Ex-presidente é réu em quatro casos criminais, dois deles por tentar interferir na contagem de votos na Geórgia e outro, mais amplo, por seus esforços para permanecer no poder

Ex-presidente dos EUA, Donald Trump, durante comício no Michigan — Foto: JEFF KOWALSKY / AFP

O ex-presidente Donald Trump afirmou que tinha "todo o direito" de interferir no resultado das eleições de 2020, na qual o então candidato democrata Joe Biden saiu vencedor. A declaração do republicano, que é réu em quatro casos de caráter criminal, dois deles sobre a tentativa de interferência eleitoral na contagem de votos no estado da Geórgia e seus esforços mais amplos para permanecer no poder após a derrota, foi feita durante entrevista à rede Fox News, que foi ao ar no domingo.

— Quem já ouviu falar que alguém foi indiciado por interferir em uma eleição presidencial na qual você tem todo o direito de fazer isso? — afirmou o republicano.

Em uma declaração divulgada no dia seguinte, a campanha de Kamala Harris afirmou que os comentários de Trump "deixam claro que ele acredita estar acima da lei": "Agora, Trump está alegando que tinha 'todo o direito' de interferir na eleição de 2020. Ele não tem", disse um porta-voz da campanha da democrata no texto.

Trump responde por quatros acusações por seus esforços para permanecer no cargo após sua derrota nas eleições de 2020 e seu papel nos eventos que levaram ao ataque do Capitólio. Três são de conspiração em conexão com seu esforço para permanecer no poder: uma para fraudar os EUA, outra para obstruir um processo oficial do governo e uma terceira para privar pessoas de direitos civis previstos em lei federal ou na Constituição. O magnata também foi acusado de tentar obstruir um processo oficial — a certificação dos resultados pelo Congresso.

A acusação é liderada pelo promotor especial Jack Smith, que assumiu as investigações do Departamento de Justiça sobre Trump em 2022. No fim de agosto, o promotor emitiu uma revisão das acusações contra o republicano no caso após a Suprema Corte decidir, um mês antes, que o ex-presidente tem direito a uma imunidade substancial contra acusações criminais (ex-chefes de Estado têm imunidade absoluta contra processos por ações tomadas oficialmente como presidente durante o mandato, mas o mesmo não se aplica para atos adotados como pessoa física). A decisão adiou o processo e, caso Trump vença em novembro, poderá pedir para o Departamento de Justiça arquivar as acusações.

O novo texto de Smith manteve as acusações criminais, mas ponderou o tom ao remover quaisquer menções que pudessem ser interpretadas como atos oficiais de Trump, referindo-se ao magnata como "um candidato à Presidência dos Estados Unidos em 2020”. Na anterior, Trump era apresentado como "o 45º Presidente dos Estados Unidos e um candidato à reeleição em 2020". O magnata nega qualquer irregularidade e afirma ser inocente.

Além disso, em um esforço pontual para reverter os resultados, o magnata também é acusado de interferir nas leis do estado da Geórgia — importante estado-pêndulo nas eleições americanas, onde perdeu para Biden em 2020. São 44 acusações ao total, sendo 13 apenas contra o ex-presidente, incluindo falsificação e racketeering (organização criminosa) sob a Lei de Organizações Influenciadas e Corruptas (ou Rico, na sigla em inglês). As demais acusações envolvem outras 18 pessoas.

O caso é liderado pela promotora distrital do Condado de Fulton, Fani Willis, quem a defesa de Trump e dos outros réus tem tentado desqualificar sob o argumento de suposta má conduta após revelações de um relacionamento romântico entre Willis e um homem, Nathan Wade, que ela contratou como promotor especial. O juiz responsável pelo caso, Scott McAfee, rejeitou a proposta, mas um Tribunal de Apelações do estado suspendeu temporariamente o caso até que um painel de juízes decida se a promotora será desqualificada ou não, o que também não deve ocorrer antes das eleições.

A investigação concentra-se em cinco ações tomadas por Trump e seus aliados nas semanas após o dia da eleição, incluindo telefonemas feitos para pressionar as autoridades estaduais a anular o resultado (entre eles, a ligação mais famosa ao secretário de Estado Brad Raffensperger), bem como assédio de funcionários eleitorais locais por apoiadores de Trump, entre outras. Alguns meses antes, seis acusações contra Trump e os outros réus foram anuladas por um juiz do condado de Fulton, em Atlanta. Embora a decisão tenha sido um revés para os promotores, analistas jurídicos avaliam que ela não enfraquece o cerne do caso.

Durante a sua campanha para as eleições presidenciais deste ano, Trump não falou diretamente se aceitará o resultado da votação, limitando-se a dizer durante o primeiro debate presidencial em junho contra Biden, que desistiu da campanha e endossou Kamala, que aceitaria o resultado "se for uma eleição justa". Tampouco voltou atrás de suas declarações sobre as eleições de 2020, recorrendo às alegações infundadas de fraude. Segundo a agência Axios, esses comentários, bem como seus ataques pessoais à adversária, estão em desacordo com a estratégia de sua campanha.


Fonte: O GLOBO