Assessor internacional do presidente Lula ainda não conseguiu contato com o governo de Maduro, mas disse que ‘gostaria’; hoje será dia de conversas com observadores, analistas e dirigentes da oposição

A missão comandada pelo assessor internacional da Presidência da República, Celso Amorim, pretendia deixar Caracas depois do almoço nesta segunda-feira, mas, segundo o próprio ex-chanceler ao GLOBO, só deve retornar ao Brasil nesta terça. 

O Brasil está longe de ter em mãos elementos que permitam ao governo reconhecer a reeleição do presidente venezuelano Nicolás Maduro, anunciada na noite de domingo pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Perguntado sobre seus próximos passos, Amorim recorreu a uma cita de um pensador romano:

— Sou amigo de César, mas sou mais amigo da verdade. Estou procurado a verdade.

Nas próximas horas, serão consultados observadores internacionais, analistas locais e haverá conversas com governos estrangeiros. Amorim confirmou já ter falando com o dirigente opositor Gerardo Blyde, coordenador da oposição nos diálogos com o chavismo, e um dos principais interlocutores do assessor de Lula na oposição venezuelana.

— É meio difícil ter a proclamação do resultado com solenidade [como acontecerá em Caracas dentro de algumas horas], sem ter a transparência, a disponibilidade das atas — afirmou o assessor internacional de Lula.

E acrescentou:

— O sistema não permite manipulação. A dúvida que pode haver é se o total [de atas] corresponde ao que de fato cada mesa produziu.

Sem as atas verificadas, frisou Amorim, “fica difícil o reconhecimento”.

Suas conversas e a de seus assessores com outros governos estão acontecendo desde sábado, porque muitos desses governos estão de olho na posição que será assumida pelo Brasil e para a qual as informações que Amorim dará a Lula serão decisivas.

Há dúvidas sobre os dois lados. E o Brasil, segundo O GLOBO apurou, buscará ter certezas tanto sobre o que diz o CNE, como sobre as denúncias de fraude da oposição. Uma das fontes consideradas mais confiáveis pela missão chefiada por Amorim é o Centro Carter. Os enviados das Nações Unidas também estão conversando com representantes do governo brasileiro, mas existem algumas dúvidas na missão enviada por Lula sobre suas tendências políticas. 

Nesta segunda, Amorim reiterou que foi “um grave erro a União Europeia ter dado motivo ou pretexto para ser desconvidada [pelo governo venezuelano para ser observador]”. O argumento do governo Maduro é de que a UE não suspendeu, como prometera, sanções contra o país e funcionários de seu governo, entre eles a vice-presidente Delcy Rodríguez.

— [Se a UE tivesse vindo] Não teria acontecido nada disso — assegurou o enviado de Lula.

Amorim e sua equipe também querem ouvir atores locais e setores da oposição. Não haverá, como nunca houve, contato com a líder opositora María Corina Machado, já que o Brasil não fará qualquer gesto que possa ser interpretado como um aval, por mais sutil que seja, às denúncias de fraude lançadas por María Corina e pelo candidato presidencial Edmundo González Urrutia.

A missão enviada por Lula, que tornou-se peça central da representação da comunidade internacional em Caracas, também está em contato com ex-presidentes que têm diálogo com o governo Maduro e com a oposição. Um deles é o ex-presidente da República Dominicana, Leonel Fernández, que nos últimos dias esteve com Maduro e com González Urrutia.

Na região, o Brasil está conversando com os governos da Colômbia, México e Estados Unidos, confirmaram fontes. Até agora, apenas os EUA disseram abertamente não poder reconhecer o resultado dado pelo CNE. O governo de Gustavo Petro aposta numa posição conjunta com o Brasil, mas ainda não está claro se isso vai acontecer.

O governo Lula não está esperando apenas as atas do CNE, está esperando, também, conhecer que atas estão em mãos da oposição e se a denúncia de fraude tem sustentação. Serão horas de muito debate, procura de informação e conversas com outros atores externos. Para se posicionar, o Brasil quer ter a certeza de que essa posição está sustentada em informação real e verificável.


Fonte: O GLOBO