Uma articulação de bastidores na disputa pelas duas vagas em aberto no Superior Tribunal de Justiça (STJ) está movimentando o tribunal com uma espécie de troco de uma ala de ministros contra um candidato que eles consideram que, no passado, já tentou interferir no processo de escolha da Corte.
Ministros de diferentes alas do STJ atuam para excluir da lista tríplice a ser enviada para o Palácio do Planalto o desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Para o STJ, o presidente da República escolhe os indicados às vagas a partir de listas tríplices definidas em votações sigilosas entre os próprios ministros.
Nascido em São Luís, Ney Bello conta com o lobby do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, que vem procurando os integrantes do STJ para pedir que votem no conterrâneo.
Embora seja comum que ministros do STF defendam candidatos ao STJ, esse tipo de movimentação sempre é visto como intromissão de uma Corte nos assuntos da outra. No caso de Dino, com um agravante: nas conversas, ele tem tentado aliviar a barra de Ney Bello em um episódio do passado, quando o maranhense tentou ser escolhido para o STJ e não conseguiu.
Em 2022, sob o governo de Jair Bolsonaro, o também ministro do STF Kassio Marques vetou a escolha de Ney Bello, de quem é desafeto declarado.
Na época, Bolsonaro escolheu para as vagas em disputa Messod Azulay e Paulo Sérgio Domingues, mas Bello atuou nos bastidores do Senado para tentar adiar a realização da sabatina e até mesmo convencer os senadores a rejeitarem os dois escolhidos por Bolsonaro.
A ofensiva, que contou com o apoio do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi vista como manobra para dar tempo para que Lula, já eleito, revertesse as indicações e o colocasse em uma das vagas.
Bolsonaro indicou Messod Azulay e Domingues em 1º de agosto de 2022, mas os dois só foram sabatinados pela Comissão de Constituição e Justiça do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) em 22 de novembro, ou seja, três meses e meio depois.
Embora Bello costume dizer que não teve responsabilidade sobre a demora, no STJ a manobra é tida como fato – e provoca indignação de alguns ministros.
“Ney Bello jura por todos os santos que não foi ele que pediu para adiar a sabatina, mas diversos senadores falam que foi, sim, ele que pediu”, disse um ministro do STJ à equipe da coluna.
Um segundo ministro, que também pediu para não ser identificado, confirma os relatos de que Ney Bello atuou para que o Senado rejeitasse os dois nomes ou para que a lista em que ele ficou de fora fosse devolvida pela Casa.
“Seria uma humilhação inusitada não só para os dois escolhidos, mas sobretudo para o STJ como instituição. Disputa por vaga no STJ não é um vale tudo, devendo observar regras não escritas de civilidade e respeito, sem arranhar a dignidade da Corte”, diz esse ministro.
Na opinião de um terceiro ministro, o episódio representou uma “afronta à Corte” que não pode ser esquecida.
“O STJ tem o privilégio de escolher os seus representantes”, afirma.
Por isso a movimentação de bastidores para tirar Ney Bello da lista.
Com o tribunal de recesso, os ministros têm mantido conversas reservadas com os candidatos e as articulações ainda estão incipientes, mas a rejeição a Ney Bello já veio à tona. Em conversas com os ministros, a equipe da coluna já identificou pelo menos cinco dispostos a não votar em Bello – e a convencer os outros a fazer o mesmo.
A expectativa é a de que a votação para definir a lista tríplice ocorra após a posse do futuro presidente do STJ, ministro Herman Benjamin, cuja solenidade está prevista para 22 de agosto.
Ao todo, 17 candidatos dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) disputam a vaga aberta com a aposentadoria da ministra Assusete Magalhães, em janeiro deste ano.
Ao STJ cabe julgar crimes cometidos por governadores, desembargadores e procuradores da República, além de analisar pedidos de federalização de investigações (como no caso Marielle) e homologar decisões estrangeiras, como no caso do jogador Robinho, que cumpre no Brasil a pena por estupro coletiva conferida pela Justiça da Itália.
Procurados pela equipe da coluna, Ney Bello e Flávio Dino não se manifestaram até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.
Fonte: O GLOBO
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