Pasta sofreu críticas após número fechado do ano passado, primeiro do governo Lula, superar o de 2022, ainda na gestão Bolsonaro

O Ministério da Saúde registrou uma queda de 33% no registro de óbitos de Ianomâmis no primeiro trimestre de 2024 em comparação ao mesmo período do ano passado. Dados obtidos com exclusividade pelo GLOBO apontam que houve queda no número de mortes causadas por desnutrição (-71%), infecções respiratórias agudas (-59%) e malária (-50%). Apesar das melhoras, o número de óbitos segue elevado. Ao todo, foram 74 mortes identificadas pelo governo federal neste ano contra 111 em 2023.

Desde o ano passado, o Ministério da Saúde trabalha para uniformizar a metodologia de contagem em relação à saúde Ianomâmi. A pasta ficou no centro de críticas após dados oficiais mostrarem que 363 indígenas ianomâmis morreram em 2023, superando a marca registrada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que deu início à emergência de saúde. A pasta afirma desde então que houve inconformidades nos registros e subnotificação.

Ao GLOBO, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou que diversas unidades de saúde indígena não estavam funcionando durante o governo anterior, o que fez com que muitas mortes não fossem devidamente registradas, gerando uma demanda represada para a atual gestão.

— Antes, várias unidades de saúde não estavam funcionando, então muitas mortes não foram registradas. Por isso, falamos com muita propriedade de uma subnotificação, são números não confiáveis, não é informação. Muitas vezes os indígenas morrem em processos de cremação e você não tem nenhum registro — afirmou Nísia, completando: — Nós nunca fizemos subnotificação, pelo contrário. Nós não teremos subnotificação, teremos um cuidado extremo com dados e estamos com um grupo de trabalho no ministério e para acompanhar isso de forma muito técnica e precisa.

Em agosto, o Ministério da Saúde começará uma parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística para padronizar o levantamento e conferência de dados sobre saúde Ianomâmi. Em paralelo, a pasta divulgará a cada seis meses o boletim do Centro de Operações de Emergência, com número de tratamentos, causas de mortalidades entre outros aspectos.

O povo Yanomami tem a maior terra indígena do Brasil, com 10 milhões de hectares, mais de 380 comunidades e 30 mil indígenas. Desde o ano passado, com a determinação pelo governo federal da Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional Yanomami (ESPIN-Yanomami), o ministério reforçou as ações voltadas para a saúde indígena com, por exemplo, o aumento no número de profissionais da saúde atuando na região (+ 116%, com 1.497 profissionais) e a reabertura de sete polos base de saúde, atendendo 5,2 mil indígenas.

Também foi necessário tornar as ações de combate ao garimpo permanentes no território, através da Casa de Governo, após o fracasso na retirada dos invasores nas operações de 2023. De acordo com Nísia, os polos de saúde não conseguiram funcionar plenamente no ano passado por estarem localizados em áreas de violência. Apesar dos esforços do governo, a ministra segue sem garantir a inexistência do garimpo ilegal na região e afirma que a área precisa ser “monitorada o tempo todo”.

— Em 2023, os polos não estavam funcionando plenamente porque ainda eram áreas de muita violência, muitas vezes o profissional de saúde chegava e tinha que fechar o polo porque estava tendo conflito e os garimpeiros não permitiam o acesso. Esse cenário com os garimpeiros está muito controlado hoje, a gente teve um avanço muito importante na desintrusão. Não vou dizer que não tem nenhum garimpeiro ilegal, porque ali é uma realidade que precisa ser monitorada o tempo todo — afirmou.

No começo do ano, após a divulgação do número de mortes registradas em 2023, o governo federal também anunciou a construção do primeiro hospital indígena em Boa Vista, Roraima. À época, o secretário de Saúde Indígena, Ricardo Weibe Tapeba, afirmou que o hospital indígena teria um atendimento pensado para a população, com redários e intérpretes.

A ministra da Saúde afirmou que o hospital, na verdade, será uma área especializada em saúde indígena dentro da Universidade Federal de Roraima, e que deve ser anunciado ainda neste ano. Junto com a Casa Civil, o Ministério da Saúde tem trabalhado para estreitar relações com as associações indígenas para a retomada do movo de vida tradicional como passo fundamental da recuperação da saúde Ianomâmi.

— Na verdade, é uma área de saúde indígena no Hospital da Universidade Federal de Roraima, um ambiente que vai permitir também desafogar a Casai e ter leitos de atendimento para procedimentos como exigem uma CTI. Deve ser feita ainda neste ano, já está em processo de reforma. Na última reunião com a Casa Civil nós falamos sobre melhorar a relação com as associações indígenas. Isso tem sido feito, mas nós sabemos que nessa fase agora deve ser intensificado para que se pensem as melhores formas de como voltar ao modo de vida tradicional, de que maneira voltar a pesca, a agricultura

De acordo com os dados do Ministério da Saúde também houve uma melhora no quadro de desnutrição. Ao todo, 3,3 mil crianças foram acompanhadas nutricionalmente no primeiro trimestre deste ano, contra 2,7 mil no mesmo recorte do ano passado. Houve ainda a implementação de Centros de Reabilitação Nutricional (CRN) em Surucucu, Auaris, e na Casa de Saúde Indígena (Casai) Yanomami, em Boa Vista, em abril de 2023 o que permitiu iniciar o uso de fórmulas terapêuticas para o tratamento de desnutrição grave já nas fases iniciais de reabilitação.

Já no caso da Malária, um dos principais pontos de preocupação durante a emergência de saúde, o Ministério da Saúde ampliou a oferta de medicamentos para o tratamento da doença, além dos exames para o diagnóstico. Ao todo, 68,7 mil testes foram realizados no primeiro trimestre de 2024 contra 37,5 mil do mesmo período do ano anterior, o que representa um aumento de 83,1%.

Já as síndromes gripais, a pasta realizou 3,4 mil atendimentos de janeiro a março deste ano, um aumento de 136%. A vacinação, por sua vez, registrou um aumento na aplicação de doses de rotina — 47,5% — e nas doses de campanha — 105%.


Fonte: O GLOBO