionada, há “esforços emergenciais significativos em diversas frentes de atuação” e que vem “trabalhando de forma articulada” com outros ministérios para atuar no território.
Em nota divulgada neste mês, o Exército ressaltou que atua no território há mais de 30 anos, transportou mais de 700 toneladas de alimentos e materiais desde o ano passado, realiza atendimentos médicos e tem atuado no combate ao garimpo ilegal e no apoio aos ianomâmis. O Ministério da Defesa não retornou aos questionamentos. Na segunda semana de janeiro, diante de novos problemas com invasores do território, o governo anunciou uma nova fase da atuação da força-tarefa na região, com orçamento de R$ 1,2 bilhão.
(colaboraram Julia Cople, Luciano Ferreira, Luis Felipe Azevedo, Luisa Marzullo e Paulo Assad)
Fonte: O GLOBO
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