Rebelião no Presídio de Segurança Máxima Antônio Amaro ocorreu em julho do ano passado e apuração deve ser concluída apenas em 2025
Rebelião no Presídio de Segurança Máxima Antônio Amaro terminou com cinco mortos — Foto: Reprodução Rede Amazônica
O Ministério Público do Acre (MP-AC) prorrogou por mais um ano o inquérito civil que apura a responsabilidade do Estado e de agentes públicos durante a rebelião que terminou com cinco mortos, três deles decapitados, no Presídio de Segurança Máxima Antônio Amaro, em Rio Branco, em julho do ano passado.
Com isso, os trabalhos de apuração devem acabar apenas em 2025. O inquérito civil foi instaurado pelo promotor Rodrigo Curti, da 4ª Promotoria de Justiça Criminal e da Promotoria Especializada de Tutela do Direito Difuso à Segurança Pública, para apurar os possíveis danos morais de natureza coletiva e prática de ato de improbidade administrativa cometidos por agentes públicos.
Em publicação no Diário Eletrônico, o promotor justifica para a prorrogação da apuração a 'extensa quantidade de documentos, que demandam minuciosa análise'. "Desta feita, verifico a necessidade de dar prosseguimento ao presente inquérito civil [...]. Prorrogo por mais um ano o prazo de conclusão deste procedimento".
Em entrevista à Rede Amazônica Acre em julho, o promotor afirmou que a investigação estava em fase final e, após isso, a gestão poderia ser responsabilizada judicialmente, se o processo fosse encaminhado ao Judiciário ou extrajudicialmente, caso seja firmado um acordo com o MP-AC.
Na reportagem especial de um ano da rebelião, o promotor explicou que os erros cometidos pelo Estado vão desde a falta de equipamentos, a instalação de um paiol de armas dentro da unidade prisional, a falta de um plano de contingência, entre outras como:
Não adoção de protocolos básicos de segurança;
Entrada de um policial penal armado dentro do pavilhão 1;
Falhas na fiscalização de entrada de materiais no interior do presídio, como a serra que foi usada para serrar as grades das celas e os equipamentos utilizados na construção de um parlatório da Ordem dos Advogados do Brasil na unidade;
Deficiências estruturais, fragilidade das celas;
Câmeras de segurança com defeito: as investigações apontam que várias câmeras de segurança do interior do presídio não estavam funcionando no dia;
Aparelhos de comunicação com defeito. Policiais penais que estavam na parte de trás do presídio, no último pavilhão, não sabiam o que estava acontecendo. Só tomaram conhecimento por meio de uma sirene que eles mesmo tinham comprado;
Falta de efetivo. Não havia policiais nas guaritas fazendo a guarda das muralhas. Além disso, o MP-AC aponta um déficit de 400 policias penais no Iapen-AC atualmente;
Ausência de um plano de contingência e de treinamento adequado dos policiais penais.
investigações do Ministério Público do Acre (MP-AC) apontam que o Estado foi omisso e negligente deixando de seguir uma série de medidas para evitar o confronto dentro da unidade prisional.
"Então, são ingredientes que vão compor esse barril de pólvora, essa dinamite, que culminou com a morte de cinco detentos, policiais penais que foram alvo de tiros e até o momento não se tem nenhuma atitude concreta do Estado para reverter essa situação, que ainda continua na mesma após essa tentativa de fuga que aconteceu no Antônio Amaro", disse à época.
Promotor Rodrigo Curti preside o inquérito que apura a responsabilidade do Estado na rebelião — Foto: Asscom MPAC
Para o promotor, o Estado falhou ao não garantir a segurança dos presos e dos policiais penais. Ricardinho Vitorino de Souza, Marcos Cunha Lindoso, Francisco das Chagas Oliveira da Silva, Lucas de Freitas e David Lourenço da Silva foram mortos na rebelião e, segundo as investigações, eram líderes de uma facção criminosa rival a dos rebelados.
"A partir do momento que um preso ingressa no sistema prisional, está sob a custódia do Estado, que tem a obrigação e a responsabilidade legal de garantir a integridade física e psicológica daquela pessoa. Nesse sentido o Estado falhou porque possibilitou com que esses presos fossem executados. Por mais que fossem presos de altíssima periculosidade, o Estado tem a obrigação de garantir a integridade física deles e também dos policiais penais", frisou.
Rebelião
A rebelião começou na manhã de 26 de julho de 2023 quando presos renderam policiais penais e tiveram acesso às armas que foram usadas para tomar o pavilhão de isolamento da unidade. O policial penal Janilson da Silva Ferreira foi atingido por um tiro no olho, mas conseguiu sair do local. O servidor, inclusive, segue afastado em tratamento de saúde.
Outro servidor foi mantido refém até o final da rebelião, que terminou por volta das 10h do dia 27 de julho. Antes de se entregarem, os presos exigiram a presença do promotor dos Direitos Humanos do Ministério Público, Tales Tranin, para colocar fim à rebelião. Tranin teve um papel importante no momento de crise e atuou junto com o gabinete de crise montado pelo governo
As investigações apontam que, cerca de dez dias antes da rebelião, foram feitas algumas transferências estratégicas de presos para o pavilhão 1. Após a transferência, os detentos iniciaram o processo de serrar as portas das celas e se prepararem para a fuga.
"Todo recluso, todo dia está pensando em fugir. O primeiro passo foi serrar as portas das celas do pavilhão 1, que era o corretivo. Quando eles cometiam infrações administrativas dentro da unidade, eram remanejados para o pavilhão do corretivo para ficarem ali durante alguns dias como uma aplicação de sanção administrativa", contou o delegado Roberth Alencar.
Ainda segundo a polícia, um dos detentos envolvidos na tentativa de fuga foi transferido para o local no mesmo dia, sob a alegação de que teria sido encontrada uma pílula de viagra com ele.
Outro fato suspeito apurado pela Polícia Civil é a presença do ex-diretor da unidade, Francisco das Chagas Santos Pereira, que estava de férias, mas visitou o presídio quase todos os dias que antecederam a rebelião. Minutos antes dos fatos, inclusive, ele estava no presídio.
Pereira, como é conhecido, está afastado das funções até o início de agosto, assim como outros servidores suspeitos de envolvimento no caso. O servidor não foi indiciado por nenhum crime, contudo, o delegado Roberth Alencar destacou que ele é considerado suspeito.
"Os elementos de prova indicaram o possível envolvimento dele com o fato criminoso. Ainda não foi indiciado, não há prova indubitável, mas há elementos que determinaram o afastamento e, por isso, a investigação ainda está tentando elucidar de forma completa, porque, como é importante frisar, ninguém quer achar culpados, identificar autores de crimes, queremos elucidar os fatos", frizou.
O advogado Cristiano Vendramin, que defende o servidor público, afirmou que Francisco das Chagas estava na unidade prisional no período de férias atendendo uma solicitação de auxílio do diretor em exercício da época.
A defesa confirmou que não pode se aprofundar em maiores detalhes porque o inquérito tramita em segredo de Justiça.
Fonte: G1
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