Executivo aplica na carreira o que aprende no esporte: resultado vem com esforço, ganhar e perder são do jogo. E afirma que quem é feliz no que faz aproveita melhor seu potencial
Formado em Engenharia Química e há quase 28 anos na companhia — 18 deles no exterior —, o executivo é o entrevistado desta semana na série Palavra de CEO, que integra o projeto Tem Que Ler, de conteúdo exclusivo do GLOBO. E revela como líderes de companhias de portes, perfis e vocação diversas enxergam o profissional do futuro.
Aos 49 anos, Costa frisa que quem é feliz no que faz aproveita melhor o seu potencial. E que construir relacionamentos interpessoais é chave para crescimento profissional. Ele diz usar no trabalho duas motivações pessoais: o gosto pela leitura, herdado da mãe, que é professora, para seguir aprendendo, e a paixão pelo esporte, pelo ensinamento de que resultado vem com esforço e que ganhar e perder são parte do jogo.
São aprendizados que ele compartilha neste primeiro vídeo, em que responde a perguntas rápidas como “Remoto, presencial ou híbrido?”, destacando o quanto cresceu — e melhorou como profissional — ao enfrentar desafios para coordenar a construção de uma fábrica de lubrificantes da multinacional na Rússia.
Cristiano Pinto da Costa, da Shell: 'A gente treina para gerenciar crise'
— Foto: oglobo
CONTRATAÇÃO IRRESISTÍVEL: “Gosto de um grau de desconforto no funcionário, aquele que está constantemente desafiando o 'status quo'”
Os valores pessoais têm que estar 100% alinhados com os da companhia. Ter aquele desejo de aprendizado contínuo, curiosidade de estar sempre perguntando e buscando novas respostas para problemas existentes. Ter a capacidade de trabalhar em equipe, especialmente em companhias grandes e complexas. E quebrar os silos dentro da companhia, integrar as diferentes áreas, disciplinas é uma característica importante.
Cristiano Pinto da Costa, da Shell, fala sobre a contratação irresistível
Eu gosto de um grau de desconforto, de insatisfação no funcionário, aquele que está constantemente desafiando o status quo, tentando levar o patamar cada vez um pouco mais para cima. Acho importante o funcionário que entende o todo, que a função da companhia não é só gerar resultado financeiro ou retorno para os acionistas, mas entender o ambiente em que opera, trabalhar no desenvolvimento de talentos e no futuro dos recursos da organização, que entende o impacto e o contexto da sociedade onde você está inserido.
O último ponto, ainda mais no mundo de hoje: tecnologia, o digital. Ter uma certa curiosidade e familiaridade com isso seria também uma característica irresistível numa contratação.
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CRESCIMENTO PROFISSIONAL: “Relacionamentos interpessoais são uma chave para crescimento profissional”
Depende do contexto, da indústria, do país. Mas a vontade de aprender e de crescer, para quem está começando a carreira, é muito boa. Tem uma frase de um técnico de esporte de alta performance que eu gosto muito que é: “a vontade de se preparar tem que ser maior que a vontade de ganhar”. Essa sensação é muito importante para quem está começando.
E estar antenado não só naquilo, na área onde trabalha, mas tentar entender diferentes áreas da companhia, a companhia como um todo. E a parte humana. Cada vez mais eu acredito que os relacionamentos interpessoais são uma chave para crescimento profissional. Investir tempo em criar pontes, relacionamentos, tanto internos, quanto externos, é uma dica que eu dou bastante para a turma que está chegando na companhia.
Perseverança, resiliência, curiosidade são outras características também que tento estimular para o crescimento profissional. E a última talvez seja esse olhar de fora para dentro, procurar entender o seu cliente, o seu fornecedor, um parceiro com quem você esteja trabalhando, estar constantemente saindo do ambiente da companhia, entendendo o ambiente externo e trazendo ideias e soluções para dentro.
3-CristianoCosta — Foto: oglobo
TIME DE SUCESSO: “Delegar dando condições para a pessoa entregar o resultado que espera dela”
Não tenha medo de contratar gente boa, com características e capacidades melhores ou iguais às suas. É um bom começo. Delegar e deixar muito claro quais são as responsabilidades de cada um, cada área de atuação. Delegar é diferente de entregar. É delegar dando condições, recursos para que aquela pessoa do seu time possa entregar o resultado que espera dela.
E ter diversidade. Trazer para uma equipe pessoas com backgrounds diferentes, experiências diferentes é criar um time multidisciplinar e com caraterísticas complementares, o time como um todo fica mais forte.
Depois, trabalhar a cultura daquele time, aquela característica de ter a liberdade de falar o que está pensando, um poder desafiar de forma correta, o outro tentar tirar o melhor input de uma outra pessoa, ter a coragem de dar o feedback no momento, trabalhar o reconhecimento. Importante trabalhar com esses dois lados do feedback, quando tem uma área para melhoria, mas também o reconhecimento de um trabalho bem feito, um comportamento, uma atitude que representa os valores da companhia.
Vale investir tempo na criação da cultura do time, para que todos entendam que a soma das partes vai ser o melhor como um todo. Sou muito adepto de levar o time para fora do escritório, passar dois ou três dias aprofundando os relacionamentos, entendendo as características de cada um e como tirar o melhor individualmente, coletivamente. Buscar sempre as vozes mais quietas, mais tímidas, mas também as mais contraditórias ou dissidentes para ter as opiniões mais diversas possíveis antes de tomar uma decisão.
Nem todo mundo precisa estar envolvido em tudo. Estamos testando usar o poder de pequenos grupos dentro de um time maior. Delegar a eles uma tarefa, um desafio e deixar que eles criem soluções. E aí testar com um grupo um pouco maior e, depois, implementar.
6-CristianoCosta — Foto: oglobo
COMO LIDAR COM CRISES: "Ao endereçar pensando crise como oportunidade, você direciona o time num caminho já diferente"
Toda crise deve ser vista como uma oportunidade. Ao endereçar a crise pensando dessa forma, você direciona o seu time num caminho já um pouco diferente. Uma das coisas que procuro fazer no momento mais difícil é ver que oportunidade pode ser tirada dali, que aprendizado para melhorar aquele processo, produto, a causa oriunda daquela crise na companhia.
A segunda ferramenta é preparação. A gente se prepara e treina para gerenciamento de crise. Tem exercícios periódicos uma ou duas vezes por ano, tem papéis definidos dentro do comitê de crise, protocolos de atuação. E a gente pratica. O fato de você ter treinado, praticado, ter um pouco de estrutura e protocolo não dá garantia nenhuma de que você vai sair daquela crise com ela resolvida ou rápido ou com uma solução muito boa. Mas, sem dúvida nenhuma, aumenta a probabilidade de você conseguir atingir esse objetivo. Quem comunica, quem executa, ter esses papéis claramente definidos no momento de crise é muito importante.
Cristiano Pinto da Costa, da Shell, fala sobre crise e escassez
Por último, e talvez seja mais fácil falar do que fazer, tentar manter um grau de calma, tranquilidade, resiliência, perseverança e entender que a crise vai passar. Volto no desafio que eu encontrei na construção da fábrica na Rússia, dez anos atrás. Toda vez que eu me vejo numa situação de dificuldade, de escassez ou de crise, volto a minha cabeça para aquilo. Eu vi que passou e eu saí mais forte, a gente conseguiu entregar o resultado. Aprendi bastante, eu virei uma pessoa, um executivo melhor.
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COMPETITIVIDADE: "Quanto mais gente boa tiver, mais a barra sobe, o país ganha, a indústria ganha e a companhia também"
Quanto mais competidores numa determinada indústria, num ecossistema, num país melhor. Porque, quanto mais gente boa tiver, mais a barra sobe, o país ganha, a indústria ganha e a companhia também. Outra coisa é uma ferramenta que a gente usa bastante que é o benchmark, que compara diferentes métricas da companhia com as de outras companhias do setor ou de fora dele. Esse olhar de fora para dentro é extremamente importante. O benchmark te dá dados, insights que geram ideias de onde a companhia está talvez um pouquinho melhor e tem que manter aquela vantagem competitiva, mas também de onde tem um gap e uma oportunidade de melhoria.
Ter a escuta ativa, ouvir bastante não só os seus clientes, mas os seus stakeholders é importante. Volto à oportunidade que eu tive de trabalhar em diferentes linhas de negócio da companhia, de fazer negócio em vários países nos cinco continentes. Com isso, você desenvolve uma habilidade de ouvir o mundo externo, seu cliente, o seu fornecedor, o governo, um parceiro. E aí traz boas práticas para dentro de casa. Antecipação de tendências é um outro ponto para ganhar e manter competitividade.
Cristiano Pinto da Costa, da Shell, fala sobre competitividade
Por último, é a indústria de óleo e gás. Ela é competitiva, mas também opera muito em parceria. Quando você consegue formar uma parceria ou uma joint venture com parceiros que são alinhados, têm complementariedades de competências, que entendem o valor dos parceiros levarem a uma solução melhor do que se um deles trabalhar sozinho, você com certeza consegue atingir o resultado diferente.
A parceria minimiza o risco de cometer erros porque você sabe que vai ter um parceiro competente, capaz, olhando, te desafiando, e talvez até enxergando o problema que você não consegue enxergar sozinho.
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CARREIRA NA MESMA COMPANHIA: "Se está feliz no que faz, isso vai permitir operar o mais próximo do seu potencial"
Estou há 27 anos dentro da mesma companhia. Trabalhei em diferentes linhas de negócios, morei em vários países. Acho que há um grau de impaciência da nova geração (Z), que não necessariamente é ruim. Leva a mexer, a uma melhoria contínua, a buscar soluções um pouco mais rápidas.
Para tentar desenvolver competências diferentes dentro da mesma companhia vale trabalhar em áreas diferentes e ter diversidade. As similaridades entre setores são importantes. A indústria de energia é muito parecida com a de infraestrutura ou a de mineração, isso permite exercitar suas competências também indo de um setor para outro.
Outra recomendação é buscar um pouco de paixão, conexão pessoal com aquela indústria, com aquela companhia. Isso motiva cada um de nós a sair de casa e chegar no escritório. É importante, na tomada de decisão, se fica ou muda de empresa ou setor, buscar aquilo que te deixa feliz. Se você não está feliz naquilo que faz, você consegue levar isso durante um determinado momento. Mas é a felicidade, aquela sensação de propósito, de realização que vai permitir operar o mais próximo do seu potencial, ter a realização profissional e acabar crescendo dentro da empresa.
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SETOR DE ÓLEO E GÁS: "Precisa pensar diferente. Construir novos modelos de negócio para as novas tecnologias de baixo carbono"
Para trabalhar no setor de óleo e gás, o leque se abriu muito. Acho positivo trazer algumas cabeças, formas de pensar diferentes para desafiar até aqueles vieses inconscientes que a gente tem dentro da companhia, de estar trabalhando há muito tempo dentro do mesmo setor.
E é preciso pensar diferente não só em transição energética. Digital e Inteligência Artificial já são um pensar diferente. Como executar a mesma atividade que se faz há décadas de uma forma completamente diferente usando tecnologia a seu favor? Como é que continua suprindo a energia que o mundo precisa hoje, que ainda é primordialmente de hidrocarbonetos, com óleo e gás, mas com uma intensidade de carbono mais baixa que no passado? Novas tecnologias, novas formas de operar, como ao construir novos modelos de negócio para as novas tecnologias de baixo carbono.
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DIVERSIDADE: “O 'gap' de diversidade e inclusão em grandes corporações é muito grande”
Primeiro, reconhecer que estamos muito atrás da onde deveríamos. O gap de diversidade e inclusão em grandes corporações é muito grande. Reconhecer que o status atual não é o desejado é o ponto de partida. Depois, estimular um debate ativo dentro da companhia em relação ao tema, para subir a consciência da organização em diferentes níveis de que diversidade é uma ferramenta importantíssima de inclusão, é a coisa certa a fazer e leva a resultados corporativos diferentes.
Ser transparente para dentro e para fora da companhia, criar metas claras e públicas, mostrar o ponto onde está agora e onde quer chegar, pedindo ajuda de toda a empresa é importante. Algo que temos orgulho, que toca no tema de cultura, de incentivar o debate e a conscientização sobre diversidade são as redes internas de afinidades: de gênero, LGBTQIA+, racial, de pessoas com algum tipo de deficiência e sobre etarismo. Todas têm orçamento anual e são voluntárias. Viraram uma ferramenta grande para promover esse conhecimento, desenvolver novas políticas e impulsionar o debate inclusive na indústria de óleo e gás, que ainda está um pouquinho atrás de outras.
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TRABALHO E VIDA PESSOAL: “Três palavras: equilíbrio, delegação e disciplina”
Não é fácil (conciliar). É um grande dilema hoje que os executivos têm, como distribuir o tempo entre as coisas que são importantes na vida. Qual o percentual do tempo que eu dedico ao trabalho? Qual o percentual para a minha família? E para mim, para cuidar da minha saúde? Equacionar esse trilema um desafio constante.
Tem três palavras-chaves. Primeiro, equilíbrio. Tentar equilibrar a alocação de tempo entre essas diferentes demandas, reconhecendo que não vai conseguir isso num dia ou numa semana. Isso não vem no curto prazo, vem num período. Uma primeira ferramenta que eu tento usar é a delegação, praticar essa ferramenta como executivo de delegar para a equipe com responsabilidade.
A terceira (palavra) é disciplina. É olhar a minha agenda para frente, mantendo um grau de aderência àquele planejamento, para ter certeza que eu tenho tempo alocado para as atividades do dia a dia, para ler, pensar, conversar com o mundo externo. Mas também para tomar café da manhã com a minha família, o dia que vou levar minhas filhas para escola. E tempo para poder fazer um pouco de esporte que, no meu caso, é uma válvula de escape.
Nado, jogo tênis, vôlei, golfe. É uma ferramenta que eu uso para desestressar, porque no esporte se está concentrado no momento. O vôlei é o esporte que eu jogo um pouco mais, até uns campeonatinhos master, de vez em quando.
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SAÚDE MENTAL: "Dar exemplo gera debate, outros começam a falar"
Tem de criar uma cultura para falar sobre o tema, para que as pessoas possam dividir seus dilemas e ter uma forma de endereçá-los é o primeiro passo. Temos eventos durante o ano em que trazemos especialistas do setor. A gente cria um debate na organização tentando desmistificar ou tirar o tabu.
O outro é dar exemplo. Recentemente, tive uma conversa com meu time, quando estava passando por desafios na vida pessoal. E eu fui muito transparente, aberto. Como eu tinha pedindo ajuda, falei: “Moçada, nessas próximas semanas, a minha cabeça vai estar em outro lugar, eu vou precisar primeiro que vocês entendam, me ajudem”. E aquilo gerou um debate, outros começaram a falar a mesma coisa e daí a gente cria uma forma diferente de lidar com um desafio.
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REDES SOCIAIS: "Usar é importante e necessário no mundo de hoje"
Usar as redes é importante e necessário no mundo de hoje. Uso mais o LinkedIn, como profissional, executivo. E tenho usado bastante o Instagram para acompanhar um pouco as minhas filhas, entender o que elas estão pensando, vendo, sentindo.
Passamos a usar mais o LinkedIn como ferramenta de comunicação, engajamento com o mundo externo. Talvez, as redes sejam uma das melhores formas de fazer isso, independente da onde você está no mundo, de gerações diferentes. Tem adolescentes e meus pais usando redes sociais. Quando assumi (como CEO), me dei conta que a gente tinha uma história bacana para contar. E começamos a ter uma ativação muito maior, tanto corporativa, quanto minha como principal executivo da companhia.
E, internamente, criou um nível de engajamento, de pertencimento, de entendimento muito maior do todo da companhia, porque os funcionários tiveram um canal a mais para se conectar com o Cristiano, com alguns diretores. Um golaço.
Fonte: O GLOBO
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