Presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante recepção no Kremlin — Foto: axim Shemetov / POOL / AFP
Horas após os Estados Unidos anunciarem um amplo esforço para coibir campanhas de influência russas nas eleições americanas, a Casa Branca pediu ao presidente russo, Vladimir Putin, que "pare de falar" sobre e "pare de interferir" na votação marcada para novembro após o presidente afirmar ironicamente que apoia Kamala Harris e não Donald Trump, com quem nutre uma complexa relação.
— As únicas pessoas que devem determinar quem será o próximo presidente dos Estados Unidos são o povo americano — disse o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, aos repórteres nesta quinta-feira.
Mais cedo, o presidente russo expressou apoio à Kamala em um tom sarcástico. Esboçando um sorriso irônico, Putin disse durante um fórum econômico em Vladivostok, no extremo leste russo, que o presidente americano, Joe Biden, "recomendou a seus eleitores que apoiem a senhora [Kamala] Harris, então nós também a apoiaremos" na corrida à Casa Branca contra Trump.
— Em segundo lugar, ela [Kamala] tem um sorriso tão expressivo e contagiante que mostra que tudo está bem com ela — afirmou o presidente, em referência sarcástica às críticas feita sobre a gargalhada da atual vice-presidente americana, transformadas em um diferencial de sua campanha.
Interferências anteriores
Putin geralmente usa um tom duro para mencionar os eventos políticos e sociais nos EUA. No ano passado, ele afirmou que o sistema político americano está "apodrecido" e que Washington não poderia dar lições de democracia a outros países. Nesta quinta-feira, Putin disse que Trump impôs "mais sanções contra a Rússia que qualquer presidente" anterior.
— Se [Kamala] Harris estiver bem, talvez se abstenha de tais ações — acrescentou.
Em fevereiro, Putin afirmou que Joe Biden, na época pré-candidato à reeleição antes desistir da candidatura em julho, era mais "previsível e experiente" que Trump. A declaração foi recebida com muito ceticismo pelos analistas americanos, que acreditam que Moscou prefere Trump, que é mais suscetível a reduzir a ajuda militar e financeira à Ucrânia.
Trump, que já expressou sua admiração pelo presidente russo, disse que teria a capacidade de solucionar o conflito entre Rússia e Ucrânia "em 24 horas" e criticou os bilhões de dólares desembolsados por Washington para ajudar Kiev a conter a ofensiva russa, iniciada em fevereiro de 2022. Enquanto isso, no fim de agosto, Kamala prometeu que apoiará Kiev de maneira veemente.
Neste sentido, uma afirmação como a desta quinta-feira poderia ser uma simples estratégia para confundir as intenções russas.
A inteligência dos Estados Unidos concluiu que houve interferência russa nas eleições presidenciais de 2016 e 2020 a favor de Trump, o que o republicano nega categoricamente, assim como a diplomacia russa.
Sanções e acusações de interferência
Na quarta-feira, as autoridades americanas anunciaram sanções contra indivíduos e entidades russas, e a apreensão de 32 domínios da internet que autoridades dizem ser usados por Moscou para divulgar propaganda e informações falsas sobre a Ucrânia. Segundo a Casa Branca, Putin estava "a ar" das operações de interferência eleitoral.
A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, comentou a afirmação nesta quinta-feira.
— Evidentemente é uma operação, uma campanha de informação (...) preparada há muito tempo e que é necessária agora que se aproxima a última fase do ciclo eleitoral — disse em uma entrevista à agência russa Ria Novosti.
Apesar das autoridades não afirmarem quem seria beneficiado pelas tentativas de interferência russa, o secretário de Justiça Merrik Garland comentou brevemente que, segundo a análise dos serviços de inteligência, "as preferências da Rússia não mudaram em relação às últimas eleições", o que dá a entender que Moscou está mais uma vez trabalhando a favor do republicano Trump.
Entre as medidas anunciadas por Garland estão sanções contra cinco empresas de mídia estatais russas, incluindo a plataforma online e de televisão Russia Today, que seria usada pelas agências de inteligência russas para veicular desinformação por bots e outros meios, incluindo "deep fakes" feitos por inteligência artificial, segundo os EUA. Sua editora-chefe, Margarita Simonian, e sua adjunta, Elizaveta Brodskaia, foram sancionadas.
Já Konstantin Kalashnikov e Elena Afanasyeva, identificados, respectivamente, como "vice-chefe do Departamento de Projetos de Mídia Digital" e "produtora da RT", foram acusados de pagar US$ 10 milhões de forma secreta para uma companhia não identificada do Tennessee para veicular quase 2 mil vídeos em inglês no YouTube, TikTok, Instagram e X. Os vídeos, a maioria apoiando os objetivos do governo russo, atraíram 16 milhões de visualizações no YouTube, de acordo com o Departamento de Justiça.
A transmissão da RT foi amplamente reduzida ou proibida em muitos países ocidentais, que acusam o canal de tentar desestabilizar as suas democracias com a divulgação de informações falsas.
As punições foram anunciadas poucas semanas após os serviços de segurança americanos acusarem o Irã de estar por trás da invasão dos sistemas da campanha do ex-presidente Trump e verem sinais de que Teerã tentou o mesmo contra Kamala.
Fonte: O GLOBO
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