Novo titular da pasta, Andrey Belousov é aliado próximo de Putin e defensor da elevação de gastos do Estado; ex-ministro Shoigu vai para o Conselho de Segurança

Ao anunciar uma das mais importantes trocas no alto escalão do governo desde 2020, a saída do ministro da Defesa, Sergei Shoigu, o presidente russo, Vladimir Putin, pareceu admitir que a invasão da Ucrânia será um conflito de longo prazo. Algo que demandará mudanças não apenas militares, mas também na própria economia da Rússia.

A escolha de Andrey Belousov, vice-primeiro-ministro, ex-assessor econômico e economista de formação, foi o sinal mais evidente dessa guinada. Segundo fontes do Kremlin, citadas pelo site Meduza, Belousov é alguém a quem Putin escuta, em quem confia e que seria capaz de realizar mudanças importantes, especialmente na gestão.

No final do ano passado, o projeto de orçamento enviado pelo Kremlin ao Parlamento previa a elevação dos gastos com Defesa para 30% do total de despesas federais em 2024, e sugeria que o valor passasse para 40%. Mas ao mesmo tempo em que o governo quer mais verbas para suas tropas, havia questões sobre como esse dinheiro era administrado.

— A tarefa de Belousov será otimizar os gastos com a guerra, para que a maior quantidade possível de dinheiro vá para a guerra e para matar ucranianos, não para os bolsos dos funcionários do Ministério da Defesa — disse ao The Moscow Times um funcionário do ministério, em condição de anonimato. — Ele defende o estímulo monetário à economia, o investimento estatal e uma economia planejada.

Denúncias de corrupção, como a que levou o vice-ministro da Defesa, Timur Ivanov, à prisão, fragilizaram a posição de Shoigu, além de algo que o Kremlin deixou claro nas entrelinhas: a necessidade de forças mais eficientes, e de uma indústria plenamente integrada aos esforços de guerra.

“O Kremlin acredita que irá modernizar a economia e transformá-la numa economia militar. E os militares puxarão o crescimento do PIB”, afirmou no X (antigo Twitter), Alexander Kolesnikov, pesquisador do Fundo Carnegie para a Paz Internacional.

Outra evidência de que a troca foi motivada por questões administrativas foi a manutenção da cúpula militar, incluindo o chefe do Estado-Maior, general Valery Gerasimov. Em declarações à imprensa na noite de domingo, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, reiterou que a troca no Ministério da Defesa em nada altera os planos de combate.

Reformas militares

Embora não admita, o fracasso da ofensiva inicial da Rússia na Ucrânia, e a transformação de uma guerra que deveria ser rápida em um conflito que se arrasta por três anos, é uma frustração para Putin. E a troca evidencia, além do desejo de mudar a base econômica do país, a intenção de reformar as forças de defesa.

Em 2007, em seu segundo mandato presidencial, Putin indicou um ex-vendedor de móveis e aliado do seu círculo de São Petersburgo para o Ministério da Defesa, Anatoly Serdyukov. No ano seguinte, a invasão da Geórgia evidenciou os muitos problemas nas Forças Armadas, e Serdyukov convenceu o Kremlin de que a solução passava pela elevação dos gastos e a otimização das forças de ação rápida.

Serdyukov deixou o cargo em 2012, após um escândalo de corrupção, e foi substituído por Sergei Shoigu, que apesar de seus 12 anos no cargo, não avançou nas reformas, tampouco lançou uma doutrina própria, e não era uma unanimidade nos quartéis. Belousov, por sua vez, tem bons laços com a indústria militar, é favorável a mudanças e não deve, segundo as primeiras indicações, assumir decisões práticas sobre as tropas.

Ex-ministro da Defesa da Rússia, Sergei Shoigu (E), conversa com o presidente Vladimir Putin — Foto: Alexey NIKOLSKY / POOL / AFP

Desde o fracasso inicial na Ucrânia, a atuação de Shoigu era duramente criticada. A insurreição comandada pelo chefe do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, em junho do ano passado, parecia ser o último degrau antes de uma queda inevitável. Segundo o Kremlin, Shoigu vai assumir o comando do Conselho de Segurança russo, e não deixará o do círculo próximo de Putin.

Outro envolvido nas trocas foi o agora ex-chefe do Conselho de Segurança, Nikolai Patrushev. O Kremlin afirma que sua nova função será anunciada em breve. Para Tatyana Stanovaya, fundadora da consultoria R.Politik, a “demissão” foi apenas nominal, dada sua importância para Putin

“O cargo de Nikolai Patrushev é ser Nikolai Patrushev. Ele desempenhou um papel ideológico importante, mas não como secretário do Conselho de Segurança, mas como antigo procurador de Putin e antigo chefe do FSB (Serviço Federal de Segurança)”, concluiu Stanovaya no X.

Com AFP e Bloomberg


Fonte: O GLOBO