Titulares das pastas ampliam espaço de redutos no orçamento, e já destinam mais verba que em todo o ano passado
Em comum, os ministérios são comandados por indicados de partidos aliados — União Brasil e MDB — e, nos três casos, os municípios mais contemplados são administrados pelo mesmo grupo político dos ministros. O dinheiro do governo federal servirá para obras como pavimentação de ruas, construção de praças e até a instalação de pórticos nas entradas das cidades.
Tucumã e Medicilândia, cidades no interior do Pará que, juntas, não chegam a 100 mil habitantes, vão receber essas estruturas para desejar boas-vindas a visitantes. Sem tradição turística, os municípios lideram o ranking das que mais foram contempladas com recursos do Ministério do Turismo neste ano. Ambas têm à frente prefeitos do União Brasil, o mesmo partido do ministro Celso Sabino, que comanda a pasta.
Em nota, a pasta diz que “tem firmado convênios com vários estados para incremento da infraestrutura turística”. Em 2023, o ministério não havia liberado recursos ao Pará.
Agora, dos R$ 23 milhões em convênios com cidades paraenses publicados neste ano, 62% foram para prefeituras do União Brasil. A sigla elegeu prefeitos em só sete da 144 prefeituras do estado na última eleição (quando ainda era DEM), menos de 5% do total.
Cofre cheio: ministérios turbinam redutos em ano eleitoral — Foto: Editoria de Arte
Esses investimentos têm servido de trunfo eleitoral aos prefeitos, que divulgam as obras e a boa relação com o ministro nas redes sociais.
— Três convênios já liberados. Uma grande reforma no terminal rodoviário, no mercado municipal e os dois pórticos das cidades. Temos, sim, que ser gratos ao nosso ministro Celso Sabino — celebrou o prefeito de Tucumã, Dr. Celso Lopes Cardoso (União), que deve concorrer à reeleição.
O prefeito disse que os recursos foram enviados por causa do trabalho junto a parlamentares e ao governo federal. “Conseguimos a verba porque o município precisa e fez o dever de casa com as exigências que a lei manda”, diz Cardoso, em nota.
Já em Medicilândia, o próprio Sabino esteve na cidade em fevereiro para anunciar o repasse de R$ 4 milhões para erguer uma nova rodoviária na cidade.
— Medicilândia hoje tem dois deputados e conseguimos agora, também, um espaço no Ministério do Turismo — disse o ministro, em discurso ao lado do prefeito Julio Cesar do Egito (União Brasil). Procurado, o prefeito não retornou.
Também do Pará, o ministro das Cidades, Jader Filho, foi outro a despejar verba nos municípios de aliados Em pouco mais de dois meses, a pasta publicou convênios que preveem o envio de R$ 232,6 milhões a prefeituras do estado, quase metade dos R$ 470 milhões autorizados ao longo de 2023. A maior fatia desses recursos (77,7%) ficará com prefeitos emedebistas, que comandam 60% dos municípios.
Irmão governador
O ministério nega influência política e alega seguir uma portaria de 2023 para definir quais cidades terão prioridade. “Os critérios consideram os indicadores socioeconômicos e o tamanho da população beneficiada”, diz a pasta, ressaltando a maioria de prefeituras do MDB no estado.
Jader Filho preside o diretório do MDB no Pará, estado governado por Helder Barbalho, seu irmão. Os dois são filhos do senador Jader Barbalho. Ananindeua, que teve Helder como prefeito até 2013, foi a mais contemplada com convênios neste ano. O município de quase 500 mil habitantes receberá R$ 22 milhões para obras viárias e de saneamento. Já a capital, Belém, ainda não teve convênios aprovados neste ano.
Ananindeua tem como prefeito o ex-presidente da Assembleia Legislativa paraense Dr. Daniel Santos, também do MDB, pré-candidato à reeleição. Ele afirma que os recursos são fruto de emendas que parlamentares indicam para a cidade, incluindo a sua mulher, a deputada Alessandra Haber (MDB-PA). É o ministério, contudo, que decide a ordem de municípios que serão contemplados primeiro e também é responsável pelos trâmites legais da assinatura dos convênios.
O casal esteve com Jader Filho na sede da pasta no dia 22 de fevereiro. A reunião foi registrada nas redes sociais por Santos.
— Os convênios já tinham saído (quando houve a reunião). Nossa pauta era política. O ministro é presidente do MDB no estado e temos eleições — disse o prefeito.
Mesmo nos casos dos convênios firmados no ano passado, a previsão é que boa parte do dinheiro seja desembolsado neste ano, segundo documentos analisados pelo GLOBO. Em Alenquer, por exemplo, o prefeito emedebista Tom Farias terá um superlativo impulso financeiro para quebrar um tabu local — desde 2000 um comandante do município não consegue se reeleger. A cidade deve receber R$ 13,1 milhões em abril para implantar um sistema de abastecimento de água potável.
Verbas para o Amapá
O ministro da Integração Regional, Waldez Góes, também ampliou a liberação de recursos para prefeituras de seu estado, o Amapá, às vésperas da disputa eleitoral. Foram R$ 61,8 milhões em convênios em janeiro, 19,6% a mais que o liberado em todo o ano passado. Governador do estado por quatro mandatos, Waldez é aliado do senador Davi Alcolumbre (União-AP), fiador de sua indicação ao cargo. O grupo político da dupla tem a maioria das 16 prefeituras do estado como aliadas. A exceção é Macapá, administrada por Antônio Furlan (MDB).
Embora a cidade do adversário político também tenha entrado na lista de beneficiadas, ao ficar com 28,2% dos recursos neste ano, mais da metade (53,4%) foi destinado para prefeituras do União Brasil, legenda de Alcolumbre, e do PDT, partido do ministro. As cidades de correligionários dos dois representam seis das nove que tiveram convênios publicados em janeiro. “Os projetos aprovados para a disponibilização de recursos são apresentados pelos entes (estaduais ou municipais)”, diz a pasta.
Com uma população 34 vezes menor que a capital, Macapá, a cidade de Tartarugalzinho, de 12.945 habitantes, foi a segunda mais contemplada no ano ao fechar dois convênios com a pasta em janeiro, no valor de R$ 12,5 milhões. Somando o que já havia sido reservado em 2023, contudo, o município assume a liderança no ranking, com 35,2 milhões, mais que o dobro dos R$ 16,8 milhões de Macapá, que não recebeu nenhum centavo no ano passado.
— Faço reivindicações aos parlamentares, como todo prefeito. Se tenho poder de articulação e infelizmente o outro (prefeito) não está conseguindo, aí vai da gestão política — disse o prefeito Bruno Mineiro (União), pré-candidato à reeleição.
Fonte: O GLOBO
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