Irã confirma morte de sete militares, incluindo comandante da Guarda Revolucionária responsável pelo país árabe; israelenses não comentam

Um ataque aéreo atribuído a Israel atingiu, nesta segunda-feira, o Consulado do Irã na capital síria, Damasco, deixando 11 mortos, de acordo com o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), ONG com sede no Reino Unido que conta com ampla rede de informantes no país. Entre as vítimas está um importante general da Guarda Revolucionária do Irã, além de outros seis militares da organização. Doze pessoas ficaram feridas. O consulado fica em um prédio anexo à embaixada, que também sofreu danos.

— O número de mortos por causa dos ataques israelenses contra o anexo da embaixada iraniana passou para 11: oito iranianos, dois sírios e um libanês, todos eles combatentes, nenhum civil — disse à AFP Rami Abdel Rahman, dirigente do Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), ONG com sede no Reino Unido que conta com uma ampla rede de informantes no terreno na Síria. O consulado fica em um prédio anexo à embaixada, que também sofreu danos.

Um porta-voz israelense disse à al-Jazeera que "não comenta relatos publicados na imprensa estrangeira", mas integrantes do governo de Israel confirmaram ao New York Times, em condição de anonimato, que o país realizou a operação. Segundo o diário, o consulado abrigava uma reunião entre membros da Inteligência iraniana e militantes palestinos para discutir a guerra em Gaza, com a presença de membros da Guarda Revolucionária e da Jihad Islâmica, grupo que conta com o apoio de Teerã.

A Guarda Revolucionária confirmou, em comunicado, a morte de sete de seus integrantes no ataque, incluindo os generais Mohammad Hadi Haj Rahimi e Mohammad Reza Zahedi .

O general Mohammad Reza Zahedi, comandante das Forças Quds, foi morto em ataque contra o Consulado do Irã na Síria — Foto: Reprodução

Zahedi era comandante das Forças Quds — braço da Guarda Revolucionária para ações no exterior — na Síria e no Líbano. Veterano da guerra contra o Iraque (1980-1988), ele liderou, por alguns meses em 2004, a Força Aérea da Guarda Revolucionária, e a força terrestre da organização entre 2004 e 2007. Em 2018, foi indicado vice-comandante de operaçoes da Guarda, e sempre era citado por suas credenciais "invejáveis".

Além dos laços com o regime de Bashar al-Assad na Síria, Zahedi atuava em coordenação próxima com o grupo xiita libanês Hezbollah. Os integrantes do governo israelense ouvidos pelo New York Times confirmaram que ele era o alvo principal do bombardeio. Rahimi, o outro oficial morto no ataque e também um veterano do conflito com o Iraque, serviu como vice-comandante da Guarda para ações de coordenação, e havia sido transferido à Síria para trabalhar com Zahedi. O bombardeio ocorreu dias depois de o OSDH ter noticiado ataques israelenses na Síria que mataram 53 pessoas.

Em comunicado, o ministro das Relações Exteriores sírio, Faisal Mekdad, condenou o ataque, chamado por ele de "terrorista", e disse que "Israel não conseguirá abalar as relações entre Irã e Síria", dois dos principais aliados estratégicos no Oriente Médio. Segundo o texto, o ataque foi lançado da região das Colinas do Golã, ocupadas pelos israelenses desde a Guerra dos Seis Dias (1967), e ele "destruiu todo o edifício, matando e ferindo a todos que estavam dentro".

Chanceler sírio, Faisal Mikdad, visita complexo diplomático do Irã em Damasco, atingido por ataque aéreo nesta segunda-feira — Foto: LOUAI BESHARA / AFP

Citado pela imprensa iraniana, o chanceler do Irã, Hossein Amirabdollahian, afirmou considerar "esta agressão uma violação de todas as normas diplomáticas e tratados internacionais", responsabilizou Israel "pelas suas consequências", responsabilizou Israel “pelas suas consequências” e concluiu dizendo que "a comunidade internacional deve tomar medidas decisivas contra estes crimes". Ele ainda destinou críticas ao premier israelense, Benjamin Netanyahu: para Amirabdollahian, o primeiro-ministro "perdeu o equilíbrio mental porque enfrenta derrotas seguidas em Gaza".

No X, o antigo Twitter, o ministro afirmou que convocou um representante da Embaixada da Suíça em Teerã para "passar uma importante mensagem aos Estados Unidos" — na ausência de laços diplomáticos entre o Irã e os americanos, a Suíça age como nação protetora dos interesses de Washington em solo iraniano.

"Nesta convocação foram explicadas as dimensões do ataque terrorista e do crime do regime israelense e enfatizada a responsabilidade do governo americano. Uma mensagem importante foi enviada ao governo americano como apoiador do regime sionista. A América deve ser responsabilizada", escreveu o chanceler. A vice-representante do Irã na ONU, Zahra Ershadi, pediu uma reunião de emergência do Conselho de Segurança para analisar o caso.

Em declarações à agência ISNA, o embaixador iraniano em Damasco, Hossein Akbari, afirmou que o "ataque do regime sionista é uma indicação da realidade deste país, que não reconhece o direito internacional e adota qualquer ação desumana para conseguir o que deseja". Ele disse que foram usados "caças F-35", construídos pelos EUA, na ação.

— Após seis meses de crimes contra Gaza e a Síria, este regime [Israel] cometeu este crime contra os colegas e funcionários da embaixada iraniana e conselheiros militares, alguns dos quais foram martirizados e cujos nomes anunciaremos [em breve]. O regime sionista agiu contra as leis internacionais, o que resultará na nossa resposta decisiva — disse Hossein Akbari.

Iranianos queimam bandeiras dos EUA e de Israel em protesto em Teerã após ataque a consulado do país na Síria — Foto: AFP

Risco de instabilidade

Horas depois do ataque, o governo iraniano promoveu um ato em Teerã para homenagear os mortos, marcado por críticas a Israel e aos Estados Unidos. Segundo o OSDH, um drone suicida foi lançado no começo da noite contra a base de al-Tanf, na Síria, usada por forças americanas no país. A aeronave teria sido destruída pelos sistemas de defesa, e ninguém assumiu a autoria da ação.

Em entrevista coletiva, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller, disse que a Casa Branca está conversando "com parceiros na região para reunir mais informações", mas que, até o momento, não tem confirmação sobre o alvo ou o responsável [pelo ataque]. O porta-voz do secretário-geral da ONU, Stephane Dujarric, disse que o bombardeio "causou preocupação", mas que a organização segue à espera de maiores informações.

A chancelaria da Rússia, aliada de Irã e Síria, disse em nota que "tais ações agressivas por parte de Israel são absolutamente inaceitáveis ​​e devem ser interrompidas", e considerou "categoricamente inaceitáveis ​​quaisquer ataques às instalações diplomáticas e consulares, cuja inviolabilidade é garantida pelas Convenções de Viena relevantes".

Bombeiros tentam extinguir focos de incêndio no prédio do Consulado do Irã em Damasco — Foto: LOUAI BESHARA / AFP

Desde o início da guerra contra o grupo terrorista Hamas em Gaza, em outubro do ano passado, Israel tem intensificado ataques contra posições ligadas ao Irã no Líbano e na Síria, incluindo em áreas urbanas — contudo, o Irã, que apoia o Hamas e o Hezbollah, no Líbano, tem evitado ações diretas contra os israelenses, por conta do risco de envolvimento em um conflito de grandes proporções no Oriente Médio. Ao invés disso, o país é acusado de usar grupos aliados na região, como os houthis no Iêmen, em ataques pontuais. Mas incidentes como o de Damasco podem alterar a equação, afirmam especialistas.

— Isso ainda parece ser uma guerra regional de baixa intensidade. Ainda não é um conflito aberto, mas parece que Israel está fazendo o possível para expandir o conflito — disse à al-Jazeera o diretor do International Crisis Group para o Irã, Ali Vaez.— Isso deixa Israel em uma posição favorável, uma vez que Israel sabe que o Irã não quer ser arrastado para uma guerra regional, então se o país amplia as ações contra alvos iranianos na Síria, provavelmente não terá custos, e se o Irã responder e retaliar, se tornará um pretexto para expandir a guerra.

O bombardeio ocorreu dias depois de o OSDH ter noticiado ataques israelenses na Síria, que mataram 53 pessoas, incluindo 38 soldados e sete membros do Hezbollah, organização libanesa apoiada pelo Irã. Foi o maior número de baixas sofridas pelo Exército sírio em ações de Israel desde o início da guerra entre Israel e o Hamas em Gaza, de acordo com a ONG.


Fonte: O GLOBO