Levantamentos internos do Palácio do Planalto animaram presidente nos ataques à política de juros e ao dirigente do banco, Roberto Campos Neto
A ofensiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra o Banco Central e o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, nas últimas duas semanas segue uma lógica que vai além da insatisfação do petista com a interrupção na trajetória de queda da taxa de juros no Brasil.
O que explica a insistência de Lula nos ataques ao BC mesmo com a disparada do dólar, que chegou a bater R$ 5,70 na última terça-feira, são pesquisas internas do Palácio do Planalto que sinalizam um apoio maciço da população às críticas aos juros altos e a Campos Neto.
O levantamento mais recente que passou pela mesa do presidente da República indicou que mais de 60% dos brasileiros concordam e avalizam os ataques do petista ao Banco Central. O número reforçou a crença do presidente de que precisa bater no BC para ajudar a recuperar osíndices de popularidade e ajudar o PT a ganhar terreno nas eleições municipais.
O presidente, que passou boa parte do primeiro ano de mandato disparando flechas contra Campos Neto até uma breve trégua que resultou na redução da taxa Selic até a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do último dia 25 que decidiu por unanimidade manter o índice em 10,5%, se sentiu autorizado a retomar a “guerra contra os juros”.
Lula só recuou na última quarta-feira após apelos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do restante da equipe econômica. O presidente acenou ao mercado e prometeu que seu governo será norteado pelo compromisso com a responsabilidade fiscal.
Haddad convenceu o chefe de que a retórica contra o Banco Central, embora encontre simpatia no eleitorado, fez disparar o dólar, o que por consequência elevaria os índices inflacionários e obrigaria o BC a aumentar mais ainda os juros, o que colocaria o presidente em uma arriscada sinuca de bico e poderia derreter por completo sua popularidade.
A ata da última reunião do Copom alertou justamente para esse cenário, sinalizando que a manutenção da Selic se devia a uma piora nas expectativas e a “surpresas benignas” que poderiam levar a uma alta na inflação.
A mudança de rota só ocorreu após duas semanas de intensa artilharia contra Campos Neto. Na entrevista à CBN no último dia 18, Lula acusou o presidente do BC de fazer uso do cargo para impulsionar uma agenda política própria e chegou a compará-lo a Sergio Moro, ex-juiz da Lava-Jato que o condenou à prisão e um dos principais algozes do PT.
Na mesma ocasião, criticou sua participação em um convescote organizado pelo governador bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e ainda declarou que o dirigente trabalha para “prejudicar o país”. Dois dias depois, o petista voltou a associar Campos Neto ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Ele foi indicado pelo governo anterior e faz questão de dar demonstração de que não está preocupado com a nossa governança”, disparou.
Alta no dólar
O efeito foi uma escalada do dólar, que fechou o mês de junho valendo R$ 5,58, depois de ter iniciado o mês a R$ 5,12.
Depois, Lula voltou a criticar Campos Neto acusando o presidente do BC de “enveredar pelo caminho errado” e, numa entrevista a uma rádio da Bahia na última terça-feira, quando o dólar a R$ 5,65, afirmou haver um “jogo de interesse especulativo” contra o real e que “alguma coisa” teria de ser feita pelo governo.
Após a defesa da responsabilidade fiscal por Lula na última quarta-feira, o dólar registrou uma forte queda e fechou o dia em R$ 5,57, um sinal de que a fala acalmou, em parte, os ânimos do mercado.
Diante da iminente saída de Campos Neto do comando do banco em dezembro e de sua potencial substituição pelo diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, ex-número 2 de Haddad na Fazenda, o novo cálculo de Lula faz sentido. Mas não se sabe, de fato, até quando o presidente manterá o tom de parcimônia.
É preciso levar em conta, por exemplo, que Lula assumiu o terceiro mandato bem mais ressentido com o mercado, que em sua visão apoiou Bolsonaro enquanto ele estava preso em Curitiba.
Nos bastidores, auxiliares do presidente afirmam que ele prometeu mudar o disco por algum tempo. Resta saber se, caso os índices de popularidade continuem caindo até o fim do mandato de Campos Neto no fim do ano, Lula resistirá aos instintos de tornar o BC vidraça novamente.
Fonte: O GLOBO
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